EDITORIAL | Nada mais que a lei

Luiz Verano, prefeito de Belo Horizonte entre os anos de 1975 e 79, contava, depois de uma viagem ao Japão, sua experiência com a cultura local, ilustrada com uma conversa com autoridade da área educacional.
O anfitrião dizia que no seu país, crianças, a partir de certa idade, obrigatoriamente deveriam estar matriculadas em escolas. Verano, bem à brasileira, indagou o que aconteceria se o pai da criança não fizesse a matrícula e o japonês, sem compreender o sentido da pergunta, se limitou a responder: “É a lei”. São mesmo culturas muito diferentes, produzindo resultados igualmente diferentes.
Essa conversa com o antigo prefeito de Belo Horizonte nos ocorre a propósito da “greve” das polícias militar e civil do Ceará, que chegou ao fim depois de 13 dias, como resultado de negociações e algumas concessões, tudo isso mesmo tendo o Supremo Tribunal Federal (STF) chamado a atenção para a ilegalidade do movimento.
“É a lei”, diria um japonês, mas do lado de cá do mundo as reações são bem diferentes, não tendo faltado nem mesmo elogios ao “heroísmo” dos amotinados. Fica o mau exemplo, que não é o primeiro, e os riscos de uma bomba que está armada e pode ser acionada a qualquer momento, como aliás bem lembraram porta-vozes da PM mineira em advertência explícita ao governador Zema sobre possíveis consequências de um recuo no que toca ao prometido aumento salarial para a classe.
Que fique suficientemente claro, não se pretende discutir, aqui e agora, os méritos da categoria, sua importância para o conjunto da sociedade ou a pertinência de seus pleitos. Poderíamos lembrar as condições das finanças estaduais, em penúria extrema, já sem condições sequer de garantir regularidade no pagamento ao funcionalismo.
Também não é o caso. O fato a remarcar é que ninguém, absolutamente ninguém, está acima da lei, que no caso em discussão veta qualquer tipo de movimento paredista nas áreas de segurança ou, a qualquer um, as cenas deploráveis que foram vistas no Ceará nos últimos dias, verdadeiro convite à barbárie.
Ficar o dito pelo não dito, na esperança de que tudo seja esquecido em poucos dias, é que não pode ser, não tendo qualquer cabimento que o resultado de tudo isso seja, além do acerto negociado, algum tipo de anistia.
Se acontecer, como aconteceu faz algum tempo no Espírito Santo, estarão arrombadas as portas da lei e da ordem, estará explicitado o convite àquilo que poderá ser uma chantagem permanente à parcela da sociedade que, apesar de majoritária, não conta com o mesmo tipo de argumento para se defender ou pelo menos deixar de pagar uma conta que não é sua.
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