Economia

Solução para dívida de Minas Gerais pode extrapolar governo Zema

STF prorrogou o vencimento do débito em mais 90 dias; politização do tema limita acordo entre União e Unidades Federativas
Solução para dívida de Minas Gerais pode extrapolar governo Zema
Membros do alto escalão de Romeu Zema (Novo) já admitem que a nova data não será cumprida | Crédito: Gil Leonardi / Imprensa MG

Os constantes adiamentos do pagamento da dívida de Minas Gerais com a União concedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sinalizam que motivações diversas, entre elas a politização do tema, podem estender a solução do problema por mais tempo do que a atual prorrogação, de 90 dias, concedida pelo ministro Nunes Marques, na última sexta-feira (19). Dependendo da aprovação de um projeto de lei (PL) complementar que abarque todas as Unidades Federativas (UF), o imbróglio pode, inclusive, ficar para a próxima gestão estadual, a partir de 2027.

Economistas consultados pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO não acreditam numa solução no curto prazo e citam a falta de consentimento entre os interlocutores na construção do projeto. Vale lembrar que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), disse que o PL será enviado pelo Ministério da Fazenda ao Congresso Nacional ainda este mês. E no domingo (21), durante cerimônia de entrega da Medalha da Inconfidência, em Ouro Preto (região Central), o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Tadeu Martins Leite (MDB), afirmou que a prorrogação foi necessária para que o governo federal, o Congresso e o governo do Estado consigam avançar nas negociações sobre um acordo.

No mesmo evento, o vice-governador mineiro, Professor Mateus (Novo), disse que a extensão do prazo é importante, ainda que o STF não tenha atendido integralmente ao pedido do Estado, de 180 dias. Ele espera que negociação seja a mais rápida possível, mas não crê que 90 dias seja suficiente.

O economista do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ezequiel Rezende, por exemplo, avalia que as ofertas postas à mesa para abatimento da dívida, como a federalização de estatais e investimento em educação profissionalizante, não obtiveram consentimento do governo mineiro.

Para ele, a discordância deve-se por intenções outras do governador Romeu Zema (Novo), que pretende privatizar estatais e investir em infraestrutura em vez da educação profissionalizante. Assim, a discussão se politizou e conta com poucas ações concretas. “Por conta de justamente estar sendo politizada, é provável que isso não se resolva ainda nessa gestão. E talvez só se resolva na próxima, com outro governador, dependendo de outras condições políticas”, afirma Rezende.

Essa disputa entre União e estados, incluindo Minas Gerais, com as condições de pagamento da dívida como pano de fundo, é histórica, explica o doutor em Economia pela mesma universidade, Guilherme Cardoso. “Esse tipo de barganha acontece também na negociação de dívida de países periféricos com o Fundo Monetário Internacional (FMI)”, explica.

Ele conta que as Unidades Federativas entraram em crise e perderam muito desse “poder de barganha” com a abertura econômica promovida pela União nos anos 1990. Essa abertura deu início às políticas de soma zero entre as UFs, em que o ganho de uma é, necessariamente, a perda da outra. E é também o caso da guerra fiscal entre os estados.

Com isso, a dívida contraída pelos estados com a União ficou impagável e se arrasta desde então. De um lado, o governo federal oferece melhores condições de pagamento, por meio de investimentos dos estados em determinadas políticas públicas de seu interesse. Do outro, as UFs tentam negociar por condições que atendam suas intenções. “Ou seja, estão sempre barganhando e sempre pedindo adiamento. E fica muito difícil tomar uma postura mais rígida. Os estados, por mais que tenham perdido poder de barganha, ainda são responsáveis por bastante provisão de serviços públicos”, comenta Cardoso.

O coordenador do curso de Ciências Econômicas do Ibmec-BH, Ari Araújo, aponta que um plano negociado, com solução – permanente – entre Estado e governo federal, é essencial para viabilizar a situação estadual já no curto prazo. “Acredito que o acordo sairá. Mas ainda não está claro em quais bases”, afirma.

Mesmo otimista com um acordo, o economista vê que a dívida de Minas Gerais não será solucionada necessariamente em 90 dias, prazo concedido pelo STF. É provável que seja preciso uma nova prorrogação. “Acredito que uma extensão desse prazo deve ocorrer na medida que a negociação esteja avançando, se as partes estiverem trabalhando numa solução definitiva e permanente para o problema”, finaliza Araújo.

Atrasos do pagamento da dívida prejudicam economia de Minas

Rezende aponta que os constantes adiamentos do pagamento da dívida são negativos para Minas Gerais em diversos pontos. Especialmente, por gerar instabilidade fiscal e insegurança jurídica no Estado, por desconhecimento da real situação fiscal estadual. Isso ocorre tanto para quem trabalha no governo, quanto para quem presta serviço à gestão.

“As dificuldades em torno dessa renegociação ocorrem por conta da precariedade das informações que são colocadas à disposição ao público e para a União, por parte do governo de Minas”, comenta. Ele alerta, por fim, que a incerteza gerada pelos constantes atrasos é prejudicial ao Estado no âmbito da atração de investimentos, da perspectiva de crescimento e do fornecimento dos serviços públicos.

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