Turismo

La Rioja combina história e lindas paisagens

Similaridade da Província com o Estado de Minas Gerais, cercada por montanhas, torna o destino ainda mais encantador
La Rioja combina história e lindas paisagens
Quase cem anos depois da última viagem, os cabos do teleférico ainda se encontram dependurados entre as colinas | Crédito: Mara Bianchetti

Em um primeiro momento você pode até pensar que a Província de La Rioja, na Argentina, e Minas Gerais não têm nada em comum. Mas, mesmo antes de pousar no Aeroporto Capitán Vicente Almandos Almonacid, ainda dentro do avião, é possível avistar lindas montanhas como as que emolduram as cidades mineiras, o que torna inevitável a comparação.

E as similaridades vão além. Das temperaturas amenas como as registradas nas regiões serranas do Estado ao cultivo de oliveiras para a produção de azeites e azeitonas, Minas e La Rioja são muito mais parecidas do que se pode imaginar.

A começar pela principal atividade econômica de Minas Gerais, que, inclusive, deu nome às suas terras: a mineração. É que, no passado, La Rioja abrigou uma importante mineradora. Explorada no início dos anos 1900 para extração de ouro, prata e cobre, a Cable Carril La Mexicana operou por cerca de 20 anos e foi desativada em 1926. Na época, destacava-se como uma das maiores obras de engenharias do mundo.

Como a cava para mineração se encontra a mais de 4,5 mil metros de altura, no alto da Serra de Famatina, uma estrutura magnífica foi construída pelos ingleses a fim de transportar os minerais extraídos até os trilhos que ligavam a cidade de Chilecito ao Porto de Buenos Aires.

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O complexo de 35 quilômetros de extensão empregava cerca de 1,5 mil trabalhadores e contava com 262 torres, nove estações e 650 vagonetas. E permitia o transporte das 4 toneladas de rochas diárias, o que durava 4,5 horas do pico de Famatina até a estação 1. O retorno à mina era utilizado para o transporte de alimentos e materiais para a logística e operação do sistema.

A estrutura foi fabricada inteiramente na Alemanha para chegar de navio a Buenos Aires e, de lá, de trem a La Rioja, onde foi montada. O Estado argentino investiu na época o equivalente a cerca de US$ 14 milhões.

Hoje, quase cem anos depois da última viagem, o teleférico ainda se encontra dependurado entre as colinas, desafiando firmemente a passagem do tempo. O local foi transformado em monumento histórico nacional aberto à visitação.

História de Cable Carril

Inicialmente, e até 1914, a exploração na mina de Cable Carril ficou a cargo da Famatina Development Corporation, da Inglaterra. Os resultados não foram suficientes, parceiros entraram no negócio e, mesmo assim, em 1914 as operações foram paralisadas. Depois, as capitais locais criaram a Corporação Mineira de Famatina e continuaram, de 1918 a 1926, a exploração que foi suspensa em definitivo naquele ano.

Os anos passaram e alguns investimentos em manutenção foram feitos entre as décadas de 1940 e 1970 na esperança de um dia se retomar as operações. O que até hoje não aconteceu. Pelo contrário. O monumento tornou-se um ícone não apenas da região de La Rioja, mas também de toda a Argentina.

“Hoje a estrutura é mais do que um símbolo da cidade. É declarado Monumento Histórico Nacional, com proteção legal que não autoriza quaisquer alterações ou modificações em sua estrutura. É o maior monumento da Argentina”, define o secretário de turismo de Chilecito, Matías Vaca.

Apesar dos títulos, Cable Carril ainda atrai o interesse de investidores chineses, canadenses e americanos, conta o secretário. É que estima-se que apenas 15% da reserva mineral existente na região tenha sido explorada. Apelos sociais e ambientais, no entanto, falam mais alto, e projetos não saem do papel.

“Províncias vizinhas como Catamarca e San Juan possuem explorações de ouro, prata e lítio. La Rioja não explora, apesar de ter reservas potenciais. Chegou a atuar em alguns projetos superficiais de segunda linha como mármore entre 2018 e 2019, mas hoje falta consenso social sobre o assunto. É complexo e político. Não se avança”, completa um empresário da região.

Guias turísticos contam a história com orgulho, sabem da importância econômica que os recursos minerais tiveram na pujança econômica da província no passado e entendem que movimento semelhante poderia ocorrer atualmente. Mas falam com ainda mais orgulho do cuidado com outro recurso natural que não querem prejudicar: a água. É que a exploração minerária poderia comprometer o fornecimento da região que ocorre principalmente pelo degelo da serra.

“Aqui o recurso que mais defendemos é a água. Recurso que vem de Famatina e que consta entre as cláusulas da Lei de Mineração e de licença ambiental. Os impactos ambientais e socioeconômicos são pontos que preocupam a população. E as pessoas lutam para evitar, porque os interessados em extrair o minério são em sua maioria empresas estrangeiras, quase todas canadenses, e que nem sempre visam o bem da região”, justifica uma guia local.

