Política

Projeto do Rodoanel pode ficar no papel, avisa Marília Campos

Sem traçado alternativo, obra não terá aval das cidades de Contagem e Betim, na RMBH
Projeto do Rodoanel pode ficar no papel, avisa Marília Campos
Marília Campos planeja requalificar distritos industriais de Contagem | Crédito: Leonardo Morais

Terceiro maior Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais, Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), possui grande relevância para o desenvolvimento do Estado tanto pela tradicional vocação industrial quanto pela diversidade econômica do município. A localização estratégica com entradas e saídas para importantes corredores logísticos de escoamento de produção do País é fator primordial para tamanha pujança.

Mas com o passar dos anos e as mudanças ocasionadas pelo advento tecnológico, o comportamento de pessoas e empresas foi mudando e agora a cidade também precisa se transformar. Em entrevista ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, a prefeita Marília Campos (PT) conta o que tem feito à frente do Executivo para atrair novos investimentos e fazer com que as companhias já instaladas na cidade apliquem esforços e recursos na melhoria de seus processos.

Entre as ações está a melhoria de processos junto à Prefeitura e a requalificação dos Distritos Industriais (DIs). O objetivo é modernizar os espaços, inclusive no que se refere à normatização e desburocratização para instalação de empresas, diversificar as áreas de atuação das indústrias e conferir maior segurança jurídica aos investidores. O trabalho já teve início no Distrito Industrial Juventino Dias, mais conhecido como Cidade Industrial, e no Distrito Industrial Cinco, que passarão, inicialmente, por uma transformação em seus modelos de governança.

Marília Campos também falou sobre obras públicas, seu relacionamento com os governos federal e estadual, a polêmica sobre a construção do Rodoanel Metropolitano – que, segundo ela, não vai sair do papel se o Estado não discutir o traçado alternativo proposto – e os caminhos que acredita serem a melhor opção para a pacificação do País em meio à polarização hoje vista não apenas na política, mas no convívio da sociedade em geral.

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Já chegamos à metade do mandato. Qual a avaliação até aqui? 

Primeiramente, a gente se dedicou muito a ajustar e adequar os contratos que estavam em execução. Pegamos um conjunto de obras de mobilidade urbana, empresas que desistiram da execução e fizemos novas licitações. Já entregamos algumas, como dois viadutos na região da Ressaca e a ampliação no Beatriz, que está praticamente concluída. Agora estamos na fase de conclusão das estações dos terminais na João César, na região de Nova Contagem, do Ressaca e outras duas estações que ainda daremos início às obras. Esta é uma fase que a população entende pouco, mas que faz parte do processo. Mas também preparamos novas intervenções e estamos investindo na melhoria da infraestrutura para atração de novos investimentos, como a modernização tecnológica, a instalação de câmeras para garantir mais segurança, a instalação de redes de internet, seja nas escolas ou em vários pontos da cidade, nas secretarias, especialmente as que são responsáveis pelo licenciamento ambiental e tramitação de projetos. Ou seja, aquilo que demorava antes 90 dias agora fica pronto em 10. A empresa que quer investir, quer rapidez e agilidade na relação com o poder público e é nisso que a gente tem investido. Como também na infraestrutura da cidade, com o programa Asfalto Novo, por exemplo, que tem sido sucesso. Já investimos em torno de R$ 95 milhões na primeira etapa, asfaltamos 52 km de vias e agora estamos concluindo a divisa com Belo Horizonte. Isso é muito importante não apenas para diminuir o custo de manutenção do município com a operação Tapa-Buraco, como faz com que a cidade seja dotada de estrutura para garantir uma melhor mobilidade. Todo o sistema de viadutos, asfalto e estações vão garantir o ir e vir do cidadão e das empresas com maior facilidade. Contagem se prepara para um futuro melhor. 

E quais são os desafios para os próximos dois anos? 

