Economia

Brumadinho busca diversificação econômica

Município e Estado ainda sofrem consequências econômicas e sociais de rompimento; Vale cumpriu 40% do Programa de Descaracterização
Brumadinho busca diversificação econômica
No dia 25 de janeiro de 2019, Barragem B1 da Vale, na mina Córrego do Feijão, se rompeu e matou 270 pessoas; três “joias”, como são chamadas as vítimas, permanecem desaparecidas | Crédito: Adriano Machado/Reuters

Quatro anos se passaram desde aquele fatídico 25 de janeiro de 2019. Desde então, Brumadinho (RMBH), nunca mais foi a mesma. Minas Gerais também não. Nem mesmo o Brasil ou quiçá a mineração. O rompimento da Barragem B1 da Vale, na mina Córrego do Feijão, que provocou uma avalanche de cerca de 10 milhões de metros cúbicos de lama, matando 270 pessoas e soterrando casas, animais e vegetação deixou memórias irreparáveis a todos.

Aqueles que perderam suas joias (como são chamadas as vítimas), a economia da cidade e do Estado, a própria mineradora e as práticas desta atividade de tamanha relevância comercial Brasil e mundo afora ainda sofrem as consequências desta que ficou marcada como uma das maiores tragédias ambiental, industrial e de impacto social já registradas no País. Marcos esses evidenciados por números assustadores: três das 270 vítimas fatais ainda não foram encontradas, 300 quilômetros do Rio Paraopeba foram contaminados, 17 municípios foram afetados, houve a perda de 138 hectares de florestas nativas e 16 pessoas físicas e duas jurídicas estão sendo em processo de responsabilização pela Justiça.

Naquele ano, Minas Gerais amargou impactos sociais e econômicos. A produção industrial do Estado encerrou 2019 com queda de 4,96% sobre o exercício anterior, conforme dados da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). A estimativa é que a cadeia como um todo tenha amargado uma perda superior a R$ 22 bilhões em termos de faturamento. Isso representa 4% do PIB mineiro.

Em Brumadinho, já em 2019, a principal preocupação era em relação ao futuro. E ainda é, já que a mineração responde por grande parte das receitas do município e todas as demais atividades econômicas da cidade acabavam tendo algum vínculo com o setor.

Na mineração, muitos foram os aprendizados. Desde o rompimento, o setor tem se engajado em adotar novas práticas para elevar a qualidade da gestão de riscos, com foco na segurança operacional, segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).

A legislação de barragens de mineração no Brasil e em Minas Gerais também avançou com mudanças na Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) e a lei 23.291/2019 originada pelo projeto “Mar de Lama Nunca Mais”. A lei estadual previa a descaracterização de 41 estruturas a montante no Estado até 25 de fevereiro do ano passado, mas as mineradoras não cumpriram o prazo e um acordo foi feito entre governo e empresas estabelecendo indenizações por dano moral coletivo e novos prazos para conclusão, sob pena de sanções, além da fixação de medidas adicionais de segurança.

Descaracterização de barragens se torna obrigatória após Brumadinho

Apenas em relação à descaracterização de barragens, no balanço de reparação, a Vale diz que já investiu R$ 5,8 bilhões no descomissionamento de suas estruturas e que eliminou mais cinco barragens a montante em 2022, alcançando 40% do Programa de Descaracterização. Já são 12 estruturas extintas desde 2019.

A companhia também informa que mais de 13,5 mil pessoas já fecharam acordo de indenização em reparação aos danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho. E que já desembolsou um total de R$ 37,2 bilhões, de janeiro de 2019 a dezembro de 2022, incluindo pagamentos de indenizações individuais, cumprimento do acordo judicial de reparação integral e outras ações de reparação.

Especificamente sobre o acordo de reparação assinado em fevereiro de 2021 entre o governo do Estado, a empresa e instituições de Justiça, de R$ 37,7 bilhões, a Vale afirma que cerca de R$ 23,6 bilhões já foram desembolsados. O documento prevê uma série de medidas de reparação aos danos econômicos, sociais e ambientais provocados pelo rompimento na região atingida e em toda Minas Gerais.

“Cerca de 300 projetos estão em fase de desenvolvimento e outros 24, voltados para os municípios impactados, estão em andamento. Desses, nove são para Brumadinho e 15 para os outros 25 municípios da Bacia do Paraopeba”, detalha a mineradora.

Além disso, a Vale já realizou desembolsos de R$ 4,5 bilhões referentes às quatro parcelas do Programa de Mobilidade e de Fortalecimento do Serviço Público. Outros R$ 3,4 bilhões foram destinados a projetos de demandas das comunidades atingidas; R$ 4,6 bilhões para programa de Transferência de Renda à população atingida; R$ 2,1 bilhões para programa de Segurança Hídrica, entre outras.

