Trabalho infantil aumenta no Brasil com a pandemia
Brasília – Neste domingo (12), é celebrado o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, num cenário marcado, nos últimos dois anos, por uma pandemia que agravou, ainda mais, a situação de pobreza de milhões de pessoas. Diversos fatores, como o fechamento das escolas, podem ter contribuído para levar crianças e adolescentes ao trabalho, como forma de aumentar a renda familiar, o que representa um retrocesso de anos no combate a essa prática.
A Justiça do Trabalho sempre esteve engajada na luta pela erradicação do trabalho infantil, um propósito prioritário de toda humanidade. De acordo com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Evandro Valadão, coordenador do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo a Aprendizagem da Justiça do Trabalho, é evidente a importância de uma ação que amplie a visibilidade do tema. “Informar e mobilizar o próprio sistema de justiça, a fim de atuar de modo adequado, coordenado e em regime de cooperação, é parte desse movimento, que vai muito além, para tentar ser a voz e o verbo do combate ao trabalho infantil, em conjunto com a sociedade”, afirma.
Com o objetivo de alertar e conscientizar a sociedade sobre os impactos negativos do trabalho infantil, a Justiça do Trabalho, com o apoio o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), promoveu na sexta-feira (10) o twittaço #BrasilSemTrabalhoInfantil, segunda edição da maior mobilização digital sobre o tema. Em 2019, o twittaço envolveu mais de 141,2 milhões de pessoas no Twitter com a hashtag #BrasilSemTrabalhoInfantil, colocando o assunto entre os mais comentados no País. Além disso, o TST projetou na fachada do seu edifício-sede mensagens sobre os riscos do trabalho ilegal de crianças e adolescentes.
Muito ainda há o que fazer. Crianças e adolescentes obrigadas a trabalhar têm seu desenvolvimento comprometido e são expostas à vulnerabilidade, em razão da violação de seus direitos. De acordo com o artigo 227 da Constituição da República, é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar-lhes, com absoluta prioridade, o direito à educação, ao lazer, à profissionalização e à dignidade, além de colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação e exploração.
Informações divulgadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), reunidas no relatório “Trabalho infantil: Estimativas globais de 2020, tendências e o caminho a seguir” (disponível somente em inglês), alertam que, entre 2016 e 2020, o número de crianças e adolescentes nessa situação chegou a 160 milhões em todo o mundo, representando um aumento de 8,4 milhões.
Ainda segundo a pesquisa, em razão dos impactos da Covid-19, avalia-se que, até o final de 2022, mais 8,9 milhões correm o risco de ingressarem nesse grupo. Um modelo de simulação mostra que o número pode aumentar para 46 milhões se não houver acesso a uma cobertura crítica de proteção social.
No Brasil, antes da pandemia, já havia mais de 1,7 milhão de crianças e adolescentes nessa situação. O relatório aponta que o progresso no combate à prática se estagnou, pela primeira vez em 20 anos, revertendo a tendência de queda anterior, com a diminuição de 94 milhões entre 2000 e 2016.
Para o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, as novas estimativas são um alerta. “Não podemos ficar parados enquanto uma nova geração de crianças é colocada em risco”, afirma. “A proteção social inclusiva permite que as famílias mantenham crianças e adolescentes na escola, mesmo em casos de dificuldades econômicas. Este é um momento de compromisso e energia renovados, para reverter essa situação e quebrar o ciclo da pobreza e do trabalho infantil”, alerta.
Fechamento de escolas
As crises econômicas e o fechamento das escolas podem ter intensificado a presença de crianças e adolescentes em situação de trabalho por mais horas ou em piores condições, em decorrência da perda de emprego e renda de pais, mães ou responsáveis. “Estamos perdendo terreno nessa luta”, avalia a diretora-executiva do Unicef, Henrietta Fore. “Precisamos priorizar os investimentos em programas que possam levá-los de volta à escola, além de programas de proteção social que ajudem as famílias a evitar essa escolha”, avalia.
