Ambiente não está favorável para investidores, diz Brumer; leia entrevista exclusiva

Os indicadores macroeconômicos apresentam perspectivas positivas, com uma elevação do Produto Interno Bruto (PIB), uma inflação controlada, reservas internacionais sólidas e queda nos níveis de desemprego. Mesmo assim, os investimentos necessários não estão acontecendo. A explicação para isso está no ambiente desfavorável que os investidores enfrentam.
É o que ressalta Wilson Brumer em uma entrevista exclusiva ao Diário do Comércio. De acordo com ele, fatores como o elevado Custo Brasil, a insegurança jurídica e a enorme complexidade tributária são alguns dos principais obstáculos enfrentados por investidores no País.
Formado em Administração de Empresas pela Faculdade de Ciências Econômicas Administrativas e Contábeis (Fumec), o renomado executivo ocupou o mais alto escalão de gigantes da mineração e da siderurgia, como Vale, BHP, Acesita (atualmente Aperam South América) e Usiminas. E transitou em posições estratégicas dentro do governo de Minas Gerais.
Na oportunidade, Brumer analisou o atual quadro econômico mineiro e brasileiro, a reforma tributária, a atuação do governador Romeu Zema (Novo) e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a proposta do presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para solução da dívida bilionária dos estados com a União. Ele ainda avaliou as projeções de aportes das mineradoras e siderúrgicas e pontuou as oportunidades que os setores têm pela frente.
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Na próxima segunda-feira (12), o executivo lançará sua biografia intitulada “Brumer e a Testa Fria de Jacó”, obra, de autoria da jornalista Júnia Carvalho, que mergulha e resgata sua trajetória pessoal e profissional. Durante a conversa, Brumer também destacou o que os leitores podem esperar da publicação.
Como você avalia o cenário econômico atual de Minas Gerais e do Brasil?
Sob o ponto de vista macroeconômico, eu vejo que há alguns sinais positivos. A inflação está sob controle, as reservas cambiais do Brasil continuam pujantes, o PIB não teve aquele crescimento fantástico que gostaríamos, mas teve um crescimento, e o desemprego está caindo. Mas a pergunta que fica é: por que não estão acontecendo os investimentos que o País precisa? Está faltando um clima adequado para a atração do investidor. E por que esse clima está desfavorável?
Primeiro, as medidas que, por vezes, são tomadas causam insegurança jurídica e perplexidade. Outro ponto é que, pós-pandemia, tínhamos uma grande oportunidade com a mudança na geografia das cadeias produtivas, mas o Brasil não aproveitou. O terceiro é o que falamos há décadas: o País está caminhando para a desindustrialização. Isso é notório, mas o Brasil ainda não completou seu processo de industrialização, e a indústria não é “incoerente” com outros setores. Na Alemanha, por exemplo, a indústria é forte e ao mesmo tempo o turismo, o setor financeiro.
Há alguns pontos que devemos elogiar, como a recriação do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio e o programa da neo indústria, lançado recentemente. Porém, a meu ver, precisamos ser mais ágeis para não perder os “cavalos selados” que estão passando diante de nós.
Temos também problemas de competitividade. O Custo Brasil é exacerbante, a complexidade tributária enorme, nossa infraestrutura é frágil. Às vezes, a ideologia inibe a tomada de decisões, que são lentas. Ainda temos muito presente no País o conceito de poder, ao invés de nação.
Mas não faltam oportunidades para o Brasil. Não sou pessimista por natureza. Onde há crise, há oportunidades, mas temos que criar esse ambiente. Temos que reconhecer que precisamos do investimento externo, e esses investimentos vão para países onde tem menos problemas.
Qual a sua opinião sobre a reforma tributária? Ela será benéfica para o setor produtivo?
A reforma será implantada em etapas. Não é algo que você simplesmente vira a chave no dia seguinte. Mas ela é positiva no médio e longo prazos, a partir do momento em que torna mais simples o pagamento de tributos. O Brasil ainda é um país muito caro em termos de tributação.
Um dos pontos positivos que vejo é uma certa distribuição mais equânime da carga tributária. Outro ponto é deixar de tributar o investimento. Há muitos pontos positivos, porém, como disse, não é um processo que acontece da noite para o dia. Isso deve ser muito bem explicado aos investidores externos, e os investidores que têm essa visão de longo prazo vão entender.
Os investimentos que foram anunciados pela indústria da mineração e pelo setor siderúrgico para o Brasil e Minas Gerais estão dentro do esperado ou cabe mais?
