Disparidade salarial cresce, e mulheres ganham 20,7% menos do que homens no Brasil

Brasília e São Paulo – A disparidade salarial entre homens e mulheres no Brasil aumentou no período de um ano, e mulheres receberam, em média, 20,7% menos do que homens em 2023, mostra novo levantamento das empresas no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O segundo relatório de transparência salarial, que será divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pelo Ministério das Mulheres nesta quarta-feira (18), foi compilado a partir de informações enviadas por 50.692 empresas, todas com cem ou mais empregados. O envio dos dados está previsto na lei de igualdade salarial aprovada em 2023.
No primeiro documento, divulgado pelo governo em março, a remuneração das mulheres era 19,4% menor do que a dos homens, com base em números de 2022.
A subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Paula Montagner, ressalta que o desequilíbrio no mercado de trabalho reflete o fato de as mulheres geralmente ocuparem postos que pagam salários menores.
“No ano de 2023, houve um forte crescimento da geração de empregos para mulheres, mas são vagas que pagam menos. Então, a diferença [salarial entre homens e mulheres] se ampliou um pouco”, afirma. “Esses postos de trabalho precisam de salários maiores.”
Em 2023, a remuneração média das mulheres foi R$ 3.565,48, enquanto a de homens ficou em R$ 4.495,39.
Em posições de chefia, a discrepância média entre homens e mulheres é ainda maior e chega a 27% para dirigentes e gerentes (em 2022, a cifra era de 25,2%).
O levantamento do governo mostra que a desvantagem das mulheres é ainda maior quando se faz o recorte de raça. De acordo com o relatório, as mulheres negras recebem 50,2% da remuneração dos homens brancos no Brasil. Em 2023, o ganho médio da mulher negra foi de R$ 2.745,76, enquanto a dos homens não negros foi de R$ 5.464,29.
“As mulheres negras estão concentradas em ocupações da base da pirâmide, principalmente serviços domésticos, serviços de limpeza, serviços de alimentação, de saúde básica. Os homens, por outro lado, estão concentrados na indústria de transformação, nos serviços públicos, nas atividades de direção e gerenciamento”, afirma Montagner.
Em 42,7% dos estabelecimentos com pelo menos cem empregados que participaram do levantamento, as mulheres pretas ou pardas eram até 10% do contingente de funcionários.
De acordo com a subsecretária do Ministério do Trabalho, a ideia agora é conversar com os estabelecimentos que apresentaram dados mais positivos para então compartilhar as boas práticas com todas as companhias brasileiras.
Confirme a legislação, se as empresas com cem ou mais funcionários não publicarem o relatório de transparência salarial, deve ser cobrada multa administrativa de até 3% da folha de pagamento, com limite fixado em cem salários mínimos.
Segundo Montagner, nenhuma empresa foi multada depois da divulgação do primeiro relatório. “A gente vai tentar conversar com as empresas. Primeiro educa e, se a empresa for resistente, é multada”, diz.
Quanto à disputa travada na Justiça por algumas empresas contra a divulgação do relatório de transparência salarial, a subsecretária diz que o governo trabalha para mostrar que informações sigilosas não estão sendo reveladas, mas acrescenta que todas as decisões judiciais estão sendo cumpridas e que 450 relatórios de companhias não foram publicados.
Nesta quarta, o Ministério das Mulheres também vai divulgar o Plano Nacional de Igualdade Salarial e Laboral entre Mulheres e Homens, com 79 ações divididas em três eixos, abordando aspectos como acesso e ampliação da participação das mulheres no mundo do trabalho, a permanência delas nas atividades e a valorização profissional das mulheres.
Empresas ainda falham em garantir diversidade em cargos de liderança
Parte das maiores empresas e entidades financeiras do país avançou na diversidade de contratação, mas cargos de escalão mais altos continuam sendo majoritariamente ocupados por homens brancos. As suas lideranças, no entanto, estão mais convencidas de que isso precisa mudar.
