Legislação

Casos de Covid-19 podem ser acidentes ocupacionais

Casos de Covid-19 podem ser acidentes ocupacionais
Crédito: Marcelo Camargo/ABr

Brasília – Em 2020, 21 mil trabalhadores se infectaram por Covid-19 exercendo tarefas em seu ambiente de trabalho, de acordo com o Observatório Digital de Segurança e Saúde no Trabalho, uma parceria entre a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Ministério Público do Trabalho (MPT).

É o caso do motorista de uma transportadora no interior de Minas Gerais que não resistiu à doença. Quase um ano depois de morrer, a Justiça do Trabalho mineira condenou a empresa a pagar R$ 200 mil de indenização à família do motorista.

Para determinar a indenização, o juiz de Três Corações, no Sul de Minas, considerou que o Supremo Tribunal Federal (STF) entende a contaminação por coronavírus como acidente ocupacional. Ele levou em conta que, ao enviar o motorista para as viagens, a empresa assumiu o risco de contaminação em meio à pandemia.

A advogada da família do empregado, Aline Junqueira, relata que foi comprovada a infecção por Covid-19 como acidente ocupacional. Segundo ela, a família está abalada, e a indenização é somente uma forma de responsabilizar a empregadora.

“Restou comprovado que o motorista estava trabalhando para a empresa por dez dias seguidos, não havia fornecimento de álcool e após manobristas usarem a carreta, a cabine não era higienizada. A empresa não tomou os devidos cuidados para proteção do empregado. A condenação é a justiça sendo feita, pois dinheiro nenhum nesse mundo trará o pai e o marido de volta”, destaca Aline Junqueira.

O desembargador do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, Sebastião Oliveira, diz que o assunto é complexo, mas, em casos comprovados, é possível atribuir a Covid-19 a doenças adquiridas no exercício do trabalho.

“É verdade que há uma previsão na lei de que a doença endêmica, equiparada nesse caso à pandêmica, não seria relacionada ao trabalho, mas se houver comprovação de que a doença ocorreu resultante da exposição do contato direto pela natureza do trabalho, ela deve ser enquadrada como acidente ocupacional”, ressalta.

Segundo o magistrado, os casos comprovados de Covid-19 como doença adquirida no exercício laboral podem gerar aposentadoria diferenciada, pensão à família ou multa. Depende de cada caso.

O advogado especializado em direito previdenciário André Bittencourt explica que é importante ter em mãos as provas de que a contaminação ocorreu em ambiente de trabalho.

“O ônus de provar aquilo que eu estou indicando que aconteceu é meu. Então o trabalhador vai ter de trazer as provas e os motivos pelos quais ele entende que pegou Covid-19 no trabalho. O empregador vai ter o ônus de comprovar que não, mostrando documentos que comprovem que entregou máscaras apropriadas, que dava luva, que tinha álcool em gel. O juiz vai ter que verificar para se encaixa como acidente de trabalhou ou não”, pondera.

O diretor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Sérgio Castro, destaca o aumento da mortalidade por Covid-19 entre trabalhadores dos serviços essenciais. “Nas atividades mais claramente essenciais, como comércio e transporte, houve um aumento proporcional de mortalidade. Morreram 300 motoristas de caminhão em 2019. Em 2020, passou para 600 mortes”, afirma. Profissionais de enfermagem foram os mais afetados pela Covid-19 durante o exercício da função.

“Abril Verde” – Abril foi adotado como mês de conscientização sobre a prevenção de acidentes de trabalho. Em 28 de abril, é lembrado o Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho, instituído por iniciativas de sindicatos canadenses e escolhido em razão de um acidente que matou 78 trabalhadores em uma mina no estado da Virgínia, nos Estados Unidos, em 1969.

No Brasil, em maio de 2005, foi sancionada a Lei 11.121, criando o Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho.

Durante o Abril Verde, o Ministério Público do Trabalho (MPT) vai realizar campanha de redução de risco de infecção por Covid-19 nos ambientes de trabalho.

