Páscoa para todos: chocolates veganos são alternativa para dietas restritivas em BH

No Brasil, 7% da população se declara vegana total ou parcialmente, a maioria, por causa da saúde, segundo pesquisa realizada no final do ano passado pelo Instituto Datafolha. A Sociedade Vegetariana Brasileira, que encomendou o estudo, ainda estima que 14% dos brasileiros sejam vegetarianos. Além disso, a Associação Nacional em Atenção ao Diabetes aponta que 40% da população do País possui hipolactasia (intolerância à lactose).
Seja por uma condição de saúde, pelo bem-estar físico ou, ainda, por uma preocupação ambiental, o número de estabelecimentos e produtos sem ingredientes de origem animal tem aumentado em Minas Gerais e no País. E o interesse dos consumidores também.
Um dos negócios mais longevos em Belo Horizonte neste sentido, é o Chocolate Lab, uma confeitaria vegana de alto padrão que começou em 2015 pelas mãos de Débora Vieira, a partir da maternidade.
“Comecei na minha casa mesmo. Eu tinha ganhado uma filha, fiquei desempregada e, depois, tive dificuldades em conseguir um emprego que me permitisse cuidar dela. E também em me encaixar em uma jornada convencional, de oito horas diárias, sendo mãe”, lembra.
Por isso, Débora Vieira começou a empreender com algo que considerava mais simples e que tinha baixo investimento inicial: os doces. No começo, ela fazia quitutes tradicionais, mas criou também uma linha de produtos saudáveis e veganos. Para sua surpresa, foram os que tiveram mais saída.
“Eu tinha colocado os doces tradicionais no começo porque fiquei com medo de só os saudáveis não sustentarem o negócio. Mas percebi que havia uma certa lacuna no mercado, porque os empreendimentos de doceria vegana eram muito inconstantes. Resolvi focar nisso e deu certo porque eu não tinha concorrência e havia muita demanda”, relata.
Seis meses depois da marca criada, a própria empreendedora mudou seus hábitos alimentares. “Decidi também virar completamente vegana, porque me identificava mais com esse universo: eu já era vegetariana e já sabia fazer substituições”, completa.

Antes, Débora Vieira trabalhava como atriz e também com comunicação, funções que conciliava com a empresa. Mas a partir de 2019, com o crescimento do negócio, ela percebeu que não precisava mais tocar outros projetos.
“Eu conciliava os trabalhos porque a renda ainda era inconstante. Mas depois, principalmente na pandemia, a demanda aumentou bastante, porque eu atendo alérgicos. Em BH, há pouquíssimos lugares que comportam este público, então, as pessoas ficavam sem opções. Além disso, naquele período, a demanda por uma comida gostosa e de conforto, um doce, um mimo, também fez com que minhas vendas disparassem”, explica.
Com o aumento progressivo da demanda, a marca transbordou do delivery e foi também para a loja física, espaço que já existe há cerca de três anos no bairro Floresta, região Leste de BH. Hoje, além dos doces veganos, o Chocolate Lab também foca nos produtos sem glúten e zero açúcar.
Para a Páscoa deste ano, o movimento parece ter arrefecido um pouco devido ao aumento dos produtos impactados pela alta do cacau.
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“Apesar de ser o ‘Natal das confeiteiras’, na Páscoa deste ano eu não tenho expectativa de aumentar o faturamento. O chocolate aumentou 40%, e os meus produtos também aumentaram. Tenho percebido um poder de compra menor do consumidor, as pessoas têm gastado menos na minha loja. Se eu faturar o mesmo valor do que o ano passado, já está bom”, pondera.
Mesmo assim, as encomendas já tem aumentado nas últimas semanas. Curiosamente os itens mais vendidos atualmente na loja são os extremos de preços: o ovo de Páscoa mais caro, que tem sabor pistache com frutas vermelhas pelo valor de R$ 167 (400g) e também as lembrancinhas mais baratas, como o kit de pão de mel com brigadeiro e os ovos menores, na faixa de R$ 40 a R$ 50.

