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Hoje à noite, na Academia: a posse de Silviano Santiago

Hoje à noite, na Academia: a posse de Silviano Santiago
Crédito: Alisson J. Silva/Arquivo DC

Rogério Faria Tavares*

A Academia Mineira de Letras dá posse hoje, às oito da noite, em sua sede, ao escritor Silviano Santiago, novo titular da cadeira de número treze, eleito na sucessão do embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima. Mineiro de Formiga, o vencedor do Prêmio Camões de 2022 será recebido pelo acadêmico Wander Melo Miranda. Angelo Oswaldo de Araújo Santos lhe entregará o diploma e Maria Esther Maciel, o distintivo.

Autor de obra potente e vigorosa, é de Silviano o já clássico “Em liberdade”, de 1981, uma espécie de ‘diário íntimo falso’ de Graciliano Ramos, aqui comentado na coluna da semana passada.

Corajoso, algumas décadas à frente do seu tempo, “Stella Manhattan”, de 1985, apresentou a mim e a uma legião de leitores – do Brasil e do exterior – a fascinante e complexa personalidade de um protagonista dividido em dois, ou em três, aí contando a interseção de um no outro: refiro-me a e Eduardo da Costa e Silva, ou, simplesmente, Stella Manhattan, funcionário – ou funcionária – do consulado brasileiro em Nova York no final da década de sessenta, época marcada por acontecimentos tão intensos quanto a rebelião de Stonewall, no Village, a revolta estudantil em maio de 68, na França, e o endurecimento do regime autoritário no Brasil, com a homologação do nome do general Médici para presidente.

É esclarecedor o prefácio assinado pelo próprio Silviano na mais recente edição do livro. Suas referências à escultura “Bichos”, de Lygia Clark, e às “Bonecas”, de Hans Bellmer, iluminam a leitura da obra. Do mencionado prefácio, extraio pequeno trecho: “Espero atingi-lo, leitor, pedindo-lhe que trabalhe o contato epidérmico dos cinco sentidos com a escrita. Essa sensualidade, que se exige do espectador da obra de arte, são os corpos que eu gostaria de ter exposto em Stella Manhattan. Palavras se escrevem na página mais para serem vistas do que lidas”.

Encantei-me também por “Mil rosas roubadas”, de 2014, a comovente história da amizade que une Zeca ao narrador por cerca de sessenta anos, desde a Belo Horizonte dos começos da juventude até o Rio de Janeiro do resto da vida. As cenas que revelam a presença decisiva da capital mineira no mapa de tal relacionamento permanecem nítidas na memória afetiva.  Viajemos com esse narrador até os anos cinquenta:

“Havia motivo para eu tomar o bonde Calafate. Ele me transportava até o Colégio Estadual, cuja sede – antes de ser jogada abaixo a golpes de picareta, como tudo o que significa e é belo na cidade – ficava então no Barro Preto, exatamente no quarteirão seguinte ao do campo de futebol do Cruzeiro, onde se ergue hoje o desastrado edifício do Fórum Lafaiete. Não havia motivo aparente para ele tomar aquele bonde. Como ainda não o conhecia, não poderia imaginar seu destino e adivinhar o que estaria fazendo longe do bairro dos Funcionários. Sabia, claro, que não era aluno do Colégio Estadual. Eram poucas as turmas então. Perguntei-lhe para onde estava indo, se ia praticar algum esporte no campo do Cruzeiro. – Vou a lugar nenhum – respondeu-me. – Gosto de andar de bonde pela cidade”.

* Jornalista. Doutor em literatura. Presidente da Academia Mineira de Letras

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