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Luz irradiante de Sintra contrasta sombrio da morte

Luz irradiante de Sintra contrasta sombrio da morte
Crédito: Divulgação

A luz incandescente de Sintra, em Portugal, transborda na tela e se contrapõe à trama sutil e intimista de “Frankie” (2019), produção franco-lusitana dirigida por Ira Sachs, que assina também o roteiro junto com Maurício Zacharias. O filme gira em torno da personagem-título, apelido da atriz francesa Françoise Clement, interpretada impecavelmente como sempre pela eterna Isabelle Huppert.

A beleza natural e arquitetônica da iluminada Sintra, com seus mistérios, cria uma estética de contraste perfeita para o confronto emocional contido de Frankie, que tenta dissimular as aflições inevitáveis de uma estrela de cinema em fase de câncer terminal, reunindo sua peculiar e conflituosa família formada pelo marido atual, Jimmy (Brendan Gleeson), seu filho Paul (Jérémie Renier), seu primeiro esposo (Pascal Greggory), a filha de Jimmy, Sylvia (Vinette Robinson), seu marido e sua filha, e Irene (Marisa Tomei), sua amiga cabeleireira de cinema, além de seu namorado “intruso” Gary (Greg Kinnear) e de um guia turístico português, numa espécie de férias de despedida da vida em que tenta inutilmente resolver questões pessoais com seus próximos.

Apesar do tema sombrio da morte anunciada da protagonista em um ambiente familiar, carregado de excentricidade, o filme foge do clichê de drama convencional para mergulhar com leveza e ironia no campo minado da impossibilidade latente de relacionamento humano evolutivo.

O roteiro recorre a um elemento claramente semiótico ao travar diálogos inteligentes e instigantes em três línguas, inglês, francês e português, realçando as dificuldades de entendimento e harmonia vivenciadas por uma trupe heterogênea, que prioriza os seus dramas pessoais menores e quase ignora o ponto nevrálgico do calvário da protagonista, incapaz de catalisar a dispersão coletiva para a sua dor camuflada.

A exuberante sequência final de “Frankie” faz referência explícita à estética da incomunicabilidade do imortal mestre italiano Michelangelo Antonioni. Um esplêndido plano geral aberto no alto de uma montanha ao lado do brilhante Oceano Atlântico mostra os personagens psicologicamente distantes, apesar de certa proximidade física, em um primeiro momento perfilados no limite entre terra e água. Sugestivamente, eles começam a andar apressados, perturbados e agitados até sumirem da tela.

A grandiosidade da imagem dividida entre dois elementos essenciais da vida dispensa palavras.

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