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Orquestra Filarmônica busca parcerias para sustentabilidade financeira

Com 16 anos de história e diversos prêmios e menções, além de ter reconhecimento internacional, orquestra trava desafio para gestão sustentável
Orquestra Filarmônica busca parcerias para sustentabilidade financeira
Crédito: Divulgação / Rafael Motta

Fundada em 2008, a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais aos poucos tem construído uma história de referência no Brasil e no mundo por sua excelência artística. Ao chegar nos seus 16 anos de história, com diversos prêmios e menções, além de ter reconhecimento internacional, ela trava um desafio para a sustentabilidade financeira. O DIÁRIO DO COMÉRCIO ouviu especialistas para avaliar os caminhos possíveis de uma gestão sustentável, de forma a manter viva a orquestra com todo seu brilho e pujança cultural.

Responsável por fortalecer a produção sinfônica e a representatividade da cidade de Belo Horizonte, assim como a do Estado de Minas Gerais no cenário artístico de concertos, a orquestra também proporciona mais acesso e oportunidade para o público em geral. Fato que motivou, à época da sua criação, o Estado a ser parceiro e financiador do equipamento cultural, de acordo com nota enviada a nossa reportagem. 

De acordo com a  Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult-MG), o plano de metas do contrato (Secult/Orquestra) estabelece ampliação das atividades de formação do público, descentralização e democratização do acesso, com aumento no número de concertos gratuitos.

O objetivo tem sido cumprido. O documento da secretaria apresenta que, na temporada de 2023, considerando os 109 concertos executados pela Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, 38 foram gratuitos, realizados em Belo Horizonte e no interior de Minas (Betim, Lagoa Santa, Igarapé, Ouro Preto, Araxá, Itabirito, Mariana e São Joaquim de Bicas), além de contemplar estudantes de escolas públicas do Estado. No ano passado, a Orquestra Filarmônica apresentou cinco concertos para 7.465 alunos de 158 instituições da Região Metropolitana de Belo Horizonte.

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Cenário promissor que fomentou, há alguns anos, o governo de Minas a planejar e executar a construção de uma das mais modernas salas da América Latina, com recursos técnicos e tecnologia avançada só vistas em países de primeiro mundo, como explica a atual secretária de Cultura de Belo Horizonte, Eliane Parreiras, que ocupou o cargo de secretária Estadual de Cultura de 2011 a 2015 e participou ativamente do projeto.

“Foi uma das obras mais importantes neste setor no País. Não temos salas de concertos criadas para serem estes espaços. Normalmente, você tem salas adaptadas para este objetivo, como a Sala São Paulo e vários espaços no Rio de Janeiro. A Sala Minas Gerais foi um grande projeto que visava à criação de um equipamento cultural com finalidade definida para ser uma sala de concerto, com projeto acústico e estrutura para este fim”, ressalta a secretária.

Ela explica que o investimento empenhado pela Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (na época Codemig, hoje Codemg) no sentido de criar não só a sala Minas Gerais, mas também a sede da TV Minas e da Rádio Inconfidência – que tinham um problema histórico de custos altos de aluguel e falta de estrutura técnica ideal para o desempenho das atividades –  vinha de encontro com os objetivos do órgão para o desenvolvimento de Minas Gerais.

“A intenção daquele conjunto era que ali se transformasse num grande ativo para Minas Gerais que desenvolveria setores como turístico, econômico e institucional do Estado. Além da geração de empregos”, pontua.

O espaço foi gerido e administrado pela Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais até 2019. Em 2020, o Instituto Cultural Filarmônica, após vencer um edital de administração, passou a gerir e operar o equipamento, por meio do Termo de Permissão de Uso.

“Participamos do chamamento público quando fomos os únicos interessados. Naquele momento, ao assinarmos o contrato com a Secretaria de Cultura e Turismo de Minas Gerais, passamos a ser os gestores tanto da sala quanto da orquestra. Porém, tivemos a infelicidade de viver a pandemia. Foi um período trágico. Ficamos com os espaços parados e pagando os custos de manutenção e operação deles”, explicou o presidente do Instituto Cultural Filarmônica (ICF), Diomar Silveira.

Assim, desde 2020, o ICF desempenha esforços para conseguir fechar a conta anualmente e até hoje, de acordo com o presidente do ICF, apesar de ter conseguido, diz ser um grande desafio. Atualmente, são necessários para manutenção do corpo artístico e do ICF R$ 43 milhões anuais incluindo programação artística, produção e manutenção da Sala Minas Gerais, de acordo com o presidente. Desse montante, R$ 19,5 milhões têm sido proveniente dos recursos do governo estadual, outros R$ 13,8 milhões advêm das empresas patrocinadoras e R$ 2 milhões oriundos de recursos privados como as assinaturas, ingressos e doações do programa Amigos da Filarmônica.

Para completar o montante necessário, o instituto usa a receita do estacionamento, do café e dos aluguéis dos espaços para eventos de terceiros. “A sala é aberta. Há um regulamento de uso de terceiros, disponível para qualquer empresa, grupo ou pessoa”, diz Diomar Silveira.

Sendo assim, é constante a busca por parcerias e mais recursos pelo ICF para que a “conta feche” anualmente. “Estamos sempre atrás de patrocinadores. Quanto mais eventos e mais interessados em parcerias conosco melhor. Inclusive a Fiemg, a Federação das Indústria do Estado de Minas”, comentou Silveira. A citação da Federação das Indústrias relembra o tumultuado e inconcluso processo de parceria com a instituição que culminou na desistência da Fiemg em apoiar o instituto.