Concluir esses projetos. Temos ainda as políticas sociais na educação e na saúde. Educação que prepara as pessoas para ter novas oportunidades, que prepara o cidadão e a cidadã para o mercado de trabalho. Estamos fazendo grandes investimentos. fomos buscar nosso projeto pedagógico lá em Sobral, que tem o melhor índice de aproveitamento da Educação Básica do País. E estamos investindo em tablets, computadores, quadro negro digital e jogos para tornar nossas escolas mais interessantes. Ainda em relação à requalificação e formação da mão de obra na educação e a valorização dos servidores públicos, no ano passado demos 38% de reajuste para o setor e hoje pagamos o melhor salário do Estado, quiçá do Brasil. Na saúde também avançamos muito. Assumimos a saúde da urgência e emergência, que antes era terceirizada e criamos um novo formato de gestão por meio da SSA (serviço social autônomo), que é uma paraestatal do município de Contagem, responsável pela gestão. Estamos avançando e os médicos, por exemplo, já recebem salário de mercado. No geral, hoje pagamos o piso salarial dos médicos, dos engenheiros e o maior piso dos educadores, justamente porque entendemos que serviço público de qualidade tem que ter servidor qualificado e bem remunerado. Com isso a cidade tem ficado em dia com o serviço público e também com o cidadão. E também partiremos para um programa de requalificação dos espaços de encontro para humanizar nossa cidade. Isso inclui praças, parques e jardins. Entendemos que esses espaços não só são importantes como encontro, mas também servem como cartão-postal para apresentar Contagem para aquele que quer morar, trabalhar ou investir na região. Além disso, este é um ano que esperamos colher frutos. Que a partir dos investimentos feitos na infraestrutura, as empresas se sintam mais confiantes em ampliar seus investimentos na cidade. Já tivemos isso em 2022 com a Tambasa, um investimento de R$ 1,6 bilhão ampliando sua capacidade na região do Ressaca, que se consolida como o maior parque logístico do Estado. Como também os investimentos imobiliários como o Inova Park, que é um modelo de cidade que a gente quer fortalecer. 

Como está esse relacionamento com as empresas e a atração de investimentos privados? 

Contagem tem uma vocação. É um centro industrial importante e ainda tem espaços para receber novas empresas. Isso é um atrativo a mais, porque temos um sistema viário fantástico e estamos perto da Capital. Tem as BRs 381 a 040, Via Expressa, a posição geográfica por si só já é atrativa para o investimento privado, como também a mão de obra qualificada. Neste sentido, temos universidades que ajudam no processo de formação dos profissionais, não só privadas, como públicas, como o Cefet, que podem fazer parcerias com as empresas. Sem contar todo o processo de modernização e desburocratização que temos feito na prefeitura. Fizemos grandes modificações na Secretaria de Desenvolvimento Econômico para torná-la menos burocrática no recebimento dos empreendimentos, porque tínhamos regras muito burocráticas. O poder público tem que dialogar com o setor empresarial para ajudar a resolver problemas e facilitar o investimento. Também procedemos assim na época da pandemia, não só não fechamos indústrias, como até para fechar o comércio, quando foi preciso, optamos por dialogar com o setor. 

Qual foi o impacto do pacote de ICMS na arrecadação da cidade? 

O impacto foi grande e esperamos que isso seja corrigido em políticas de compensação, assim como esperamos que o governo federal nos ajude no financiamento dessas políticas de modernização. Hoje, por exemplo, o acesso à internet e a novas tecnologias é bancado única e exclusivamente com recurso municipal de financiamento e recursos do Tesouro. Estamos investindo R$ 68 milhões. Pensamos num desenvolvimento de País, mas que esse desenvolvimento tem que vir pelas cidades, que é onde as empresas se instalam e é onde o cidadão vive. E se o governo não ajudar a financiar, não é possível receber esses novos empreendimentos. Por isso, esperamos uma política tributária mais simplificada, mais subsídio para os investimentos públicos e programas de infraestrutura que melhorem o setor público. 

Qual deve ser a arrecadação neste ano? 

