Sustentabilidade

Criador do conceito ‘Felicidade Interna Bruta’ fala sobre IA e capitalismo em BH; confira a entrevista

Educador criou o conceito de Felicidade Interna Bruta (FIB) que pode ser usado para refletir o lucro e o papel das empresas na construção de uma economia mais consciente
Criador do conceito ‘Felicidade Interna Bruta’ fala sobre IA e capitalismo em BH; confira a entrevista
Thakur defende a importância do uso humano da tecnologia de forma a promover o bem-estar e a sustentabilidade. | Foto: Luiz Finotti

O Congresso Eduko, realizado pelo Sistema Fecomércio MG no Sesc Palladium, em Belo Horizonte, nesta sexta-feira (26) e sábado (27), é um daqueles momentos em que é possível reduzir um pouco a velocidade da roda para refletir sobre a educação, a cultura e o pensamento contemporâneo.

A programação é extensa, com grandes convidados, incluindo o educador, escritor e ex-ministro da Educação do Butão, na Ásia, Thakur S. Powdyel, ganhador de prêmios internacionais de pacifismo e educação.

Autor de livros com tradução para diversas línguas, Thakur foi responsável por criar o conceito de Felicidade Interna Bruta (FIB) no sistema de ensino – em alternativa ao Produto Interno Bruto (PIB).

Em conversa com o Diário do Comércio, ele destaca o FIB como uma proposta possível de equilíbrio entre lucro, bem-estar dos funcionários e impacto social, ao contrário do modelo exclusivamente baseado em PIB/dinheiro/lucro.

Ele também fala sobre a importância do uso humano da tecnologia de forma a promover o bem-estar e a sustentabilidade, a cultura organizacional, o sucesso e o papel das empresas no futuro do capitalismo.

Entrevista de Thakur S. Powdyel ao Diário do Comércio

Como os princípios da Felicidade Interna Bruta podem ser aplicados à gestão de negócios para equilibrar lucro, bem-estar dos funcionários e impacto social?

Acredito firmemente no fato evidente de que toda nação, sociedade ou instituição precisa de sua própria Estrela Guia para orientá-la na direção de seu objetivo. Sem uma visão orientadora, nenhuma nação, organização ou indivíduo conseguirá organizar sua mente, seu tempo e seus recursos para alcançar isso. A visão da Felicidade Interna Bruta, concebida e articulada pelo Rei do Destino do Butão, Sua Majestade Jigme Singye Wangchuck, pode servir como um guia poderoso para qualquer sociedade, organização ou empresa que busque o bem-estar de seus membros, preserve a integridade do nosso planeta e siga um caminho sustentável de desenvolvimento. Seguir uma trajetória consciente baseada na Felicidade Interna Bruta, em vez do modelo altamente explorador do Produto Interno Bruto, pode garantir resultados positivos e mutuamente benéficos para todas as partes interessadas, permitindo não apenas sobreviver, como prosperar e florescer juntos.

Na sua opinião, como os avanços em inteligência artificial podem ser utilizados para apoiar o desenvolvimento humano e a felicidade, respeitando valores éticos e sociais?

“O aprimoramento das ferramentas e a confusão de objetivos são característicos da nossa época”, disse o grande Albert Einstein, lamentando o colapso das bases sustentadoras e das certezas diante da explosão descontrolada do impulso tecnológico e da orientação mecânica da vida. Os benefícios gerais trazidos pelo uso do poder e das promessas da ciência e da tecnologia têm sido verdadeiramente revolucionários e transformadores. A utilização das ferramentas de inteligência artificial é um exemplo disso. Mas a tecnologia deve ser usada para promover o bem-estar humano e a sustentabilidade de todas as formas de vida na Terra, e não para substituir nossa inteligência natural ou suplantar os seres humanos. Há algo sagrado e precioso na vida, e ciência e tecnologia devem ser utilizadas para apoiar e preservar a integridade da vida e o delicado equilíbrio de nosso ecossistema, e não para ameaçá-lo.

Que abordagens de liderança e cultura organizacional o senhor recomendaria para empresas que buscam fomentar propósito e engajamento dos funcionários sem comprometer o desempenho financeiro?

Não vejo uma dicotomia entre bem-estar humano e viabilidade organizacional. Na verdade, eles se apoiam e alcançam sucesso juntos. Até chegarmos ao ponto em que todos os seres humanos sejam substituídos por máquinas, nossas instituições continuarão sendo instituições humanas. É imprescindível que pessoas em posições de liderança aceitem e tratem seus funcionários como seres humanos, antes de tudo, e não apenas como trabalhadores ou fatores de produção vinculados a um conjunto de referências. (Por isso, minha sugestão é que se) Envolva seus funcionários como seres humanos, com necessidades e desejos que devem ser reconhecidos e respeitados. Funcionários que se sentem tratados como pessoas e que percebem ter uma participação no sucesso da organização serão ativos, e não passivos. Pessoas felizes fazem organizações felizes, e organizações felizes prosperam financeiramente.

Como as organizações podem redefinir sucesso e desempenho incorporando métricas mais amplas, como felicidade, sustentabilidade e impacto social?

Acredito que toda organização ou instituição possui pelo menos duas vidas: externa e interna. A primeira consiste na dimensão física, nos recursos materiais, na infraestrutura, no que os olhos podem ver. Mas a vida externa tem limites. É a vida interna das instituições que alimenta sua vida externa e fornece a razão de sua existência. A vida interna forma a alma, o sonho, a visão que inspirou a criação da vida externa e a mantém funcionando dia após dia, como a alma invisível que dirige o papel institucional. As instituições atuais não podem se limitar a recursos de ponta, infraestrutura fabulosa ou demonstração de poder físico. Elas precisam estar atentas à alma e ao seu papel, ao propósito original de sua fundação e às consequências de suas ações para a sociedade, para a Mãe Natureza e para todos os outros seres que habitam a Terra.

Qual o papel das empresas na construção de uma economia mais consciente e na formação do futuro do capitalismo, especialmente em relação ao bem-estar humano e à sustentabilidade ambiental?

Em primeiro lugar, indivíduos que administram empresas e indústrias precisam estar absolutamente conscientes de que fazem parte da espécie humana, o homo sapiens, o mais evoluído de todos os seres da criação, e que há outros seres que têm direito a uma parcela justa dos recursos deste planeta. Infelizmente, hoje o impulso explorador e competitivo se sobrepõe à consciência superior das pessoas, reduzindo-as a meros produtores, acumuladores e consumidores, com pouca consideração pelas necessidades de outros seres que compartilham este planeta. A situação atual do mundo reflete o modelo altamente reducionista e utilitarista de produção e consumo ad infinitum (sem fim). As empresas podem ser instrumentos de engajamento humano e podem ser aproveitadas para preservar a integridade deste lar compartilhado e de seus habitantes. Um mundo melhor, mais sadio e mais feliz é possível.

Congresso Eduko em Belo Horizonte

Além de Thakur, a programação do congresso Eduko ainda conta com a escritora, apresentadora e psicanalista Elisama Santos; com o pediatra, sanitarista e escritor Daniel Becker; com a educadora e pesquisadora, professora titular da Universidad Complutense de Madrid e especialista em arte-educação María Acaso; com o psicoterapeuta com 30 anos de experiência, mestre em Psicologia Escolar e certificado em Ciência da Felicidade Leo Fraiman; com o escritor, jornalista e poeta Fabrício Carpinejar; entre outros.

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