Patrocinadores enaltecem relevância artística

O Inter, um dos patrocinadores master do ICF, disse em nota que “reconhece que projetos culturais desempenham um papel fundamental em inspirar, transformar e conectar as pessoas, além de contribuir para o desenvolvimento social e cultural de uma região”. 

Dessa forma, o banco alega que “como parte do compromisso com a cultura brasileira e com seus mais de 31 milhões de clientes, a companhia tem uma parceria de longa data com a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais”.

Orquestra Filarmônica
Crédito: Divulgação / Rafael Motta

A Vale, outra patrocinadora da orquestra, também em nota informa que por entender a relevância artística e a importância do trabalho para a democratização do acesso à música de concerto, já destinou, desde 2020, via Lei Federal de Incentivo à Cultura, R$ 15 milhões para a realização de atividades que incluem concertos ao ar livre; ações educacionais; ações de fomento a novos talentos; profissionalização do músico de orquestra e produção de conteúdo para a difusão do repertório sinfônico.

Fundo de investimentos pode ser caminho

De acordo com a secretária de Cultura de Belo Horizonte, Eliane Parreiras, desde o início, a premissa do projeto foi “ser uma parceria da sociedade civil e do poder público”. Porém, o presidente da instituição alega que o montante atual designado pelo Estado deveria ser maior para que a orquestra possa ampliar os campos de atuação.

Na visão dele, não há como sobreviver sem o apoio governamental e o ideal seria um montante anual de R$ 27 milhões suficientes para cobrir a folha de pagamento do ICF, que hoje conta com 150 colaboradores, sendo desses, 90 músicos. 

“Em nenhum lugar do mundo uma orquestra como esta de excelência, com músicos de alto nível, se mantém só com recursos privados. Só se faz uma grande orquestra para haver muita produção artística. E para produzir todo este volume, o recurso é alto. Se o Estado não põe metade da empreitada para ele ser o maior acionista, é impossível tocar o negócio”, avalia Silveira.

Ele explica que o setor cultural no Brasil é muito rico e variado e a concorrência por recursos é alta. “Está todo mundo batendo às mesmas portas, a competição é grande e os recursos são escassos”, diz. 

Sobre isso, a Secult-MG alega que os R$ 19,5 milhões “é o maior valor de repasse orçamentário recebido pelo Instituto Cultural Filarmônica proveniente da secretaria desde a fundação da orquestra, em 2008. E este valor corresponde a 10,2% a mais se comparado aos repasses realizados até 2023. E que o apoio do governo do Estado e os aportes financeiros são repassados regularmente”, diz a nota.

O diretor de Desenvolvimento Institucional da Orquestra Filarmônica de São Carlos, Douglas Gomes, diz que sabe dimensionar a diferença de gerir uma orquestra com o porte da Filarmônica de Minas Gerais com a de São Carlos, mas tem percebido que as políticas de ESG têm alavancado a música de concerto no País.

Ele explica que as orquestras, além de terem o papel de representar a cidade ou a cultura do Estado em que atuam, possuem um trabalho atrelado ao desenvolvimento social, educacional e profissional cada vez mais valorizado na iniciativa privada hoje em dia.

“Com as políticas de ESG, as empresas passaram a valorizar mais a música de concerto no Brasil e entenderam que ela é importante para o desenvolvimento social das cidades. É um caminho que estamos buscando na nossa gestão”, diz Gomes.

A consultora cultural Eleonora Santa Rosa, que ocupava o cargo de Secretária de Cultura do Estado à época da criação da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, avalia que é o momento é ideal para uma nova discussão dos caminhos possíveis para o financiamento da orquestra, mas ressalta que a discussão deve ser “embasada em cima de princípios públicos e éticos”. 

“O Estado precisa entender a orquestra como patrimônio cultural. Vamos conversar, sim, sobre novos meios de financiamentos. Vamos conversar com os responsáveis pela orquestra, com o Conselho do ICF que representa a sociedade, vamos chamar a Codemg, que é dona do espaço, a Fiemg, a Secretaria de Cultura, entre outros nomes de naturezas estratégicas como a Fundação Dom Cabral e outras organizações e pessoas que possuem experiências com fundos e busca de financiamentos”, comentou.

O modelo de fundo de investimentos, também chamado de endowments, é um dos caminhos, na opinião de Eleonora Santa Rosa, ideal para o atual financiamento da orquestra. “É um caminho viável, sobretudo se for aprovado o uso da Lei Rouanet para eles, é um projeto a médio e longo prazo. A grande questão é a criação das regras de transição e criar metas paulatinas que sejam exequíveis”, opinou.

Raio-X da Filarmônica*:

1.543.738 espectadores

1.231 concertos realizados

1.360 obras interpretadas

126 concertos em turnês estaduais

42 concertos em turnês nacionais

9 concertos em turnê internacional

94 concertos transmitidos ao vivo

606 notas de programa publicadas no site

231 webfilmes publicados

1 coleção com 3 livros e 1 DVD sobre o universo orquestral

4 exposições itinerantes e multimeios sobre música clássica

12 CDs lançados

1 Indicação ao Grammy Latino 2020 (CD Almeida Prado – Obras para piano e orquestra – Categoria de Melhor Álbum Clássico)

*Números contabilizados desde a criação da Filarmônica (de 2008 a dezembro/2023). Eles são atualizados a cada seis meses. A nova atualização está prevista para junho de 2024).

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