A previsão para este ano é de R$ 2,567 bilhões. Lembrando que Contagem hoje tem uma posição de excelência do ponto de vista fiscal, porque a gente está evoluindo cada vez mais para ser menos dependente dos repasses constitucionais. Nossa arrecadação própria hoje é de R$ 1 bilhão, ou seja, 40% da nossa receita é própria, o que faz com que o município tenha mais autonomia e gestão sobre a sua política de investimento. A solução para acabar com as enchentes no Arrudas passa por obras em Contagem. 

Como está o andamento do projeto? 

Este é um problema dramático que afeta não só Contagem, como Belo Horizonte. Estamos com o investimento financiado pelo governo federal na praça Rio Volga de R$ 105 milhões executado pelo Estado para fazer duas bacias. Belo Horizonte recebeu mais R$ 55 milhões para fazer outra bacia e essas estruturas vão conter as enchentes e proteger cidadãos e empresas da região. As obras tiveram início em período de chuva e foi impossível seguir com elas. Mas acredito que agora na segunda quinzena de março já vai ser possível avançar. 

Quanto a Prefeitura vai investir em obras em 2023? Quais as principais obras de infraestrutura previstas? 

A da avenida Maracanã, que não será entregue este ano, mas que vamos avançar bem. É uma obra estruturante, de mobilidade urbana e que tira todo o transporte do centro da cidade e leva direto para uma grande avenida estruturante até a região de Nova Contagem. Como a praça do Rio Volga também, que está na reta final, além de outras pequenas obras de contenção que atrapalham muito em época de chuva serão concluídas em breve. 

Contagem é uma cidade conurbada com importantes cidades da RMBH, além da Capital. Há dificuldades em manter projetos conjuntos para melhoria da infraestrutura, principalmente na questão de mobilidade? 

Não há dificuldade quando as cidades fazem parcerias para resolver os problemas que são comuns. Com o prefeito de Belo Horizonte, a parceria é muito importante. Asfaltamos a avenida Xangrilá, que está metade em Belo Horizonte e metade em Contagem; temos agora as obras das enchentes. Lutamos juntos e estamos executando juntos. E também a bacia da Lagoa da Pampulha. Serão feitas 7.000 ligações de rede de esgoto, sendo 4.000 em Contagem e o restante em Belo Horizonte. Já existe essa visão clara que a poluição da Pampulha só poderá ser, de fato, resolvida se tivermos obras em Contagem.

Uma das suas propostas durante a campanha tratava sobre um novo Plano Diretor para a cidade. A quantas anda? 

Fizemos todo o debate com a cidade, conferências e envolvemos a população, os segmentos empresariais, todos os movimentos sociais e fizemos um projeto de lei que já foi apresentado na Câmara. Certamente a Casa vai eleger uma comissão especial para tratar do tema. A expectativa é que até o meio do ano, antes do recesso legislativo, ele seja aprovado. O principal conflito é que não queremos que a cidade cresça horizontalmente. A cidade tem que crescer verticalmente, se tornando mais compacta, aproveitando a estrutura já existente, porque se ela cresce horizontalmente, cada vez mais nós não só formamos periferias, como tornamos a cidade mais cara, porque temos que levar toda a infraestrutura para lugares que ainda não têm. 

Como está o imbróglio em relação ao Rodoanel? 

Temos uma relação com o governo do Estado com pontos positivos. Talvez o único ponto de tensão agora seja a questão do Rodoanel que eles não ouvem os municípios. Quando falo ouvir, é se posicionar em relação à proposta alternativa de traçado que apresentamos junto com o município de Betim. É uma obra estruturante que resolve o problema de circulação e acidentes do Anel, mas que não pode sair do papel às custas de um sacrifício enorme para as outras cidades. No caso de Contagem um sacrifício não só social, mas também ambiental. Entramos com a ação no Ministério Público, Tribunal de Contas e Tribunal de Justiça e em todas as instâncias saímos vencedores, mas não houve diálogo. O governo do Estado seguiu com o processo licitatório para contratar a empresa que iria elaborar o projeto e que a partir daí se posicionaria em relação ao mérito. No caso do Tribunal de Contas do Estado houve um compromisso formal do Executivo estadual junto à Prefeitura de Contagem e de Betim que eles chamariam as duas cidades para discutir assim que a empresa fosse contratada para discutir a proposta do trançado e os impactos. A empresa já foi contratada e até hoje nada. Nós não daremos o aval, assim como Betim também já afirmou que não dará o atestado de conformidade para o licenciamento ambiental. 

