Alíquota de 15% pode inviabilizar fundos exclusivos

Brasília – A cobrança de uma alíquota de 15% sobre os rendimentos futuros dos fundos exclusivos no Brasil, concentrados nas mãos dos super-ricos, tem despertado nas lideranças na Câmara a preocupação de que os ganhos da medida na arrecadação podem ter fôlego curto.
O relator da proposta, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), afirma em entrevista à reportagem que há uma preocupação crescente entre congressistas e setores econômicos de que a nova tributação resulte em migração dessas aplicações para outros instrumentos financeiros incentivados (isentos de imposto), inviabilizando os fundos exclusivos.
A previsão é votar o texto na próxima terça-feira (17), prazo antecipado em uma semana após uma primeira decisão de adiar a discussão para o dia 24 de outubro. Mas o texto ainda deve passar por ajustes.
O sistema atual permite que os detentores de fundos exclusivos recolham Imposto de Renda sobre os ganhos apenas no resgate das cotas ou na liquidação do fundo, sem o chamado “come-cotas”, cobrança semestral já aplicada a demais fundos existentes no Brasil.
A proposta do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fixa uma alíquota de 15% sobre os rendimentos, a ser paga nos meses de maio e novembro a partir de 2024, o que foi mantido pelo relator. Sobre o estoque, Pedro Paulo reduziu a cobrança a 6%.
“Como é que vai ser o movimento dos ativos, desses R$ 700 bilhões que são o estoque de investimentos nos fundos exclusivos? Um erro de calibragem e você pode ter um movimento que gera arrecadação no primeiro momento, mas mexe bastante no mercado de capitais”, afirma Pedro Paulo. “Com uma alíquota excessiva, você inviabiliza os fundos exclusivos e eles vão para outros ativos de longo prazo que têm algum tipo de incentivo tributário”, adverte.
“Recalibragem”
O deputado nega que esteja fazendo “simulações sobre recalibragem” das alíquotas cobradas daqui para frente, uma vez que já houve conversas de que o modelo proposto pelo governo e preservado em seu parecer “seria o modelo ideal”.
“Mas eu tenho escutado algumas lideranças, algumas preocupações em relação a isso. Até porque, quando há lideranças (falando), elas estão ouvindo setores econômicos, do mercado”, argumenta.
A tributação dos fundos exclusivos tramita em conjunto com a medida que altera a tributação de recursos mantidos por brasileiros em paraísos fiscais, também utilizados para fugir indefinidamente do pagamento de impostos.
A medida prevê que os lucros obtidos com recursos mantidos em paraísos fiscais serão tributados em até 22,5% sobre os ganhos, uma vez por ano, independentemente de o indivíduo resgatar ou não esses investimentos e trazê-los ao Brasil.
No caso das offshores, o relator também fez a concessão e diminuiu o peso da cobrança sobre a atualização do patrimônio, com uma alíquota de 6% sobre o ganho. Na proposta original, a alíquota era de 10%.
Apesar da redução, o relator afirma que o impacto sobre o potencial de arrecadação do governo não é uma conta meramente proporcional. A expectativa é que, com uma alíquota menor sobre o estoque, haja maior adesão dos contribuintes a esse pagamento.
“O objetivo é muito mais corrigir as assimetrias do que efetivamente você fazer um projeto Robin Hood”, afirma.
A previsão é votar o texto na próxima terça-feira (17). O novo cronograma tem o apoio da equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e foi acertado com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que estará em viagem ao exterior (Índia e China, junto com líderes da Casa), e com o primeiro-presidente da Casa, Marcos Pereira (Republicanos-SP).
A votação do projeto de taxação das offshores entrou no bojo de um acordo feito entre Lira e o governo para superar a obstrução dos trabalhos da Casa, em setembro, liderada pela oposição e pela bancada ruralista.
Os dois grupos se insurgiram contra movimentos recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) nos quais viram interferência indevida do Judiciário sobre o Legislativo.
As sessões da Câmara foram suspensas. Após reunião entre líderes, Lira acordou com a base do governo que as pautas econômicas avançariam, em especial o projeto dos fundos.
A votação do projeto das offshores é importante porque o texto, a partir do dia 16, tranca a pauta do plenário,ou seja, salvo exceções (por exemplo, PECs), nenhuma outra proposta pode avançar até que ela seja deliberada.
Apesar da aceleração, o texto ainda deve passar por novos ajustes, a pedido do governo e também para obter maior apoio da bancada do agronegócio. (Idiana Tomazelli e João Gabriel)
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