Oliveiras, nogueiras e vinhedos fomentam economia local

Assim, cultivos de olivas, nogueiras e vinhedos para a produção de azeites, azeitonas, nozes e vinhos são o que ditam hoje o ritmo econômico da Província de La Rioja. Há também a geração de energias renováveis. E uma fábrica da Tetra Pak, multinacional dedicada a soluções de embalagem e processamento de alimentos com presença em 160 países, também impulsiona a economia da região.

O Brasil está entre os principais parceiros comerciais da Província para alguns destes produtos. Segundo produtores locais, apenas de azeitonas de mesa importam-se mais de US$ 40 milhões por ano. De azeite são US$ 18 milhões. O vinho é bem menos: US$ 4 milhões – mas é crescente.

De acordo com o governador da Província de La Rioja, Ricardo Clemente Quintela, no quesito azeitonas, a província produz, aproximadamente, 100 milhões de toneladas por ano. No caso dos vinhos, já compete, em termos de qualidade, com as regiões de Salta e Mendoza. Em quantidade, La Rioja aparece em terceiro lugar.

“Prova disso é que a Catena Zapata também se instalou em La Rioja para poder aproveitar nossa uva, que tem muitas propriedades e é cultivada em grandes altitudes. Mas também temos cabritos, pistache e nozes. Temos um importante polo industrial têxtil de forte relevância para a América do Sul. Em geral, influenciamos entre 1,5% e 2% no PIB (Produto Interno Bruto) da Argentina”, detalha.

Província quer impulsionar o turismo

O turismo também possui grande expressão. Mas a ideia da administração provinciana é que seja ainda maior. Para isso, tem trabalhado na implementação de políticas públicas que fomentem os diferenciais da região, que fica no Noroeste do país vizinho, aos pés da Cordilheira dos Andes, recheada de belezas naturais. Os passeios pelas cidades, a hospitalidade do povo, as paisagens, atrações e atividades conduzem o turista a uma experiência inesquecível.

Conforme Quintela, os turistas chegam à La Rioja em busca de trekking, formações geológicas, minas e contato com a fauna local.  Ele destaca a possibilidade de observar os con­dores em altitudes relativas. E defende, sobretudo, que La Rioja é um destino turístico nada tradi­cional do país vizinho. Os atrativos vão de parques e reservas naturais a gastronomia regional, atividades culturais e recreativas variadas e vinhos de alta qualidade. Os tipos de turismo característicos da província são: turismo de aventura, turismo natural, turismo rural, enoturismo, turismo de bem-estar, turismo de reuniões e turismo religioso.

“La Rioja tem uma riqueza histórica cultural muito importante e estamos tentando desenvolver ainda mais o turismo. La Rioja é um destino turístico fora do tradicional. Temos Talampaya, Guasamayo, Cuesta de Miranda, Cable Carril, que é a obra de engenharia mais importante do mundo no século XIX. Temos a primeira agência do Banco Nacional instalada em Chilecito e muitos outros diferenciais. Mas acima de tudo e o mais importante é a gentileza e o afeto das pessoas”, enaltece o governador.

Neste sentido, o governo local e o consulado argentino de São Paulo realizaram uma missão com operadores de turismo e empresários brasileiros a La Rioja para prospecção de negócios. Também teve capacitação junto aos destinos turísticos de forma que os operadores possam oferecê-los aos clientes, principalmente àqueles que sentem atração especial pelas rotas do vinho e pelo turismo de aventura.

“Queremos mostrar aos brasileiros as particularidades da província de La Rioja, turismo de montanha, turismo de aventura, a rota do vinho, as riquezas culturais e naturais”, completa Quintela.

E, desde maio, os brasileiros podem conhecer mais facilmente La Rioja. É que uma nova companhia aérea entrou no mercado, a Allas La Rioja. A empresa oferece voos diretos partindo de São Paulo em viagem direta à capital La Rioja. São duas saídas semanais.

De fato, quem visita a Província tem a oportunidade de vivenciar experiências, no mínimo, curiosas e nada comuns ao que é feito nos tradicionais destinos da Argentina. Tem atrativo para todos os gostos. E por falar em gosto, é impossível viajar à região e não se apaixonar pelas vinícolas, fincas e bodegas. Muitas delas de origem familiar e em plena ascensão, como a Finca Vista Larga.

A empresa surgiu como um projeto familiar com o objetivo de produzir de forma sustentável as culturas mais representativas de La Rioja: oliveiras, videiras e nogueiras. A produção distribuída em 80 hectares segue em pequena escala e quase artesanal. Os turistas podem agendar visitas guiadas com degustação dos produtos, que são todos orgânicos. As uvas da propriedade são torrontés, malbec e bonarda. E o azeite da marca obteve o primeiro lugar na categoria de pequenos produtores do IX Concurso Internacional de Azeites Extra Virgem.

E agora, diante da possibilidade de fomento do turismo, a propriedade terá sua estrutura ampliada, conforme o assessor da Fin­ca Vista Larga, Gabriel Mateos. Segundo ele, serão feitas salas para degustações e venda dos produtos. Também está prevista dentro da expansão a construção de uma bodega.

