VIVER EM VOZ ALTA | Nos 125 anos de Guignard

Lançada há poucos dias, “Balões, vida e tempo de Guignard – novos caminhos para as artes em Minas e no Brasil” (Autêntica Editora, 334 páginas), de autoria de João Perdigão, é a competente biografia de um dos mais brilhantes pintores brasileiros do século vinte. Em suas páginas iniciais, a caprichada edição contém um glossário de movimentos artísticos muito útil aos leitores não familiarizados com o campo das artes visuais. Nele, são elucidados termos como ‘fauvismo’, ‘cubismo’, ‘futurismo’ e ‘impressionismo’, expressões fundamentais para a compreensão do ambiente em que se moveu o artista nascido em Friburgo, em 1896.
Outra valiosa providência tomada pelo diligente biógrafo foi a organização do glossário de nomes, que vem ao final do volume. São mais de trezentos verbetes contendo informações qualificadas sobre figuras centrais na trajetória de Guignard, como Aníbal Mattos, Celina Ferreira, Jarbas Juarez e Lúcia Machado de Almeida. Mais um bônus é dado pelos anexos ao texto principal, que contêm uma entrevista do artista a Carlos Gastão Krebs, uma carta a Mário Manés e uma minibiografia escrita pelo próprio pintor.
As imagens constantes na obra também enriquecem o seu conteúdo. A rigorosa pesquisa iconográfica permitiu a exposição de fotos preciosas de Guignard, seja ao lado de seus alunos na famosa escola do Parque Municipal, seja trabalhando nas telas que ajudariam a imortalizá-lo. O bem cuidado encarte com as reproduções de algumas das mais celebradas produções do biografado é atração de primeira linha. Nele, é possível contemplar, entre outros, “Bambus”, “Jardim Botânico”, “O vaso de flores” (arrematado em leilão, em 2015, por quase seis milhões de reais), “Família do fuzileiro naval” e “Paisagem com balões”, além de alguns dos românticos cartões enviados a Amalita, uma das paixões platônicas do artista.
Órfão de pai aos oito anos, Guignard mudou-se com a mãe e a irmã para o Rio de Janeiro. Um ano depois, dona Leonor casou-se com Ludwig von Schilgen, um alemão que possuía alguns bens na Europa, para onde mudou-se com a esposa e os enteados. O pintor concluiu o ensino médio em Munique, ao sul da Alemanha, mesma cidade em que iniciou sua formação profissional, na Academia de Belas Artes, quando estudou com mestres renomados. É também dessa época o casamento com a pianista Annie Doring, união que logo fracassou. A volta definitiva de Guignard ao Brasil se daria somente em 1929, após nova temporada no velho continente, dessa vez em Florença e, em seguida, em Paris. Instalado no Rio de Janeiro, o artista rapidamente se enturmou com os intelectuais modernistas daquele período, entre os quais Murilo Mendes e Lúcio Costa. A mudança para Belo Horizonte se daria apenas em 1944, a convite do então prefeito da capital, Juscelino Kubitscheck, para dar aulas de arte.
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Guignard, no entanto, fez muito mais. A despeito de sua dificuldade de comunicação (era fanho), foi professor carismático, responsável pela formação de gerações. E renovou o olhar da arte sobre o mundo e sobre Minas, oferecendo ao estado o alto padrão de suas composições e a generosidade quase doentia de seu espírito. Falecido em 1962, deixou legado potente e perene, um raio de luz que merece disseminar-se, sobretudo num tempo sombrio como o que vivemos.
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