Copom deve fazer alerta sobre os riscos de medidas para baratear os combustíveis

Brasília – O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que se mostrou menos pessimista com a situação fiscal nas duas últimas reuniões, deve voltar a fazer alertas sobre riscos em meio ao empenho do governo para baratear os preços dos combustíveis usando os cofres públicos.
Essa é a avaliação de alguns economistas ouvidos pela reportagem às vésperas do encontro do colegiado, que decidirá hoje o novo patamar da taxa básica de juros (Selic).
A expectativa consensual do mercado é de uma alta de 0,5 ponto percentual, com a Selic passando de 12,75% a 13,25% ao ano. Quanto ao fim do ciclo de aperto monetário, os analistas esperam que o BC não descarte um ajuste final em agosto dado o cenário de inflação persistente e disseminada e de novas percepções de risco fiscal.
Para o ex-diretor do BC, Alexandre Schwartsman, o colegiado deve repetir o tom mais duro usado na “ata dos recados”, divulgada em fevereiro.
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Na ocasião, o Copom afirmou que “políticas fiscais que tenham efeitos baixistas sobre a inflação no curto prazo podem causar deterioração nos prêmios de risco, aumento das expectativas de inflação e, consequentemente, um efeito altista na inflação prospectiva.”
“Eles vão ter de dar esse alerta, basicamente resgatar a linguagem que foi usada para dizer ‘não é assim que o jogo é jogado, não me venha reduzir a inflação de curto prazo mexendo com imposto e, ao mesmo tempo, comprometendo a saúde financeira de estados e do próprio governo federal’, ainda mais para ganhar a eleição”, afirmou.
Segundo colocado nas pesquisas de intenção de voto a menos de quatro meses das eleições, o presidente Jair Bolsonaro (PL) demonstra preocupação com o aumento nos preços dos combustíveis, tido como obstáculo à sua reeleição.
O pacote de medidas inclui o PLP 18, que cria um limite na alíquota de ICMS sobre combustíveis, energia, telecomunicações e transportes e a PEC dos Combustíveis, que autoriza o governo a compensar a perda de arrecadação de estados que zerarem a cobrança do ICMS sobre diesel e gás de cozinha.
Ao mesmo tempo, o Executivo se dispõe a zerar o PIS/Cofins e a Cide da gasolina e do etanol até o fim do ano.
Heron do Carmo, professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária, da Universidade de São Paulo (FEA-USP), ressalta que tais propostas podem reduzir a inflação no curto prazo, mas comprometer a economia nos próximos anos. “Quando você piora a situação fiscal, você contrata uma inflação maior futuramente ou uma dificuldade maior para reduzir a inflação”, afirmou.
Se aprovadas sem alterações e com 100% de repasse aos preços finais, tais medidas poderiam reduzir o IPCA de 2022 em até 3,1 pontos percentuais, na estimativa do Santander. Por outro lado, o banco prevê um aumento de 0,6 ponto percentual nas projeções de inflação para 2023, que é o horizonte de política monetária do BC.
“Acredito que o BC pode abordar a questão fiscal no âmbito do balanço de riscos para a inflação, uma vez que algumas das medidas em debate no Congresso podem afetar o processo de ancoragem das expectativas inflacionárias”, disse o superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander, Mauricio Oreng.
A economista-chefe para Brasil do HSBC, Ana Madeira,, destaca que a preocupação fiscal coloca um adicional na conta. “A gente sabe o quão difícil é reverter esse tipo de medida. A nossa percepção é que, quanto mais se gasta, mesmo que temporariamente, os investidores acabam colocando um pouquinho de prêmio de risco a mais”, afirmou.
O HSBC aguarda a materialização das decisões para, se necessário, revisar suas estimativas – atualmente, tem uma projeção de inflação de 8,3% para o fim deste ano e de 4% para 2023.
Nesse contexto, prevê que o BC eleve a Selic a 13,25% e feche seu ciclo nesta semana, embora deixe a porta “entreaberta” para o encontro de agosto, a depender dos dados. (Nathalia Garcia)
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