É o que mostra levantamento do Instituto Ethos divulgado nesta quarta-feira (18), o “Perfil Social, Racial e de Gênero das 1.100 Maiores Empresas do Brasil e Suas Ações Afirmativas 2023/2024”. Realizado desde 2001, o estudo abrange aspectos de diversidade, equidade e inclusão em grandes empregadores do país e chega em 2024 à sua sétima edição, feita pelo Ipec.
Responderam aos questionários 131 empresas e instituições financeiras do ranking das mil maiores empresas e 100 maiores instituições financeiras do Brasil elaborado pelo veículo Valor Econômico em 2022. As participantes empregam conjuntamente 1,1 milhão de pessoas.
O estudo concluiu que, embora a representatividade tenha avançado em cargos de entrada, como estagiários, aprendizes e trainees, mulheres ainda são menos do que um quinto nos conselhos de administração das empresas analisadas, e pessoas negras não chegam nem a 10%.
O número de mulheres nos conselhos de administração, por exemplo, aumentou de 11% em 2015 para 18,6% em 2023. No Quadro Executivo, o número no período foi de 13,6% para 27,4%. Nos quadros de supervisão, chefia e coordenação, o índice caiu dois décimos, indo para 38,6% com relação a 2015.
Apesar da melhora em alguns aspectos, os índices estão longe da divisão igualitária nas cadeiras entre homens e mulheres.
É o que o relatório chama de “afunilamento hierárquico” – a maior dificuldade de alcançar níveis satisfatórios de diversidade em cargos mais avançados na “escada corporativa”. A expressão também se aplica a outros marcadores sociais, como cor e raça, orientação sexual e deficiências físicas.
Quando o recorte abrange cor e raça, a desigualdade é ainda maior. Nos conselhos de administração, o percentual de pessoas brancas é de 93,8%, frente a 5,9% de pessoas negras, 0,2% de pessoas amarelas e 0,2% de pessoas indígenas. Para Quadro Executivo e Diretoria, são 84% de pessoas brancas nos cargos, contra 13,8% de negras, 2,2% de amarelas e 0,1% indígenas.
As pessoas indígenas não atingem nem 1% dos cargos em nenhuma das categorias das pessoas empregadas.
Para Ana Lucia Melo, diretora-adjunta do Instituto Ethos, o avanço identificado foi a preocupação das lideranças com a mudança no perfil de funcionários das empresas.
“Em 2016, chamou atenção negativamente o fato de as lideranças estarem ‘satisfeitas’ com a ausência dessa diversidade nos níveis hierárquicos mais altos, especialmente no espaço de tomada de decisão. Hoje, isso mudou, houve ganho na consciência”, afirma Ana Lucia.
A pesquisa identificou que, entre as principais lideranças executivas inquiridas, 69,7% acreditava que havia menos mulheres do que o ideal nos conselhos de administração. Para os cargos executivos e de diretoria, o número foi de 66,7%, um aumento em relação a 2010, quando o indicador marcou 55,2% A pergunta sobre os conselhos de administração foi novidade dessa edição da pesquisa.
Com relação às pessoas negras em cada nível hierárquico, a percepção também se mantém: 86,9% acham que pessoas negras estão subrepresentadas nos conselhos, e 86% acreditam que isso ocorre nos quadros executivos e cargos de diretoria (em 2010, eram 54,3%).
“O Brasil já foi o país que acreditava na democracia racial. Hoje isso é refutado. Há nove anos, víamos que as lideranças empresariais não se incomodavam com não haver mulheres, pessoas negras, pessoas com deficiência nos espaços de liderança. Hoje, isso mudou, e aumentou nossa expectativa sobre o quanto essa mudança de percepção vai impactar a mudança dessa demografia daqui para frente”, ressalta Melo.
Para ela, o desafio, hoje, é o ritmo desses avanços e a dimensão interseccional.
“Precisamos ganhar em celeridade, porque há um risco de a questão da agenda de diversidade ser tratada como onda passageira. Isso precisa ser feito, e não ficar só no campo do compromisso, visão, discurso. Assim, o impacto será não só na composição das empresas, mas também na qualidade do emprego e nas condições de vida dessas populações”, afirma.
Reportagem distribuída pela Folhapress
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