O MPT pede que os empregadores tomem medidas de proteção, como testagem periódica de trabalhadores e o afastamento daqueles com ao menos um sintoma relacionado à doença e de empregados que tenham tido contato com o provável doente. Além disso, o MPT defende que os empregadores tenham visão ampla do ambiente de trabalho, principalmente onde funcionam aparelhos de ar condicionado. (ABr)

Obrigatoriedade de vacinação gera polêmica

Com o agravamento da pandemia da Covid-19 no País, os empregadores estão confusos quanto à determinação da vacinação dos colaboradores. Isso porque ainda existe uma parcela de brasileiros que não quer ser vacinada, seja por dúvida quanto à eficácia ou por convicção pessoal. A advogada Tamara Magalhães, especialista em direito do trabalho do escritório Bernardes & Advogados Associados, explica que a Constituição não permite que qualquer cidadão seja submetido à vacinação forçada.

Porém, o Estado pode declarar a obrigatoriedade da imunização contra a Covid-19 e impor limitação de direitos aos cidadãos que se recusarem ao procedimento. Isso pode gerar um conflito entre direitos individuais (como a inviolabilidade do corpo, convicções religiosas, etc.) e o interesse público (proteção à saúde coletiva), para aqueles que se recusam a ser vacinados. O que prevalece nesse caso é a prática que assegura o emprego dos meios necessários para a preservação da vida humana, no caso, a imunização coletiva.

Com relação ao empregador, Tamara Magalhães ressalta que a Constituição Federal dispõe que é dever da empresa reduzir os riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança e ressalta que um empregado não vacinado, que venha a se contaminar, poderá colocar em risco a saúde dos demais trabalhadores.

Assim, sendo a vacinação considerada de interesse coletivo e devendo o empregador proporcionar um ambiente de trabalho saudável e seguro aos seus empregados, na opinião da advogada há fundamento para que o empregador exija a comprovação de imunização dos seus colaboradores e terceirizados. O artigo. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dispõe que nenhum interesse de classe ou particular prevalece sobre o interesse público.

Tamara Magalhães pondera, no entanto, que não há consenso entre os especialistas sobre os poderes e limites do empregador no aspecto. Embora a advogada entenda que, havendo norma interna da empresa sobre a obrigatoriedade de vacinação, ao descumpri-la o empregado poderá ser dispensado, inclusive por justa causa (artigo 482, h da CLT), mas essa modalidade de dispensa pode ser revertida pela Justiça do Trabalho.

A especialista se alinha à corrente do Ministério Público do Trabalho (MPT), adotada no Guia Técnico Interno sobre Vacinação da Covid-19, segundo a qual “se houver recusa injustificada do empregado à vacinação, pode-se caracterizar ato faltoso, nos termos da legislação. Todavia, a empresa não deve utilizar, de imediato, a pena máxima ou qualquer outra penalidade, sem antes informar ao trabalhador sobre os benefícios da vacina e a importância da vacinação coletiva, além de propiciar-lhe atendimento médico, com esclarecimentos sobre a eficácia e segurança do imunizante”.

Projeto na Câmara – A discussão é ampla e parece estar longe de ser pacificada. Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 455/21, que visa que proibir o empregador de demitir os trabalhadores que não tomarem vacinas contra agentes biológicos a que estejam expostos. De acordo com a proposta a recusa à imunização não poderá, via de regra, ser considerada hipótese para rescisão do contrato por justa causa, salvo hipóteses específicas.

A advogada alerta que a vacinação não exime as pessoas de cumprirem outros procedimentos de segurança, como continuar usando máscara, seguir rotinas de sanitização, evitar aglomerações e manter o ambiente ventilado. “A vacinação não exime que as empresas cumpram os protocolos atuais de prevenção para garantir ambiente de trabalho seguro. Acima de tudo, o senso de bem-estar coletivo deve prevalecer para garantia segurança para a saúde de todos.

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