O Brasil ainda não conhece seu potencial mineral. Ainda somos um país com poucas pesquisas geológicas. Há um movimento agora bastante forte em relação aos minerais considerados estratégicos. Acredito que o Brasil, como um todo, e Minas Gerais, por suas características, têm, sim, um grande potencial de crescimento. E os investimentos anunciados certamente levam em conta projetos que estão ficando mais maduros e ao mesmo tempo projetos de reposição e modernização das próprias minas. Então, não há razão para não acreditarmos neles.
A siderurgia enfrenta problemas estruturais. Quando o Brasil importa produtos que têm aço, está importando algo que afeta seu cliente. Não sou contra a importação, mas ela deve ser equânime. Como os produtores locais carregam problemas com o Custo Brasil, o País acaba sendo afetado.
Quando passei pela Usiminas, o custo para produzir aço no Brasil era, à época, e não acho que mudou muito de lá para cá, três vezes mais caro do que, por exemplo, na China. Por isso, de certa maneira, o Brasil perdeu “n” investimentos do setor siderúrgico com o passar dos anos.
O Brasil tem condições de ampliar seus investimentos com modernização das plantas, atualização tecnológica e assim por diante. Não há porque não acreditar nos investimentos que estão sendo feitos. Agora, o aumento da capacidade produtiva deve levar em conta a visão geral do mercado. Atualmente, deve ter umas 500 milhões de toneladas de capacidade ociosa de aço no mundo.
Agora, o País precisa pensar como a Europa, onde não consigo antever novas usinas siderúrgicas sendo construídas por problemas de energia e mão de obra. O Brasil pode ter uma oportunidade de agregar valor ao seu minério, trazendo plantas que complementam as laminações da Europa. É um caminho que antevejo para eventuais novas unidades no País. Para isso, precisamos reduzir o custo de investimento, porque se continua três vezes mais caro não é atrativo para o investidor.
A proposta do Pacheco, que sugere federalizar estatais, como a Cemig, Copasa e Codemig, para abater o débito de Minas com a União é o melhor caminho para resolver o problema?
Se considerar os valores de mercado hoje dessas empresas, são valores que pouco vão resolver em relação ao montante da dívida. Como são empresas de capital aberto, não sei se há também problema de mudança de controle. Não sei se ao mudar pode significar que os acionistas minoritários tenham direito a esse mesmo valor, que é a chamada OPA, Oferta Pública de Ações.
Talvez o Brasil precise fazer uma limpeza de processos para encontrar uma forma de resolver definitivamente o problema do endividamento dos estados, que hoje são incompatíveis com o crescimento deles. Essa limpeza tem que ser enfrentada. Soluções paliativas não vão resolver. A própria taxa de juros faz com que os estados não consigam nem pagar os juros oriundos da dívida. Tenho dúvidas se esse é o caminho certo em função desses temas que mencionei.
Qual a sua avaliação sobre a atuação do governo de Romeu Zema?
O Zema é reconhecido como um bom gestor. Ele pegou o Estado em uma situação bastante complexa e tem feito um bom trabalho, tanto é que ele é reconhecido pela sociedade. Ele ainda tem um problema de não ter o apoio total na Assembleia Legislativa. Recentemente, convivi com ele em uma viagem ao Japão, onde ele expressou muito bem sobre a necessidade de tornar o Estado mais acessível para investimentos. No entanto, Minas continua com muitos problemas de infraestrutura, como na região onde desejam criar o “Vale do Lítio”. Porém, o Estado tem um potencial enorme. Veja, por exemplo, os investimentos em energia solar no Norte. Mas eu sugiro uma discussão: com a chegada dessas energias, qual é o novo potencial que se cria para a região?
E sobre o governo Lula?
Sobre o governo federal, eu vejo que o País não pode continuar dividido. Isso impede que se discuta realmente os problemas de modo objetivo e com a velocidade que o mundo demanda. E aí não é apenas um problema do Executivo. Não quero entrar em questões ideológicas, mas também temos problemas no Congresso, problemas de segurança jurídica. Há discussões sobre o próprio papel do STF que, às vezes, entra em aspectos que não deveriam ser de sua atribuição. Gastamos muito com leis e com o processo judiciário. Precisamos implementar reformas estruturais.
Conte um pouco sobre sua trajetória e o que os leitores podem esperar de sua biografia
Eu tive muita relutância em fazer essa biografia para não parecer vaidoso. Modéstia à parte, na década de 90, fizemos coisas meio inéditas no Brasil. Na época de Vale, me lembro que lançamos programas que ainda eram ainda pouco praticáveis no País. E daí muita coisa aconteceu na minha trajetória. Também conto um pouco sobre a chegada do meu pai no Brasil e da luta da minha mãe. Procuro compartilhar alguns pensamentos sobre a minha vida pessoal e profissional. Espero que esses pensamentos e os casos que contei ajudem a tornar o livro leve para o leitor.
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