Fora da temporada comemorativa, o Chocolate Lab faz sucesso com as sobremesas e entremet, doce de inspiração francesa com acabamento refinado. Para o futuro, Débora Vieira planeja estudar um modelo de franquia para o seu negócio.
“Percebo que tem aumentado a procura por esse tipo de produto. Talvez, pelo aumento de diagnósticos de intolerância à lactose. Antes, as pessoas sentiam um desconforto mas não sabiam a razão. Agora, com diagnósticos mais eficientes, essa condição está mais fácil de ser detectada. Este ano, vou observar mais o comportamento do mercado porque tenho muita vontade de abrir uma segunda unidade em BH e, quem sabe, ir para outros estados. O tipo de doce que fazemos aqui ninguém faz no Brasil. O cliente entra na loja e tem à disposição uma vitrine de confeitaria cheia de opções de doces, todos sem lactose”, conclui.
Ovos sem casca de chocolate para driblar a alta do cacau na Páscoa
Outro estabelecimento alimentício especializado em produtos veganos, a Casa Umbigo, uma cafeteria localizada no bairro Santa Tereza, também tem expectativas mais modestas para esta Páscoa.
“As encomendas estão mais baixas que no ano passado. Nesta Páscoa, estamos enfrentando um desafio um pouco maior que é a escassez do cacau e a alta dos chocolates. Isso afetou bastante a expectativa e o estímulo com as vendas”, diz um dos sócios da casa, Diego Viana, chef especializado em receitas veganas salgadas.

Para oferecer opções especiais para a data sem precisar repassar os altos custos ao consumidor, foram elaborados ovos de Páscoa sem a casca de chocolate.
“São ovos recheados, mas eles têm a casca de brownie ou de cookie. Então conseguimos uma versatilidade maior para trabalhar os produtos e têm sido os itens mais procurados para a Páscoa. Mas somos uma cafeteria, de modo que este não é o nosso carro-chefe. É o brunch. Vamos fazer, por exemplo, um brunch especial de Páscoa”, comenta.

Junto à sócia Karim Amaral, chef especializada em confeitaria, Viana abriu a cafeteria há cerca de dois anos, no entanto, sem “levantar a bandeira” do veganismo.
“Tanto eu como minha sócia já tínhamos negócios na área de produtos veganos. Abrimos a Casa Umbigo com o intuito de unir forças e mostrar que comida boa é comida boa. Por isso evitamos levantar a bandeira, embora o nosso negócio seja neste ramo e ambos sejamos veganos. É que a gente sente que isso afasta um pouco as pessoas e traz um certo preconceito que muitos ainda têm. Recebemos muitas pessoas que não são veganas aqui e a ideia é justamente mostrar que dá pra fazer comida gostosa sem ingredientes de origem animal e que eles não fazem falta se há cuidado e carinho na cozinha” explica.
Ao mesmo tempo, ele percebe que justamente a demanda por produtos artesanais e vegetais tem crescido.
“Esse mercado está aquecido. A maior parte do nosso público é aquele com restrições alimentares, veganos, vegetarianos, intolerantes à lactose, e quem busca presentear essas pessoas, mas também quem quer reduzir o consumo de derivados animais. Quase tudo o que servimos é feito aqui. Faz parte do nosso objetivo levantar a importância de uma alimentação saudável e nutritiva, porque é algo muito afetivo também. Às vezes tem alguém que vem aqui e experimenta uma comida [na versão vegana] que não comia há muito tempo, e isso desperta aquela memória afetiva”, diz.

O foco, agora, é fortalecer os negócios da cafeteria, como uma das especialidades da casa, que é a massa folhada (sem lactose), além do buffet próprio e os eventos como casamentos, aniversários e pequenos jantares, que podem ser realizados no local de escolha do cliente, ou no próprio espaço.
Boas expectativas e mercado aquecido em BH
Por outro lado, há negócios focados no veganismo que esperam, sim, um aumento de vendas nesta Páscoa. É o caso da Uai Vegano, que surgiu no final de 2016 com o objetivo de expandir as opções destes produtos em aniversários, coffee breaks e eventos em geral.
“Mesmo com a crise mundial do cacau e a alta no preço dos chocolates, projetamos um aumento de 20% nas vendas de Páscoa e, felizmente, já alcançamos esse número”, diz o dono do negócio, Caio Diogo.

Ele também observa que, neste ano, os consumidores estão comprando mais lembrancinhas e itens menores, como o trio de ovos de colher disponibilizado por ele. O negócio ainda não conta com uma loja física, mas este é um plano para o futuro. “De todo modo, estamos abrindo nosso espaço físico para que os clientes e entregadores tenham um ambiente aconchegante para fazer a retirada dos produtos”, pontua.
A Uai Vegano é um serviço de buffet no qual o cliente pode encomendar salgados, mini pizzas, bolos e doces para eventos. “Também fazemos kit festas com esses itens e é o que mais sai. Mas, sem dúvida, o nosso carro-chefe é a coxinha de jaca”, complementa.

Caio Diogo também percebe o crescimento da demanda para negócios e produtos veganos. “Cada dia mais as pessoas despertam para a relevância da alimentação vegana, seja pelos animais, pelo meio ambiente ou pela própria saúde. A demanda do nosso negócio aumentou consideravelmente nos últimos anos, inclusive entre pessoas não-veganas ou que estão no caminho para a transição”, conclui.
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