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VIVER EM VOZ ALTA | A literatura de Cristina Agostinho

VIVER EM VOZ ALTA | A literatura de Cristina Agostinho
Crédito: Divulgação

Mineira de Ituiutaba, já no Triângulo Mineiro, Cristina Agostinho aprendeu a ler aos quatro anos, seduzida, entre outros, por Monteiro Lobato e sua fantástica galeria de personagens. A paixão pela literatura continuou vida afora.

Adolescente, venceu concursos de redação e começou a escrever as primeiras histórias. Estudante em Belo Horizonte, Brasília e Uberlândia, graduou-se em direito e em letras. Depois de lecionar língua inglesa e teoria literária, fixou residência em Beagá, onde advogou até 1984, quando passou a integrar os quadros técnicos (sempre altamente qualificados) da Assembleia Legislativa.

Hábil narradora de ficções para crianças, estreou com “Pai sem terno e gravata”, de 1985, livro que merece, até hoje, sucessivas edições. Um pouco depois, foi a vez de “Amor inteiro para meio irmão”, ganhador do prestigiado Prêmio João de Barro. Ambos tratavam de aspectos centrais da vida real das crianças, como o desemprego e os novos arranjos familiares, na linha da literatura infanto-juvenil produzida na época, e que consagrou nomes como Wander Piroli e Vivina de Assis Viana. Outra incursão formidável da autora por esse universo se deu com a coleção de contos universais que ela e o saudoso Ronaldo Simões Coelho recriaram para a Mazza Edições, a eles incorporando as tradições e o folclore do Brasil. Entre os títulos que conquistaram público amplo estão “Rapunzel e o Quibungo”, “Cinderela e Chico Rei”, “Afra e os três lobos guarás” e “Chapeuzinho Vermelho e o boto cor de rosa”. Em comum a todos eles, a valorização da riquíssima cultura afro-descendente, cujo repertório nunca é demais enaltecer.

Outro traço distintivo da produção literária de Cristina Agostinho se revelou no campo da memória social. Com “Pedreira Prado Lopes: Memórias de uma favela”, lançado em 2000, ela recuperou a história daquele território com a habilidade de quem sabe pesquisar com rigor e, em seguida, comunicar, em texto, o que apurou. Mais uma prova desse talento foi dada em “Nativos e Biribandos: memórias de Trancoso”, de 2004, quando a trajetória da bela cidade baiana mereceu o mais digno registro. Biógrafa de qualidade, Cristina ainda assinou um volume sobre Frida Kahlo, “As duas Fridas”, de 1996, e, dois anos antes, com Branca Maria de Paula e Madu Brandão, o celebrado “Luz del Fuego – a bailarina do povo”, cuja segunda edição saiu em 2019. Os dois livros fazem parte de um projeto maior, que prevê a publicação das biografias de algumas das mais notáveis mulheres latino-americanas, como Haydee Santamaría (Cuba), Violeta Parra (Chile), Afonsina Storni (Argentina) e Delmira Agustini (Uruguai).

Uma das vinte contistas integrantes de “20 contos sobre a pandemia de 2020”(Autêntica Editora, 278 páginas), lançado em parceria com a Academia Mineira de Letras, nele Cristina assina a bela e delicada história “Duas Irmãs”, que vem ganhando calorosa acolhida dos leitores. Reproduzo curtíssimo trecho: “A mais nova não conteve as lágrimas. Chorou pela primeira vez em muitos anos. A mais velha se aproximou, envolveu carinhosamente os ombros da irmã com os braços e disse, venha, querida, vamos até o jardim, hoje é noite de lua cheia e não podemos perder essa maravilha”.

* Jornalista. Doutor em comunicação. Presidente da Academia Mineira de Letras

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