Belezas naturais e cenários icônicos aos pés dos Andes

O turismo de natureza é um atrativo à parte da Província de La Rioja. Como em Minas Gerais, há parques, serras, cânions e história de sobra para contar. Em alguns destes destinos, a Cordilheira dos Andes emoldura a vista. Em outros, lagos abrigam espécies encantadoras de pássaros.

Passeios em veículos 4×4, cavalgadas, bicicleta e trekking são feitos em áreas de rara beleza, que oferecem desde imensas cascatas, áreas quase desertas e sítios arqueológicos a cumes de montanhas, como a Cumbre La Viuda, coberta por neve.

O Parque Nacional de Talampaya é reconhecido e declarado Patrimônio Mundial da Unesco. Para chegar até ele, cruza-se a Cuesta de Miranda, um trecho da Ruta 40 (maior rodovia da Argentina) que ficou famoso por sua dificuldade: um caminho estreito que pende de paredes íngremes.

“Cuesta de Miranda une as cidades de Chilecito e Villa Unión. É uma estrada que costura as serras que pertencem à formação de Talampaya e Famatina. Hoje, um circuito turístico que pertence à Rota 40 da Argentina, uma das mais famosas internacionalmente e também nacionalmente. A região é muito procurada por turistas”, explica o guia turístico local, John Eric Irazoque.

O Parque Nacional de Talampaya conta com 213 mil hectares de reserva em um clima semiárido que faz as temperaturas oscilarem bastante durante o dia, demandando a visitantes que cheguem ao local bem agasalhados para que suportem temperaturas próximas de zero, mas, ao mesmo tempo, não deixem de lado o protetor solar, pois o sol irradia fortemente com o avançar das horas. É marcado por montanhas coloridas, animais andinos e formações rochosas monumentais. Não à toa é uma das sete maravi­lhas naturais da Argentina.

Em 2019, o parque alcançou o recorde de 76.424 visitantes. Em 2022, já vem apresentando fluxo maior do que naquele ano.

Visitas à Cidade Perdida e ao Cânion Arco-íris estão entre as excursões preferidas dentro do parque. Conhecer as amostras de algumas das réplicas de dinossauros é outra opção. A história conta que foram encontrados na região os fósseis da era Triássica mais próximos da superfície.

Há vários sítios arqueológicos e de grande interesse paleontológico no local, que é ambiente de depósitos sedimentares de esqueletos de várias espécies de dinossauros e outros animais da pré-história. No vale do Talampaya, viveu um dos maiores dinossauros do período Triássico, há aproximadamente 230 milhões de anos.

Paredões imponentes de cores singulares

Mas o grande momento fica por conta dos cânions. Depois de cruzar o deserto por uma estrada de terra, que na verdade é o leito seco de um rio, que fica cheio apenas 5 dias por ano, normalmente no verão, quando chove na região, nos deparamos com paredões de 150 metros e cores avermelhadas. É possível chegar até o local de ônibus, vans e até bicicletas.

Quem quer ver mais sobre os ancestrais da região tem a oportunidade de visitar o Parque dos Dinossauros. Localizado na cidade de Sanagasta, a cerca de 40 minutos da capital La Rioja, o local foi concretizado em 2014 no já existente Parque Geológico Sanagasta, criado em 2001 em uma área de 850 hectares. O parque surgiu a partir da descoberta de ovos fossilizados de dinossauros de 65 a 95 milhões de anos na região, que hoje são exibidos ao final de um dos roteiros.

Quer mais? Que tal visitar o Canon del Triasico? Trata-se de um percurso de cerca de 25 quilômetros de paisagens coloridas e atrações geológicas e arqueológicas, que se assemelham ao Talampaya, mas menor e mais barato que o parque nacional. O percurso é feito em grande parte por leitos secos, por vezes por passagens estreitas entre paredes, ou encostas íngremes, em ambiente seco e rochoso.

Neste caso, os passeios são realizados em veículos 4×4 com as agências autorizadas que prestam o serviço. O local também recebe passeios noturnos sob um dos céus mais claros do país.

O nome Triássico se deve à época em que se formou, há cerca de 250 milhões de anos, cuja evolução é visível nos estratos de diferentes cores, predominantemente vermelhos, que se elevam dezenas de metros em paredes e geoformas.

A vegetação do lugar é escassa e típica do deserto e das montanhas, com espécies que podem viver com poucos milímetros de chuva por ano. Durante as visitas diurnas é comum ver a fauna nativa, como raposas, chinchilas e lebres, além de aves de rapina e os condores que habitam a região. A visita noturna é ideal para os amantes das estrelas, planetas e telescópios.

E os atrativos não param por aí. A Província de La Rioja é mesmo encantadora. Há ainda o que se dizer sobre as rotas de cultura, gastronomia, religiosa, esportiva e tantas outras. Mas, por mais que as palavras sejam claras como o céu da região, nada como uma visita a esse destino inusitado para conhecer o que lá há de melhor. E, claro, sentir-se, muitas vezes, em meio às nossas Minas Gerais.

(*) a repórter viajou a convite do Consulado Argentino em São Paulo

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