Ópera “Matraga” estreia hoje no Palácio das Artes

“Matraga não é Matraga, não é nada. Matraga é Estêves. Augusto Estêves, filho do Coronel Afonsão Esteves, das Pindaíbas e do Saco-da-Embira. Ou Nhô Augusto – o homem”. Assim começa “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, de João Guimarães Rosa (1908-1967). Assim continua a quase épica história do “homem”. Assim termina com a hora e a vez, “a morte e a morte” de Augusto Matraga. Daí o desafio da Fundação Clóvis Salgado de levar ao cenário imaginário, no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes, este épico da literatura brasileira moldado como ópera, a junção de todas as artes.
Em três atos, “Matraga”, inspirada no conto “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, de Guimarães Rosa, chega com libreto e música de Rufo Herrera, artista que, neste ano, completou 90 anos. E também participações mais que especiais dos corpos artísticos da Fundação Clóvis Salgado: Orquestra Sinfônica de Minas Gerais (OSMG), Coral Lírico de Minas Gerais (CLMG) e Cia. de Dança Palácio das Artes (CDPA). Grande elenco de solistas e a narração do ator Gilson de Barros, conhecido pela atuação inspirada no universo rosiano.
A ópera será apresentada hoje, na próxima sexta-feira (27), e sábado (28), às 20h30, e no domingo (29), às 19h, no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes. A direção musical é de Ligia Amadio, com regência da maestra nos dias 25, 27 e 29, e de André Brant, no dia 28. “Matraga” tem concepção e direção cênica de Rita Clemente; cenografia de Miriam Menezes; figurinos de Sayonara Lopes; direção coreográfica de Alex Soares; preparação do Coral Lírico feita por Hernán Sánchez; e direção geral de Cláudia Malta.
“A Hora e a Vez de Augusto Matraga” é o último e o mais emblemático conto de livro “Sagarana” (1946), estreia de Guimarães Rosa na literatura. Para o crítico literário Antonio Candido (1918-2017), é a obra-prima de “Sagarana”, “onde o autor entra em região quase épica de humanidade e cria um dos grandes tipos de nossa literatura, dentro do conto que será, daqui por diante, contado entre os dez ou doze mais perfeitos da língua”.
No conto e em dois filmes – “A Hora e Vez de Augusto Matraga” (1965), dirigido por Roberto Santos, vencedor do Festival de Brasília em 1966, e “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” (2015), dirigido por Vinícius Coimbra e vencedor do Festival do Rio, antes do lançamento comercial, em 2011 – Augusto Matraga é um fazendeiro poderoso e violento, “duro, doido e sem detença, como um bicho grande do mato”, rude como as terras remotas de Minas. Por temperamento, desprezo e ganância, perde tudo; dinheiro, posses e mais. Traído pela mulher, Dionóra, ao tentar recuperá-la e vingar sua honra, Matraga é emboscado e espancado por seus inimigos, os capangas do Major Consilva. Atirado de um espenhadeiro num abismo, é dado como morto. Salvo pela bondade de um casal humilde, em busca do perdão para seus pecados e de um lugar no Céu, apega-se à religiosidade. Aparentemente resignado, Augusto conhece então o jagunço Joãozinho Bem-Bem, “o arranca-toco, o treme-terra, o come-brasa, o pega-à-unha, o fecha-treta, o tira-prosa, o parte-ferro, o rompe-racha, o rompe-e-arrasa”, que desperta seus instintos mais primitivos. Matraga oscila entre a crença, a esperança – que não consegue abandonar – e a violência de sua natureza.
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