VIVER EM VOZ ALTA | “Maíra”, de Darcy Ribeiro
 
                            No ano em que celebramos o primeiro centenário de Darcy Ribeiro, nascido em Montes Claros em 26 de outubro de 1922, nada melhor que relembrar sua valiosa contribuição à literatura brasileira, que não foi menor que seu legado para a antropologia, a educação ou a política. Autor de quatro romances, de um livro de poemas e de três histórias para crianças, Darcy lançou sua primeira ficção, “Maíra”, em 1976.
Em texto veiculado pelo semanário “Opinião”, pouco tempo depois, Moacir Werneck de Castro acusou o clima de frieza com que a obra foi recebida, provavelmente por força das circunstâncias políticas, desfavoráveis ao seu autor:
“O romance de Darcy Ribeiro foi recebido num ambiente de estranha indiferença. Salvo uma ou duas resenhas, não houve comentarista de livros que identificasse na safra de 1976 o vigor, o nível, a originalidade de uma obra que, provavelmente, marcará a segunda metade do século XX na literatura brasileira assim como “Macunaíma”, de Mário de Andrade, marcou a primeira metade. Não tendo obrigação de escrever sobre a produção literária corrente, fiquei na expectativa de que algum crítico soltasse gostosamente o grito da descoberta. Mas em vão. O lançamento de “Maíra” passou praticamente em brancas nuvens”.
Na edição comemorativa dos vinte anos do romance, providenciada pela Editora Record, a atmosfera já era, definitivamente, outra, bem como era radicalmente distinto o cenário político. O referido volume contém, ao final, uma seção composta por ensaios críticos sobre a obra, em que é possível conhecer a palavra dos especialistas sobre “Maíra”.
Para Antônio Cândido, o livro revela uma notável arte de tecelão – tecelão de palavras, frequentemente animadas pelo sopro da poesia, mas sobretudo tecelão de linhas narrativas, exprimindo a vida tribal dos mairuns, os seus mitos, o contato entre eles e os civilizados. O mestre da USP faz questão ainda de distinguir o enredo criado por Darcy de outros que tratam do mesmo universo: “Se pudermos dizer que Maíra é a seu modo um romance do tipo indianista, isto só terá sentido se for para mostrar a sua originalidade. Não há mais nele a redução lírica ou heróica de José de Alencar, que fala dos índios, e por eles, com a sua plena voz de civilizado que os quer embelezar. Não há tampouco a voz cheia de sarcasmo e humor com que Mário de Andrade desenrola a sátira de “Macunaíma”. Há diversas vozes que instituem a narrativa, cada uma conforme o seu ângulo”.
Alfredo Bosi escreveu: “Contrapondo a vida selvagem ao vazio existencial do homem civilizado, Darcy é um ficcionista-antropólogo que lembra o avatar de todos os críticos da cultura, Rousseau. Mas no antropólogo brasileiro a nota de melancolia é mais pungente e beira o sentimento trágico de uma consciência histórica que Rousseau não pôde conhecer.”
Sobre “Maíra”, Antônio Houaiss opinou: “Ao sair de sua leitura, o leitor não notará sem enorme emoção que nada ali é pitoresco por pitoresco ou exótico, nada ali quer oferecer-nos singularidades, diferencialidades”.
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