O estudo “Pobreza Infantil Monetária no Brasil – Impactos da pandemia na renda de famílias com crianças e adolescentes”, do Unicef, traz dados de 2020 que comprovaram que esse grupo continua sendo o mais afetado pela pobreza monetária no Brasil. O auxílio emergencial concedido pelo governo federal contribuiu temporariamente para a redução desses índices, mas, segundo Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil, não se propôs a resolver o problema da pobreza em médio e em longo prazo. “Isso precisa ser feito por meio de políticas de proteção social duradouras e sustentáveis”, defende. (Com informações do TST)
Meta da OIT é erradicar prática até 2025
Brasília – A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em colaboração com a parceria global Aliança 8.7, lançou 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil. O propósito era promover ações legislativas e práticas em todo o mundo, mobilizando os governos a atingirem os objetivos previstos na Meta 8.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS) – a erradicação do trabalho forçado, da escravidão moderna e do tráfico de seres humanos e a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil, incluindo o recrutamento e o uso de crianças como soldadas. Estabelece, também, que, até 2025, o trabalho infantil, em todas as suas formas, seja completamente erradicado.
A Convenção 182 da OIT, que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e de ação imediata para sua eliminação, dispõe expressamente acerca de medidas para assegurar a reabilitação e a integração social do grupo afetado. Essa obrigação deve ser observada por todos os Estados-membros da OIT.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), em 2019 havia 1,768 milhão de pessoas entre cinco a 17 anos em situação de trabalho. O número representa 4,6% da população nessa faixa etária. Nesse universo, 706 mil estavam em ocupações consideradas as piores formas de trabalho infantil, e o percentual em trabalho infantil perigoso (27,6%), em jornadas de até 14 horas, supera o de pessoas que realizavam atividades econômicas (23,3%).
De acordo com a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), essas atividades envolvem a operação de tratores e máquinas agrícolas, o beneficiamento do fumo, do sisal e da cana-de-açúcar, o trabalho em pedreiras, a produção de carvão vegetal, a coleta, a seleção e o beneficiamento de lixo, o comércio ambulante e o trabalho doméstico, entre outras.
A pesquisa revela, ainda, que, em 2019, 51,8% da população de pessoas de cinco a 17 anos de idade realizavam tarefas domésticas ou cuidavam de pessoas. A maioria tem de 16 a 17 anos, e mais da metade (57,5%) é de mulheres.
Aprendizagem
A Constituição Federal (artigo 7º, inciso XXXIII) proíbe qualquer forma de trabalho a pessoas com menos de 16 anos, exceto na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. Oferecer oportunidades de trabalho protegido a adolescentes é fundamental para enfrentar o trabalho infantil e a evasão escolar. Nesse sentido, a Lei da Aprendizagem determina que toda empresa de médio ou grande porte tenha de 5% a 15% de aprendizes, permitindo que jovens entre 14 e 24 anos, que estejam cursando o ensino médio, tenham oportunidades de formação técnico-profissional.
Segundo dados de 2016 do Ministério Público do Trabalho (MPT), menos de 10% das empresas cumprem a determinação legal, deixando de gerar mais de três milhões de vagas.
A boa notícia é a mobilização, encabeçada pelo Unicef, em parceria com empresas privadas, organizações civis e governos que oferecem oportunidades de acesso, formação e capacitação profissional. O programa Um Milhão de Oportunidades, criado em 2020, já ofereceu mais de 105 mil vagas.
A Justiça do Trabalho é um observador privilegiado dos fenômenos sociais e está engajada na luta pela erradicação total do trabalho infantil no Brasil até 2025. Em 2012, por iniciativa do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), foi criada a Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho (Ceti).
Em 2016, a ação institucional teve o nome modificado e passou a ser chamada de Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. (Com informações do TST)
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