Superendividamento: Lei segue sem previsão para vigorar no Estado

Há um mês em vigor, a lei que altera o Código do Consumidor e estabelece uma série de medidas para evitar o chamado “superendividamento” ainda está longe de ser realidade para a população mineira. A Lei 14.181/21 aumenta a proteção de quem tem muitas dívidas e não consegue pagá-las e cria alguns instrumentos para conter abusos na oferta de crédito.
No Estado, a nova medida ainda não tem previsão de quando entrará em vigor. O Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) informou que o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) emitiu uma circular informando as medidas que seriam adotadas nos estados. “No dia 22 de julho, recebemos a circular de que o Ministério Público e o Tribunal de Justiça e demais órgãos competentes estavam em análise para avaliar como será o atendimento”, explicou o coordenador em exercício do Procon da Assembleia, Renato Dantés.
Entre as novas regras, consumidores terão direito a uma espécie de recuperação judicial para renegociarem as dívidas com todos os credores ao mesmo tempo. A lei passa a proibir qualquer tipo de assédio ou pressão para seduzir os consumidores.
Segundo pesquisa mensal da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o número de famílias endividadas no Brasil chegou a 72,9% em agosto.
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A lei define o superendividamento como a “impossibilidade manifesta de o consumidor, pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo existencial. A nova lei é um avanço para o consumidor que vivia pressionado com os juros elevados de financeiras e credoras. Além disso, é uma possibilidade de que o consumidor tenha uma educação financeira para que não caia nas armadilhas do superendividamento”, avalia o especialista em Economia e Finanças Cleyton Izidoro.
Izidoro explica que a nova lei proporciona algumas vantagens como condições mais justas de negociação, recuperação judicial, suporte ao consumidor, fim do assédio e pressão aos clientes, entre outros. “Ações como forçar idosos a contratar crédito em financeiras, juros altos devido à inadimplência são questões que serão tratadas nessas negociações. Estamos falando de pessoas que por um motivo ou outro ficaram endividadas, principalmente devido à crise pandêmica”.
Quem contrata crédito, mas fica impossibilitado de honrar seus compromissos financeiros, seja por desemprego, doença ou qualquer outra razão que impacte o orçamento terá melhores condições de negociação. “Cada instituição financeira ou bancária faz como quer, acolhe o consumidor de qualquer jeito, faz acordos desfavoráveis pra quem está endividado. Isso vai mudar”, pontua o economista Cleyton Izidoro.
O presidente do Conselho Empresarial de Economia da Associação Comercial e Empresarial de Minas (ACMinas), Guilherme Leão, avalia que a nova lei possibilita a recuperação financeira e frear os excessos cometidos por financeiras e bancos. “As altas taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras eram abusivas, e acredito que com a nova Lei do Consumidor isso ajudará a diminuir os excessos”, avalia.
Além disso, Leão reforça que a lei ajudará os consumidores a ter a possibilidade de adquirirem uma educação financeira para evitar novas inadimplências. Por outro lado, a preocupação é a de que esses consumidores, após conseguirem a renegociação das dívidas, não consigam novos créditos e, por isso, tenham dificuldade de consumo, o que pode gerar uma queda no faturamento do comércio e serviço.
“Em curto e médio prazos, o consumidor vai sentir o impacto negativo dessa negociação. A capacidade de consumo da população ficará comprometida, pois as famílias terão o acesso ao crédito diminuído. Isso acaba comprometendo o faturamento do varejo, porque o dinheiro não gira. As famílias acabam por optar por reduzirem o consumo”, pontua.
Veto
A Lei 14.181/21 previa um benefício de que durante a negociação da dívida com os credores, o consumidor só poderia ter até 30% da renda comprometida para pagamentos das dívidas, porém essa parte foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Agora, o veto será apreciado pela Câmara dos Deputados, que pode ou não revogá-lo. Para o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil seção de Minas Gerais (OAB-MG), Bruno Burgarelli, essa é a medida mais importante que deve ser analisada pela Câmara dos Deputados.
“Este é um ponto fundamental, porque os consumidores não podem ficar sem renda alguma para pagar essas dívidas. Por algum motivo, eles não conseguiram pagar essas dívidas e estão de boa-fé pedindo um acordo e se comprometendo a pagar, por isso, é importante o limite”, salienta.
Burgarelli enfatiza que a nova lei estabelece parâmetros para um entendimento entre consumidor e credores e deverá aperfeiçoar os pagamentos. “É fundamental que garanta o pagamento, mas ao mesmo tempo que se garantam condições legais e reais para que se possa fazer esse pagamento. Dentro do possível, a lei abre essa possibilidade para todas as partes”, pontua.
Para o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-MG, a ideia é a de que o atendimento desses consumidores fique a cargo dos Procons estaduais, além do sistema de juizado especial.
Especialista dá dicas contra inadimplência
O total de brasileiros com dívidas ou contas em atraso em agosto é de 25,6%. O levantamento é da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). “O tempo de atraso no pagamento das dívidas também vem crescendo, reflexo das dificuldades enfrentadas pelas famílias na faixa de menor renda, em especial, para quitarem seus compromissos financeiros em dia”, destaca a economista da CNC responsável pela pesquisa, Izis Ferreira.
Izis Ferreira alerta que após a renegociação das dívidas, os consumidores devem ficar atentos para não caírem em novas armadilhas. “A inflação está em alta, o que está puxando o transporte e os alimentos. É importante ficar atento aos gastos da casa. Não comprometa mais do que 25% da sua renda. Colocar tudo na ponta do lápis ajuda muito”, orienta.
A economista esclarece ainda que pesquisar é fundamental para não sair do orçamento e evitar gastos desnecessários. Outra medida é não comprar por impulso e pensar se o produto é realmente necessário para a família naquele momento. “Programar para pagamentos à vista é melhor, porque você pode conseguir um desconto. Caso precise utilizar o cartão de crédito, utilize o mínimo possível e controle o que já gastou, para quando virar o mês você consiga pagar a fatura completa”, enfatiza.
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