“O Toró” é versão mineira do clássico de Shakespeare

Em celebração aos seus 30 anos, a premiada Trupe de Teatro e Pesquisa estreia a comédia “O Toró”. Com tradução inédita e direta do original “The Tempest”, de William Shakespeare, para as expressões e melodias do “mineirês”, a décima montagem da companhia aproxima as entidades fantásticas da natureza, presentes na obra do bardo, da cultura e do imaginário do sertão brasileiro, também povoado por lendas com seres mágicos. A direção geral é de Yuri Simon, com direção musical e arranjos de Fernando Chagas.
O espetáculo estreia na próxima sexta-feira (13) e fica em carta até 22 de outubro, com sessões nas sextas e sábados, às 20h, e domingos, às 19h, no Teatro Feluma (alameda Ezequiel Dias, 275 – Centro). Os ingressos custam R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia) na bilheteria do teatro, duas horas antes da sessão, ou pelo Sympla. A classificação indicativa é de 12 anos.
“Shakespeare em seu tempo era uma figura popular, que falava a linguagem do povo de sua época. Um público que assistia de pé a espetáculos com duração de quase três horas (como pode ser visto em reconstituições históricas, e, também, em apresentações no atual Globe Theatre de Londres). Era um entra e sai nos teatros, ao mesmo tempo, que se consumia na plateia castanhas, pudim, vinho e cerveja”, explica o diretor e fundador da Trupe de Teatro e Pesquisa, Yuri Simon.
Inspirados no caráter popular do bardo, a Trupe de Teatro e Pesquisa tem se dedicado, desde abril deste ano, à tradução de “The Tempest” para o português falado em Minas Gerais. Simon conta que foi um desafio, mesmo para ele que já havia vivenciado, em outros trabalhos, a experiência de traduzir Moliére e Maquiavel para o “mineirês”. “É importante adaptar, porque algumas expressões da língua inglesa não têm o menor sentido na cultura brasileira”, pontua.
A tradução foi feita há muitas mãos. “Em nossa equipe temos professores, escritores, pesquisadores de teatro, e uma gama imensa de artistas, de várias áreas do conhecimento”, ressalta. Ao todo, foram dois meses de trabalho de mesa e pouco mais de um mês de leituras para corrigir excessos e ganhar dinâmica nos diálogos. O texto de Shakespeare foi mantido quase na íntegra. Para se aproximarem das expressões idiomáticas, bem particulares de Minas, leram Guimarães Rosa e outros autores mineiros. “Assim o texto chega mais fácil aos espectadores. Não acreditamos que Shakespeare fosse tão hermético como algumas traduções o fazem parecer”, afirma.
Além do acento mineiro, o texto também ganhou traços da paisagem e da cultura sertaneja. “Em Shakespeare, a história é ambientada em uma ilha no meio do oceano. Em nossa versão, estamos às margens do grande rio São Francisco, numa terra perdida no agreste de Minas, o que torna o protagonista, Próspero, um homem de terras. E, portanto, achamos que coronel cairia melhor ao personagem do que um título de duque”, comenta.
Escrita entre 1610 e 1611 e publicada após a morte de Shakespeare, acredita-se que “The Tempest” seja a última peça do bardo. Na trama, uma ilha é habitada por Próspero, Duque de Milão, mago de amplos poderes, e sua filha Miranda, que para lá foram levados à força num ato de traição política. Próspero tem a seu serviço Calibã, um nativo em terra, homem adulto e disforme, e Ariel, o espírito servil que pode se metamorfosear em ar, água ou fogo. Os poderes eruditos e mágicos de Próspero serão responsáveis por várias reviravoltas, inclusive o grande naufrágio que dá origem à história.
Encenação
Na época do bardo não havia eletricidade, e, portanto, as peças eram apresentadas de dia, sem efeitos de iluminação. A encenação era apoiada sobretudo na palavra e trazia cenários mais simples, porém, figurinos elaborados. Em “O Toró”, essa é uma das escolhas artísticas da direção. “Na cenografia, optei por uma espacialização mais neutra, projeções de ilustrações que remetem a Minas, paisagens, caricaturas, elementos simbólicos e religiosos, com o objetivo de deixar que os figurinos sobressaíssem”, comenta Yuri que também assina o cenário.
Em “O Toró’, a música ganha força na cena, cumprindo muitas vezes o papel do texto. “Usamos sonoridades mineiras como ritmos do congado, Folia de Reis, vozes de cantos populares e uma instrumentação pautada na percussão, no violão e no acordeon. Conduzidos por Fernando Chagas, os atores cantam e tocam, ao vivo”, relata.
Em cena, 11 atores e atrizes veteranos integram o elenco: Alexandre Toledo, no papel de Próspero, com Sidnéia Simões, Marcus Labatti, Jader Corrêa, Simone Caldas, Eder Reis, Alice Maria, Edu Costa, Roberto Polido, Elton Monteiro e Alex Zanonn, que em algum momento nas três últimas décadas estiveram em outros trabalhos da Trupe de Teatro e Pesquisa.
Ouça a rádio de Minas