Exportação: Brasil busca construir marca longe dos exotismos

Um país tropical, servido de belas praias e sol o ano inteiro. Um povo alegre e que gosta de festa. Uma natureza exuberante, muitos títulos no futebol e o ritmo do samba como patrimônio. Essas são todas imagens do Brasil no exterior, porém, o País não se resume a esses símbolos. Mais do que “abençoado por Deus e bonito por natureza”, o Brasil quer que o mundo reconheça também a sua marca pela qualidade dos produtos e serviços oferecidos, a segurança jurídica que o faz cumprir todos os compromissos e uma criatividade capaz de dar ao mundo soluções e experiências autênticas e únicas.
Presente em mais de 100 países, a Havaianas, produzida pela Alpargatas, é uma das marcas brasileiras com maior reconhecimento internacional e usa com maestria a brasilidade como atributo.
A história da marca começa em 1962 e o projeto estruturado de exportação, no fim do século passado. Para o CEO da Alpargatas, Liel Miranda, aspectos da comunicação sobre o Brasil ainda precisam ser mais trabalhados para que a imagem do País ganhe força em lugares-chave.
“As empresas e indústrias podem ajudar a trabalhar essa imagem para que se torne uma vantagem competitiva. A nossa cadeia de produção, por exemplo, tende a ser mais sustentável do ponto de vista ambiental se comparada com outros países, contudo, não falamos o suficiente sobre isso. Acredito que a questão da comunicação da ‘marca Brasil’ seja crucial para abrir espaço tanto para empresas quanto para pessoas que desejam participar de conselhos internacionais”, avalia Miranda.
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De acordo com a conselheira da Telefônica, Holcim, Embraer e Gerdau, Claudia Sender, deixar de lado o “complexo de vira-lata” é fundamental que o Brasil se posicione como um player competitivo na disputa global por mercados.
Esse posicionamento passa, também, pelo reconhecimento dos profissionais de gestão brasileiros. Acostumados a um país em que o ambiente de negócios é, por vezes, volátil, os executivos brasileiros são vistos como ágeis e talentosos em boa parte do mundo.
“Precisamos enxergar o Brasil como uma grande força que tem uma oportunidade de desenvolvimento de vantagem competitiva e um pool profundo de talentos. O Brasil é, efetivamente, um país que tem capacidade de gerar talento e de gerar capacidade de gestão muito diferenciada. Somos muito conhecidos fora do País por sermos mais fluidos, ágeis, resilientes, capazes de absorver o choque e rapidamente pensar o que fazer no próximo momento. O Brasil é um mercado muito grande e importante e devemos entender como podemos transformar, além das nossas fronteiras, a nossa imagem para ser referência em vários âmbitos”, destaca Claudia Sender.
Fugir dos estereótipos que marcam a imagem do Brasil não significa apagar a brasilidade. Ao contrário, fortalecer a marca Brasil passa pela afirmação do que nos faz originais e capazes de oferecer ao mundo soluções e um modo de viver e interpretar o mundo.
“No exterior, a Havaianas é lembrada pela liberdade que o produto representa, porque é relacionada a momentos de alegria e conforto. Ela se conecta de forma aspiracional com a brasilidade e é motivo de orgulho para os brasileiros que veem a ‘ginga’ do nosso povo bem representada no exterior. Criamos um ecossistema com distribuidores, agências e times locais que entendem os consumidores e o mercado. Atuamos muito próximo aos mercados, mas sempre focados em nunca perder a essência da marca. Nossa missão é inspirar o mundo com uma pegada mais leve! Quando nos comprometemos assim, estamos falando de ser uma empresa de atuação forte globalmente, sempre olhando para os nossos consumidores e clientes que nos inspiram a sermos cada vez melhores e mais relevantes em suas necessidades”, afirma o CEO da Alpargatas.
Mais do que brasilidade, mineiridade também ganha espaço no exterior
Junto com a “marca Brasil”, os valores da mineiridade também se transformam em atributos na hora de vender produtos nacionais em terras estrangeiras. Trabalhando com um dos maiores ícones da cultura mineira – o pão de queijo -, a Forno de Minas desenvolve um planejamento minucioso para a abertura de novos mercados. Presente em países da Europa, Ásia e América Latina, a marca está também nos Estados Unidos e Canadá.
De acordo com o CEO da Forno de Minas, Rodrigo Abreu, o próximo passo é fortalecer a marca junto ao público nativo dos Estados Unidos.