De acordo com o governo de Minas, o foco principal do acordo é a população diretamente atingida. Neste contexto, foram definidos 130 projetos socioeconômicos, nas áreas de saúde, agricultura, infraestrutura, mobilidade e desenvolvimento social. Ainda como parte das ações socioeconômicas na região, atualmente 109 mil pessoas estão recebendo auxílio financeiro pelo Programa de Transferência de Renda (PTR).

O Executivo Mineiro também destaca a execução de ações para reparação dos danos ambientais, incluindo ações emergenciais de manejo de rejeito, montagem de estruturas de contenção e recuperação de fauna e flora para a mitigação dos impactos. Para tanto, foi estimado o valor de R$ 5 bilhões – mas não há teto de gastos para execução.

Além dos projetos na região atingida, o acordo de reparação também garantiu R$ 11,06 bilhões em recursos para o Estado realizar projetos em diversas áreas, visando melhorias para toda a sociedade. São obras de infraestrutura e mobilidade, investimentos em saúde, segurança, serviços, agricultura, meio ambiente, entre outras. Segundo o governo, são mais de 50 obras e projetos pré-definidos já em execução, em diferentes fases. Foram destinados recursos para os 853 municípios de Minas Gerais realizarem obras estruturantes.

Brumadinho ainda enfrenta desafio de diversificação econômica

Conforme estipulado pelo acordo, a Região Metropolitana de Belo Horizonte, incluindo Brumadinho, vai receber R$ 8,8 bilhões, o que corresponde a 79,9% dos investimentos. A cidade, epicentro da tragédia, será contemplada com R$ 1,5 bilhão.

“O futuro é mais temeroso do que foi o passado e do que é o presente. Precisamos desses recursos para trabalhar a diversificação econômica da cidade, que ainda é o principal desafio. Brumadinho continua altamente dependente da mineração e a decisão da Vale de não mais minerar na região impacta fortemente as receitas do município”, afirma o secretário de Comunicação da Prefeitura de Brumadinho, Décio Júnior.

Neste sentido, o Executivo Municipal já preparou uma lista com 103 projetos que podem auxiliar essa necessária transformação econômica local, mas todos dependem da aprovação dos compromitentes do acordo – Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Defensorias Públicas e Justiça.

O principal objetivo é atrair empresas para além do setor mineral que possam alavancar a arrecadação e ampliar a geração de emprego renda na região. O município já possui áreas que podem ser desapropriadas para implantação do Distrito Industrial. A infraestrutura dessa área será feita com recursos que cabem à Brumadinho, vindo do acordo, mas a grande dificuldade diz respeito à falta de infraestrutura e de logística até uma das rodovias de acesso à cidade (BR-040 e BR-381).

A expectativa dos gestores municipais é que o Rodoanel, obra estadual que também será feita com parte dos recursos do acordo, possa auxiliar neste processo. Além disso, o município já apresentou à Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade o desenho técnico de uma nova estrada de ligação direta e segura de Brumadinho à BR-381.

Em relação aos setores de comércio e serviços na cidade, o representante da prefeitura afirmou que foram até alavancados nos últimos anos, em função do auxílio pago pela mineradora. Em termos de receitas do município, a título de exemplificação, as advindas do recolhimento do IPVA somaram R$ 4,8 milhões em 2020 e R$ 5,8 milhões em 2021. As do Fundo Especial do Petróleo (FEP) chegaram a R$ 7,1 milhões em 2020 e R$ 9,9 milhões em 2021. A Lei Kandir saiu de nula em 2020 para R$ 1,3 milhão em 2021. E o ISSQN de R$ 69,7 milhões para R$ 79,5 milhões, na mesma ordem.

Por fim, o turismo, atividade que foi altamente impactada logo após a tragédia, com o Instituto Inhotim chegando a ter perdas de até 90% no número de visitações em 2019, já se recuperou e voltou aos patamares anteriores ao rompimento da barragem. No entanto, conforme o secretário, pode melhorar.

“Temos projetos para instalação de um teleférico na Serra do Rola Moça até Casa Branca e também que preveem melhoria das vias rurais de Casa Branca e Piedade do Paraopeba, de forma que as pessoas tenham outros destinos da região para visitar. Mas isso também depende de investimentos em infraestrutura e acesso”, diz

E, assim, passados quatro anos do rompimento, ficam os números, os impactos, as promessas e as expectativas de que as três joias restantes sejam encontradas e as leis cumpridas, para que nunca mais, tragédias anunciadas como as de Brumadinho e de Mariana (Barragem de Fundão, da Samarco, ocorrida em 2015), voltem a acontecer.

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