VIVER EM VOZ ALTA | Os livros que Darcy Ribeiro escreveu para as crianças
 
                            Um aspecto pouco estudado da produção literária de Darcy Ribeiro é o que diz respeito aos seus livros para crianças e jovens. O primeiro deles foi “Noções de coisas”, que saiu em 1995, com ilustrações do mineiro Ziraldo Alves Pinto. Nesse volume, Darcy apresenta uma série de textos sobre temas diversos, em linguagem acessível e bem-humorada, própria para atingir o público pretendido.
Criadas nos anos setenta e mantidas inéditas até depois de seu falecimento, as “Histórias Gáticas” só foram publicadas em 2002 pela FTD e são compostas por dois enredos: “Fico, o gato do rabo emplumado” e “Eu, Edo, com medo fedo”, ambas relançadas depois, separadamente, pela Editora Global, em belo projeto gráfico, com ilustrações de Luciano Tasso.
A primeira frase de “Histórias Gáticas” é bem fiel ao estilo de Darcy: “Não se iluda, mamãe. Este não é um livro educativo; muito pelo contrário”. A dedicatória é divertida: “Dedico este livro gático aos netos dos leitores do Pasquim”.
O texto de introdução, assinado pelo poeta Ferreira Gullar, tem título sugestivo: “Darcy, o deseducador”, e já anuncia de que tratam os enredos: “Se a primeira história tem por temas a vaidade e a disputa, mantendo-se num certo nível de plausibilidade, a segunda é desvairada, (…) em que o traquinas que Darcy sempre foi, libera-se de vez, ou melhor, libera o menino que ele trazia dentro de si. É como um retorno à infância, mas não à infância diurna e saudável de Montes Claros, e sim à infância reprimida, onde o excremento e a podridão funcionam como símbolos de eroticidade e culpa. Tenho a impressão de que essa história mostra um Darcy que não cabia nos outros livros que ele escreveu.”
É o autor que avisa aos leitores, antes de começar a contar as histórias: “Amiga-Amigo: Na verdade, este livro não é meu. É do gato Oracy, porque foi ele quem me contou os casos que eu conto aqui.” Para concluir: “Uns poucos deles vivem bem, como esses gatos cariocas do Largo da Gataria do Rio de Janeiro. Outros, nem tanto, como os outros gatos do resto do Brasil, que estão num miserê danado. Mas todos têm suas alegrias de bichanos: brincar de índio, fazer cafuné e namorar miando nos telhados”.
“Fico, o gato do rabo emplumado” narra a saga de um bichano que tem o rabo emplumado de galo índio. Lá pelas tantas, o narrador conta que, além de renegado, tarado e debochado, Fico está ficando amalucado. Tanto que teve de ir tratar com o doutor Grino, nosso psicanalista, apresentado como um gato peludo, católico-socialista. Sabidíssimo. Uma referência clara a Hélio Pelegrino.
“Eu, Edo, com medo fedo” apresenta ao público outro personagem, o gato Edo, que exala terríveis odores sempre que se sente ameaçado. O psicanalista Grino reaparece na história, bem como o gato Uais, tio do gato Edo, provavelmente inspirado no filólogo Antônio Houaiss. A respeito do gato Uais, escreve o narrador:
“Ultimamente o Uais só tem duas preocupações na vida, além de seus experimentos científicos. Primeira, as cosquinhas das meninas gatas que ele não dispensa. Segunda, transmitir a Edo sua vasta sabedoria técnica e científica. Todo dia ele escolhe um assunto instrutivo, importante, cabuloso mesmo, para falar com o sobrinho. Dentro do assunto, escolhe um tema empolgante, interessante. Depois, pensa na melhor motivação para despertar a curiosidade de Edo e aí investe”.
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