“Luis, respeita Januário…”

Pela Companhia das Letras, em primeira edição, São Paulo, 2021, o autor José Luis Peixoto publica uma autobiografia em que recorre ao escritor José Saramago em sucessivas citações e alusões que beiram situações delirantes.
O sentimento que nos atravessa na tentativa de leitura e entendimento fica na síntese dos versos de Chico Buarque de Holanda: “Meu coração tem um sereno jeito, e as minhas mãos, o golpe duro e presto. De tal maneira que depois do feito. Desencontrado eu mesmo me contesto”.
Vai encontrar o leitor a realidade da sociedade lusitana, do desamparado cidadão português, embrutecido. Subproduto da barbárie de décadas salazaristas, sua pobreza, as privações, a violência, o medo que atravessa todos os movimentos lusitanos, esse, o universo da escrita entrecortada e confusa do autor.
Saramago não está lá! O grande cavalheiro da língua portuguesa, exímio ourives da gramática, joalheiro preciso destas letras camonianas.
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Se buscares o profeta que concebeu “O Ensaio sobre a Cegueira” e “A Caverna”, onde se desenharam os homens que o futuro nos reservava, vais falhar. Falta o gênio que inventariou o legado cristão no imaginário católico do “Evangelho segundo Jesus Cristo”, o espólio que ditou tantas tragédias nas colônias latino-americanas e africanas. Ausente, ainda a melhor tradução das monarquias europeias do “Ano da Morte de Ricardo Reis”.
Nós, privilegiados em solo pátrio que nos concede “O Conto da Ilha Desconhecida”, saberemos que Saramago sorri distante e alhures. O grande amigo das humanidades prescinde de “Caim” que lhe profane o nome e o brilho.
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