Legislação

Falta de verba para despesa do INSS mobiliza o governo

Ministro consulta o TCU sobre possibilidade de usar crédito extraordinário
Falta de verba para despesa do INSS mobiliza o governo
Crédito: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

Brasília – O bloqueio de recursos no Orçamento de 2022 deixou o governo Jair Bolsonaro (PL) com apenas R$ 2,4 bilhões para bancar gastos discricionários de todos os ministérios no último mês do ano. Há o temor real de falta de dinheiro até mesmo para despesas obrigatórias, como aposentadorias, o que levou o Executivo a traçar um plano de emergência.

O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, enviou ao Tribunal de Contas da União (TCU) uma consulta sobre a possibilidade de usar crédito extraordinário, fora do teto de gastos, para bancar uma parcela das despesas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A tese é que esses gastos cresceram muito após a aceleração das análises de requerimentos e redução da fila de espera, deixando o governo sem margem de manobra no Orçamento nos últimos meses do ano. O buraco nas despesas obrigatórias é estimado em R$ 22,3 bilhões, dos quais 70% correspondem à Previdência.

A consulta, revelada pelo jornal “Valor Econômico” e confirmada pela “Folha de S.Paulo”, foi formalizada pela Casa Civil com o respaldo do Ministério da Economia, que emitiu uma série de pareceres para fundamentar a questão.

Um dos ofícios é assinado pelo próprio ministro Paulo Guedes.

O cenário é considerado extremamente grave e dramático. Sem uma solução, a perspectiva é que se avolumem as notícias de órgãos suspendendo atividades, em um verdadeiro apagão da máquina pública federal.

O próprio governo está com dificuldades de segurar o bloqueio, que chegou a R$ 15,4 bilhões em 22 de novembro, após a constatação de que as despesas com o INSS subiram novamente.

Além disso, a pasta da Economia está sem margem de manobra para acomodar uma necessidade extra de outros R$ 15,4 bilhões para pagar benefícios do INSS. A solução seria cortar de vez as dotações das emendas de relator (hoje apenas bloqueadas), mas isso demandaria aval prévio do Congresso.

“Até o presente momento, não houve sinalização (positiva ou negativa) do Relator-Geral da LOA (Lei Orçamentária Anual) 2022 para que as despesas obrigatórias pudessem ser suplementadas com recursos oriundos das programações de RP 9 (emendas de relator). Esta situação vem preocupando as áreas técnicas dos Ministérios da Economia e do Trabalho e Previdência em virtude de não haver tempo hábil ainda neste exercício para suplementar despesas obrigatórias”, alerta ofício assinado por integrantes da Secretaria de Orçamento Federal.

O Executivo encaminhou um projeto de lei para autorizar o remanejamento sem esse aval prévio, mas há grande risco de a votação não ocorrer a tempo de ajustar as programações do Orçamento.

Insegurança – O clima é de insegurança. As liberações de recursos e o efetivo pagamento das despesas dependem de atos assinados por técnicos e gestores, que respondem com o próprio CPF caso seja constatada alguma irregularidade diante das normas fiscais. A violação do teto de gastos poderia ser enquadrada nessa categoria, assim como o não pagamento de uma despesa que, como diz o nome, é obrigatória.

Um crédito extraordinário que não preencha os requisitos constitucionais de imprevisibilidade e urgência também poderia ser julgado como irregularidade, daí a consulta ao TCU.

A Casa Civil alega que o exercício de 2022 apresenta “situação atípica” e questiona se o “crescimento imprevisível e extraordinário de despesa obrigatória, conjugada com a ausência de instrumentos legais adequados a demanda por credito adicional em função de restrições temporais” seria motivação suficiente para a abertura de crédito extraordinário.

O registro da assinatura eletrônica de Ciro Nogueira é de 0h27 do dia 1º de dezembro, e o protocolo no TCU foi feito à 1h02 – evidenciando a urgência com que a questão vem sendo conduzida pelo governo.

A situação é tão dramática que o governo vê risco de a despesa com a Previdência ficar ainda maior em meados do mês, quando o Ministério do Trabalho e Previdência processar a folha de dezembro. Qualquer esforço de “raspar o cofre” nos demais ministérios seria insuficiente para solucionar o problema.

Caso o tribunal dê o sinal verde para pagar aposentadorias com crédito extraordinário, a intenção do governo é fazer uma análise criteriosa do valor que será efetivamente necessário – o que tende a ficar abaixo dos R$ 22,3 bilhões. O cuidado leva em conta a avaliação de que abusar de eventual precedente aberto pelo TCU poderia ser um tiro no pé.

Por outro lado, mesmo que o tribunal dê sinal verde à consulta, há dúvidas se os técnicos que operacionalizam esses pagamentos aceitarão assinar o crédito extraordinário, uma vez que a jurisprudência do tribunal de contas está sujeita a mudanças até o efetivo julgamento das contas. O temor nos bastidores é ficar exposto a algum tipo de responsabilização.

Por isso, o Executivo busca também outras saídas. O governo chegou a consultar o Supremo Tribunal Federal (STF) na última terça-feira (29) sobre a possibilidade de usar crédito extraordinário para bancar o repasse de R$ 3,9 bilhões para o setor cultural, previsto na lei Paulo Gustavo, mas essa porta foi fechada pela Corte.

Outra saída é aprovar um projeto de lei que flexibiliza alguns dispositivos no Orçamento para descontar despesas do teto de gastos e reduzir o repasse da lei Paulo Gustavo ainda em 2022.

Prever um espaço extrateto para 2022 na PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, patrocinada pelo governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seria a opção “mais segura”. No entanto, interlocutores do Ministério da Economia não estão autorizados a se envolver nessas articulações, que têm sido conduzidas apenas por parlamentares. (Idiana Tomazelli)

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