Lava Jato: Supremo costura decisão para poupar parte das sentenças

Brasília – O Supremo Tribunal Federal (STF) deve limitar, no julgamento marcado para hoje, o alcance da decisão que levou a Segunda Turma da Corte a anular, pela primeira vez, uma sentença da Lava Jato.
Ministros ouvidos pela reportagem dizem que a tendência é a de que a maioria do plenário mantenha o entendimento que acarretou na anulação da condenação imposta por Sergio Moro a Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil, mas estabeleça uma régua para evitar efeito cascata em outras ações.
No caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba desde abril do ano passado, a decisão do STF não deve ter impacto sobre o caso do tríplex de Guarujá, na qual já teve sua condenação confirmada em três instâncias, mas pode ajudá-lo em outros, como no do sítio de Atibaia – ainda sob análise do Tribunal Regional Federal, de segunda instância.
Hoje, segundo ala majoritária do Supremo, a concessão de decisões favoráveis só deve ocorrer quando os réus reclamaram do rito processual desde a primeira instância. A ideia é evitar uma avalanche de pedidos à corte após ser definida uma jurisprudência sobre o tema.
A controvérsia gira em torno das chamadas alegações finais – última fase de um processo antes da sentença, na qual as partes são chamadas a se manifestar.
No caso de Bendine, a maioria dos ministros entendeu que o ex-presidente da Petrobras deveria, como requereu sua defesa ao então juiz Moro, ter apresentado suas alegações finais depois dos outros réus que eram delatores, para ter a oportunidade de se defender das acusações feitas por eles na etapa final da ação penal.
A decisão considerou que houve cerceamento da possibilidade de defesa e foi considerada uma das principais derrotas da Lava Jato – foi a primeira vez que a corte anulou uma decisão de Moro.
O plenário da Corte analisará hoje a questão em um outro pedido de habeas corpus, desta vez feito pela defesa de Márcio de Almeida Ferreira, ex-gerente de Empreendimentos da Petrobras condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. A data da sessão foi anunciada nesta segunda (23)
A defesa de Ferreira afirma que a primeira instância da Lava Jato “acertadamente estipulou que os réus colaboradores (delatores) fossem ouvidos antes dos demais (delatados)”, mas, nas alegações finais, “estabeleceu prazo conjunto para todos os réus, colaboradores e não colaboradores”.
Alegações finais – Os advogados argumentam que a apresentação concomitante das alegações finais de réus delatores “viola frontalmente o princípio da ampla defesa e o princípio do contraditório”. Por isso, pede a anulação da sentença.
O processo foi remetido ao plenário pelo o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, em 28 de agosto, no dia seguinte à decisão da Segunda Turma que anulou, por 3 votos a 1, a condenação de Aldemir Bendine.
Desde então, o Supremo tem recebido dezenas de pedidos semelhantes. No dia 4 de setembro, a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentou ao tribunal manifestação contrária ao pedido do ex-gerente da Transpetro José Antônio de Jesus, que pleiteia ser beneficiado pela decisão da Segunda Turma.
Raquel Dodge considerou o momento do pedido dos réus para diferenciar a situação de Jesus da de Bendine. Ela sustentou que o ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil apresentou a questão já na primeira instância e ela só chegou ao Supremo depois de passar pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo (Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). De acordo com ela, Jesus não fez a solicitação nas instâncias inferiores e levou seu habeas corpus direto para a Corte Superior.
O caso do ex-gerente da Transpetro está sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski. Em seu gabinete há ao menos quatro pedidos para que condenações sejam canceladas seguindo a mesma lógica: de que os réus delatados deveriam expor sua defesa por último. Na semana passada, Lewandowski cobrou celeridade do STF.
A Lava Jato em Curitiba afirmou em nota que, se o entendimento do caso Bendine se estender a todas as ações penais que tiveram um prazo comum para as alegações finais de réus delatores e delatados, 32 sentenças poderão ser anuladas, envolvendo 143 dos 162 condenados pela operação.
Possíveis beneficiados seriam o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) e o ex-presidente Lula. A decisão, contudo, não deve ter impacto sobre o caso que levou o petista à prisão.
A anulação da sentença não inocenta os réus, mas faz com que a ação penal a volte para instâncias inferiores. O objetivo é que se refaça o processo, dando a oportunidade para a defesa dos delatados apresentar suas alegações finais depois dos delatores. Procuradores da Lava Jato receiam que, nesse meio tempo, alguns crimes possam prescrever, resultando na impunidade dos réus. (Folhapress)
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