VIVER EM VOZ ALTA | A Livraria Quixote

A cultura é o solo sobre o qual se levantam os modos de ser e de viver de um povo. Por meio dela, distintas comunidades definem e expressam suas relações com o mundo e o que dele são capazes de extrair, tanto para vencer o presente quanto para sonhar o futuro. As artes dão os criativos contornos por meio dos quais tal processo se efetua. Tão essenciais, pois, quanto o ar e a água, a cultura e as artes são o alimento da alma, da mente e – não tenham dúvida – também do corpo. Por isso, é fácil saber quando uma cidade trata bem os seus habitantes. Entre os indicadores principais estão, indiscutivelmente, a valorização da educação e da saúde e o respeito ao meio ambiente. Mas de nenhuma lista responsável ficará de fora o estímulo à vida cultural e artística. Entre outros benefícios, a chamada ‘economia criativa’ mobiliza extensa cadeia produtiva, gerando emprego e renda e concretizando os ideais de inclusão previstos pela Constituição cidadã de 88 e pela legislação que a ela se seguiu. Afinal, cultura não é favor nem privilégio. É direito.
Como muitos municípios brasileiros, Belo Horizonte abriga manifestações culturais de primeira linha, lideradas por artistas e gestores de alto padrão. Lugar em que atuam os grupos Corpo e Galpão, a Mimulus e a Fundação de Educação Artística, da querida Berenice Menegale, é, entretanto, na íntima conexão com os livros que ela se alinha, de forma emblemática, à sua origem e à sua história mais que centenária. Desde os tempos do Curral Del Rei, por aqui já circulavam escritores e leitores. Durante a construção da nova capital, Alfredo Camarate publicava textos saborosíssimos. Em 1903, Avelino Fóscolo lançava “A capital”, primeiro romance ambientado em Beagá. Ao longo das décadas, o amor da cidade pela Literatura foi ficando cada vez mais evidente, bastando, para comprová-lo, consultar os legados de Drummond e de Nava, para citar apenas dois.
Elos imprescindíveis dessa corrente que forma a vida literária, as livrarias dão a medida do quanto uma cidade é civilizada. É assim no mundo todo. Além de pontos de comercialização, são espaços de sociabilidade e encontro, de diálogo, reflexão e crítica. E de resistência contra a ignorância, a truculência e a barbárie. Defendê-las, portanto, e ainda mais agora, durante a pandemia, é atitude de que não se pode abrir mão.
Fundada em 2003, por Alencar Perdigão (também dono da ótima editora ‘Quixote + Do’, com Luciana Tanure), e desde sempre no mesmo endereço, à rua Fernandes Tourinho, 274, em seus dezoito anos a livraria Quixote consolidou-se como referência de inteligência e de apreço pelas atividades culturais da cidade. É a promotora, por exemplo, do “Festival Livro na Rua”, o Flir. Fechada por cerca de sete meses em razão dos protocolos sanitários, ela lançou agora uma campanha de venda de ‘vale-compras’, indispensável para manter-se de pé. Os clientes podem adquirir, por transferência bancária, cupons de diferentes valores e resgatar os livros até o final de dezembro, com entrega em domicílio ou diretamente na loja, o que é sempre um prazer. Afinal, lá é possível bater um papo com o próprio Alencar, a Cláudia (sua mulher e sócia) e os competentes livreiros Andrea Ledo e Bruno Zattar, com quem é sempre bom conversar sobre livros e sobre literatura (os dois sabem do que falam). Belo Horizonte já aceitou perder os cines Metrópole, Pathé, Savassi Cineclube e Usina, as livrarias Mineiriana e Van Damme. Não vamos, de modo algum, ficar sem a Quixote.
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