Economia

País sui generis

Uma geração de brasileiros ficou alheia e castrada à política de 1964 até 1985 por causa da ditadura militar. No amanhecer da democracia, morre Tancredo Neves, acreditando que era “o destino” que o impedia de tomar posse e viver. Com a morte de Tancredo, começa um novo ­período trágico em nossa história. Certo maranhense toma posse no lugar do ilustre mineiro e, além da corrupção de seu governo, houve inflação de 80% ao mês. O presidente do Bradesco, Lázaro Brandão, pediu ao governo para extingui-la porque ele não aguentava mais ganhar tanto dinheiro fácil da noite pro dia. Inflação é bom negócio para ricos, péssimo para assalariados e um horror para o País. O governo de Sarney ficou registrado como uma tragédia que achávamos que não se repetiria. Aí veio Collor de Melo, um jovem intrépido que julgou a inflação como um adversário de luta livre e ela seria derrotada por um golpe. Pois seu golpe matou muitas pessoas, quebrou centenas de empresas e deixou o dragão inflacionário intacto. Colocaram o jovem presidente pra fora. É clássica a cena dele deixando o palácio com o ódio estampado nos olhos e nas feições. Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso foram os dois guerreiros que derrotaram a inflação. Comenta-se que o último distribuiu dinheiro para alterar a Constituição e se reeleger. Ela foi modificada, ele foi reeleito e, nas eleições seguintes, o tiro da reeleição saiu pela culatra. Chegamos então à era Lula. Como ele pegou o mundo com valorização das commodities, o País cresceu, ele enriqueceu os banqueiros ainda mais e também tirou muita gente da miséria. Apesar disso, sua sucessora foi colocada pra fora no seu segundo mandato. O que não sabíamos então é que por trás do aparente sucesso de treze anos dos dois governos, havia roubalheira devastadora, muitos assaltos aos fundos de pensão, aos orçamentos dos ministérios e à Petrobras. Temos hoje um ex-presidente julgado e preso por corrupção e dezenas de políticos corruptos na mesma condição do líder petista. O País é sui generis no Poder Judiciário com juízes parciais, interpretando a Constituição a bel prazer partidário, têm poder de anular provas, são generosos na concessão de habeas corpus e alguns deles são mal vistos pela maioria dos brasileiros A singularidade continua quando ainda temos a risível pena a ser cumprida “em regime aberto”. No Judiciário os processos dos mortais comuns duram 20, 30 anos transitando pra lá e pra cá. Aquele da família real brasileira reivindicando de volta o Palácio da Guanabara do confisco republicano, no Rio de Janeiro, construído com dinheiro pessoal do Conde d´Eu, tem 120 anos. Que país no mundo tem ações com essa longevidade? Somente esse processo causa risos aos tribunais semelhantes pelo mundo afora. Ao substituir Dilma por Temer, este reduziu a taxa de inflação, a mais baixa hoje em dezenas de anos, daí a taxa Selic caiu de 14,25% para 6,5%, o País começa a sair da recessão, o desemprego ainda é alto, mas está diminuindo. Portanto, houve uma melhora, pequena, mas houve melhora na economia. A singularidade do País é que, apesar desses feitos, temos um presidente com baixíssima popularidade e investigado por corrupção, popularidade menor até que aquela do ex-presidente da inflação de 80% ao mês. Seus auxiliares diretos também são processados por corrupção, essa eterna palavra neste País ­infeliz, fazendo a população acreditar que há mutretas demais no Planalto. Não por último e nem menos importante, a maioria da população duvida da honestidade das urnas eletrônicas. Como é possível que um governo e suas instituições nestas condições resistam e não tenham o mesmo destino de Collor e Dilma? Entre outros motivos por que, com esperança infinita, em outubro próximo haverá nova eleição para os cargos dos Executivos ­nacional e estaduais e temos a ilusão de que as tragédias que vivemos nos últimos anos, de 2019 em diante, serão diferentes. Queira Deus que sejam, mas o que ainda faz deste País algo sui generis é saber que os currais eleitorais vão reeleger pelo menos 75% do pior do atual Congresso Nacional, ratificando os erros do passado, impedindo as mudanças que necessitamos. É possível que tudo continue como antes, mesmo que o extremista da direita Bolsonaro seja eleito. Da esquerda à extrema ­direita, somos únicos, singulares, somos um país sui generis. * Psicanalista

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