“Já temos um trabalho consolidado nos EUA e agora estamos focando no público americano. A maioria das marcas começa pelo público brasileiro e, quando muito, pelo latino. Na Europa e nos EUA o preço é uma das alavancas, mas não a principal. Eles buscam aqui uma qualidade que eles não conseguem lá. A qualidade é uma premissa. O diferencial está nos atributos. As redes norte-americanas nos procuram porque entendem que produzimos o nosso próprio queijo, que é um produto glúten-free, sem sal adicionado. Ao mesmo tempo, fizemos adaptações no sabor, na embalagem. O primeiro ponto é entender as necessidades do consumidor desses países, preservando a originalidade que os atraiu”, aponta Abreu.
Nessa mesma trilha caminha a Negra Rosa, indústria de cosméticos mineira especializada em produtos para pele negra. Segundo a fundadora e curadora da Negra Rosa, Rosângela José da Silva, a entrada da marca para o grupo Farmax deve acelerar o processo de internacionalização dos produtos.

“Sempre recebemos muitas mensagens de países que falam português e de brasileiros que estavam fora. Já fizemos alguns testes em Cabo Verde e Angola. Em 2025, estaremos na maior feira de cosméticos na Itália, para que as pessoas nos conheçam. Tudo isso, claro, tem um custo. E fazemos da nossa forma, sem erotização, com mulheres reais e diversas. Não precisa erotizar um produto de cabelo para vender. As marcas têm o papel de mostrar o Brasil e os seus produtos de qualidade. A gente vê movimentos de norte-americanas comprando produtos brasileiros e também o mercado da saudade. A diversidade brasileira é um ponto a favor. A gente tem que entender o nosso mercado. Atendendo bem aqui, atendemos bem os demais”, avalia Rosângela José da Silva.
Com 1,5 mil funcionários em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), e planos para triplicar a produção nos próximos cinco anos, a Forno de Minas está apresentando ao mercado norte-americano o waffle de pão de queijo.
“Não iríamos levar esse produto para lá porque os EUA é a terra do waffle. Mas quando viram que era um produto feito de polvilho, sem glúten, ao contrário do produto local, feito de farinha de trigo, o interesse surgiu rapidamente. É nesse tipo de informação que o Brasil, enquanto marca, precisa investir. Nós estamos apresentando uma solução que eles não conseguem desenvolver por lá. E resolvemos não traduzir o nome. É ‘pão de queijo’ e não ‘cheese bread’, ou algo do tipo. Ninguém traduz ‘sushi’ e nós queremos valorizar a originalidade mineira como um atributo importante”, pontua o CEO da Forno de Minas.
Para a gerente do Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Rebecca Macedo, conhecer a cultura corporativa do País com o qual se quer negociar é fundamental para que as marcas consigam usar a brasilidade como um atributo na hora de apresentar produtos e serviços.
“Temos um conjunto de soluções para conectar a indústria mineira a países estratégicos, trabalhando a imagem de Minas e do Brasil. Temos um trabalho muito forte com o governo do Estado para otimizar projetos que visam à atração de investimentos e uma agenda comercial. É um trabalho de formiguinha, com várias iniciativas explorando todos os setores. Fazemos uma imersão naquele mercado que vai ser visitado. Tem coisas práticas como na China, por exemplo, onde os pagamentos são feitos por meio de um aplicativo que precisa ser baixado. É preciso observar o tempo em que as coisas são feitas em cada país para que eles se sintam seguros”, ensina Rebecca Macedo.
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