Ação no STF questiona mudanças
São Paulo – A aposentadoria especial do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) passou por alterações após a reforma da Previdência, implantada em novembro de 2019. A modalidade é paga a profissionais que trabalham em áreas prejudiciais à saúde.
Desde então, para se aposentar, o segurado precisa ter a idade mínima exigida conforme o tipo de atividade, no caso de quem entrou no mercado de trabalho após a reforma, ou cumprir pontuação mínima – soma da idade com tempo de contribuição – para quem já estava em atividade.
Além disso, não é mais possível converter tempo especial em comum, o que garantia um bônus nas contribuições, fazendo com que o segurado conseguisse se aposentar antes dos demais, e o cálculo mudou, assim como ocorreu com as outras aposentadorias.
As regras estão sendo contestadas no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.309. O julgamento do processo começou no último dia 17, mas foi interrompido após pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowiski.
Para a advogada Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), que figura no processo como “amicus curiae” (amigo da Corte, em latim, que fornece mais informações sobre um tema aos juízes), a exigência da idade mínima tirou o caráter protetivo do benefício. “Ficou muito mais difícil para o segurado exposto a agente nocivo”, afirma.
Além disso, para ela, a regra de cálculo é prejudicial, porque pune o trabalhador duas vezes, já que ele seguirá por mais tempo no mercado de trabalho, arriscando a saúde, e, ao se aposentar, terá um benefício reduzido pelo resto da vida, o que fere o princípio da isonomia.
“Isso está incompatível com todo o texto da reforma, porque nele consta que todo o benefício que é de natureza acidentária, causado pelo trabalho, deveria ter 100% da média salarial. Mas, no caso da aposentaria especial, não foi seguido esse mesmo raciocínio. E deveria ser, principalmente porque é uma aposentadoria que tem uma contribuição específica paga pela empresa para custeá-la”, argumenta.
Fernando Gonçalves Dias, um dos advogados da ação no Supremo junto com José Reginaldo Inácio, à época presidente da confederação, afirma que se o STF rejeitar a ADI, a modalidade especial será uma aposentadoria extinta, embora exista na legislação.
“O que vai acontecer é que essas pessoas que teriam direito à aposentadoria especial ou vão acabar adoecendo e se aposentando por invalidez ou vão receber auxílio por incapacidade ou, ainda, vão aguardar mesmo a aposentadoria comum”, diz.
O ministro Luís Roberto Barroso, relator da ADI, aponta em seu relatório, preocupação com os gastos públicos em decorrência da maior expectativa de vida da população e diz que a reforma da Previdência segue regras semelhantes válidas em todo o mundo, defendendo a constitucionalidade da medida.
“O estabelecimento de uma idade mínima para passar à inatividade de forma precoce -isto é, antes do tempo exigido dos trabalhadores em geral- não é uma exclusividade brasileira. Muito ao revés: essa já é uma realidade em vários países de longa data, havendo uma tendência global de que regimes especiais de aposentadoria se tornem cada vez mais excepcionais ou até mesmo desapareçam”, disse o ministro.
Aposentadoria especial é um benefício concedido ao segurado que trabalha em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. Ela é devida a quem tem carteira assinada pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ao trabalhador avulso e ao contribuinte individual caso seja filiado a cooperativa de trabalho ou de produção. Além disso, a exposição aos agentes nocivos precisa ocorrer de forma permanente.
Antecipação – Na prática, a aposentadoria especial é um benefício que antecipa a aposentadoria de trabalhadores que têm sua saúde comprometida por estar em área prejudicial. Essa antecipação funciona como uma proteção ao profissional.
Têm direito à aposentadoria especial todos os profissionais que comprovem trabalho em exposição constante a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde pelo período mínimo de 15, 20 ou 25 anos têm direito ao benefício. Para quem já estava no mercado de trabalho antes da reforma da Previdência, é preciso combinar tempo de contribuição com a idade e atingir a pontuação mínima exigida. Para os novos segurados, há idade mínima para se aposentar. (Cristiana Gercina)
Duas regras vigoram desde 2019
São Paulo – Antes da reforma da Previdência, os trabalhadores que atuavam em áreas consideradas como de baixo risco (como profissionais da saúde, químicos, serralheiros, vigilantes, entre outros) precisavam contribuir por 25 anos de trabalho nesses setores e podiam se aposentar com qualquer idade. Os demais, em atividades como mineiros de subsolo ou exposto a amianto, precisavam de 20 anos de contribuição e, no caso do minério de subsolo, 15 anos.
Agora, há duas possibilidades de aposentadoria. Para quem já estava no mercado de trabalho, é preciso atingir uma pontuação mínima, que combina a idade com o tempo de contribuição. Já para o trabalhador que entrou no mercado após as mudanças, a aposentadoria só é possível após completar a idade mínima exigida conforme o grau de exposição, além de ter o tempo mínimo de contribuição.
Antes da reforma, a aposentadoria especial era integral, ou seja, pagava 100% da média salarial feita com os 80% maiores salários desde 1994 — as 20% menores contribuições eram descartadas. Após a reforma, é feita uma média de todos os salários desde julho de 1994 ou desde quando o trabalhador começou a contribuir com o INSS e, depois, é aplicado o cálculo, que parte de 60% da média salarial e varia conforme o tempo de contribuição. Cada ano extra além do mínimo exigido garante 2% a mais no cálculo.
Antes da reforma da Previdência, o profissional que trabalhou parte da vida sob condição de vulnerabilidade, periculosidade ou insalubridade, mas depois trocou de profissão e passou a atuar em uma área sem risco podia converter o tempo de contribuição especial em comum.
Foi criada uma tabela, na qual o cidadão multiplica o tempo em que atuou em atividade especial pelo fator de conversão, conforme o risco. Depois da reforma, a conversão de tempo especial em comum aplica-se somente ao trabalho exercido até 13 de novembro de 2019. Com isso, os anos trabalhados em atividade especial serão contados como tempo de trabalho comum.
A comprovação de exposição a agentes nocivos é feita apresentando documentação que ateste a atividade. O formulário utilizado hoje em dia é o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), baseado no Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCat), que é expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. O PPP passou a ser exigido em 2004. (Cristiane Gercina/Folhapress)
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