Vivemos um momento de alta polarização política no País. Qual o caminho enxerga para a pacificação? 

O diálogo é condição para isso. Acho que o Lula está tendo a posição correta de chamar todos os segmentos para conversar. A reunião que ele teve com todos os governadores em Brasília foi muito importante não só para discutir o acontecido no dia 8 de janeiro, mas também para ouvir os governadores nas suas principais demandas para, a partir daí, fazer um planejamento atendendo cada estado. Outra questão que acho que é muito importante é que o Lula foi eleito com base em um legado, um legado que fez com que a maioria do nosso povo apostasse mais uma vez nele, acreditando que seu projeto é melhor para o Brasil. Mas além do legado, ele vai precisar começar a apresentar propostas que resolvam os problemas da população. Hoje, sem dúvida nenhuma, a questão do desemprego é fundamental que seja enfrentada e o desemprego se enfrenta com a reativação da economia. Com as empresas voltando a investir, não só as empresas do Brasil, mas as empresas mundiais. E essa queda de braço, na minha opinião, que ele faz com a taxa de juros vai ser fundamental neste processo. Só assim voltaremos a ter crédito. As empresas precisam de crédito para poder investir, as pessoas precisam de crédito para poder comprar, para poder consumir. Acredito que essa discussão de voltar a crescer também a partir do consumo, é fundamental. O Lula precisa dar uma resposta a isso, como também precisa dar resposta a algumas políticas públicas da saúde e da educação. Escola de educação infantil para que as mulheres possam trabalhar e deixar seus filhos; saúde enfrentando o problema das filas das consultas especializadas; e moradia para garantir abrigo às pessoas e também ajudar na retomada da economia, já que a construção civil é o setor que mais gera emprego no nosso País. 

Como avalia a relação de sua administração com o governo estadual? E com o governo federal? 

Espero que o Lula volte com os programas de investimentos a partir dos Ministérios para que a gente não tenha que ficar de pires na mão no Congresso Nacional reivindicando emendas. Queremos programas para investir em escolas, na infraestrutura, no saneamento porque é dessa forma que conseguimos planejar o investimento e qualificar o gasto no investimento público, garantindo investimentos mais robustos por parte da iniciativa privada. Uma obra de saneamento como essa da avenida Maracanã custa R$ 150 milhões e nem que eu conhecesse todos os deputados eu conseguiria esse investimento em emendas. Para fazer obras estruturantes nos municípios, nós precisamos que os programas de investimento público venham seja do orçamento Geral da União ou dos bancos do Brasil, Caixa ou BNDES. E para isso a taxa de juros tem que diminuir também. No mais, meu relacionamento com os poderes tem sido muito razoável. Seja com o governo do Estado ou com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais, a cidade tem recebido grandes recursos. E o meu relacionamento com a Câmara dos Vereadores também é muito bom. Respeitamos a autonomia dos poderes, até como entes que defendem a democracia não apenas no papel, mas na prática. A autonomia dos poderes para mim é crucial. Eles não interferem do lado de cá e eu não interfiro do lado de lá. Dialogamos sobre os problemas da cidade e sobre as prioridades de investimento. Acredito que a Câmara dos Vereadores também é porta-voz da cidade, por isso defendo a participação popular, mas também entendo que a Câmara representa o povo. A gente ouve, discute e acata muitas opiniões do legislativo. 

Falta isso em Brasília? 

Não sei como vai ser a relação do Lula com a Câmara dos Deputados, mas acredito que pela pelo próprio posicionamento das bancadas, o diálogo será facilitado. Se o Lula repetir o que fez no passado, de chamar todos os prefeitos para conversar, com certeza será muito bom. Essa é minha expectativa. Que ele dialogue também com quem está na ponta, ou seja, além dos estados, com as prefeituras.

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