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Do afeto ao testamento: o que pode mudar nas regras de sucessão do cônjuge sobrevivente

Projeto de Lei nº 4/2025 está em debate no Senado Federal e ainda não há expectativa de votação em curto prazo
Do afeto ao testamento: o que pode mudar nas regras de sucessão do cônjuge sobrevivente
Foto: Reprodução Adobe Stock

Está em debate no Senado Federal o Projeto de Lei nº 4/2025, que propõe uma ampla e profunda reforma do Código Civil Brasileiro. O texto, apresentado pelo presidente do Senado com base em anteprojeto elaborado por comissão de juristas presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão (STJ), pretende atualizar diversos dispositivos da legislação civil, com impacto direto nas áreas de família, contratos, sucessões e direito empresarial. Entre as mudanças mais sensíveis, está a alteração das regras de sucessão do cônjuge sobrevivente.

Atualmente, o Código Civil de 2002 estabelece que o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário, ao lado de descendentes (filhos, netos) e ascendentes (pais, avós), tendo direito à parcela da herança denominada “legítima”, correspondente a 50% do patrimônio deixado, ainda que não haja testamento. Além disso, o cônjuge também participa da meação, divisão dos bens comuns do casal, conforme o regime de bens adotado no casamento.

Com a proposta de reforma, o cônjuge deixaria de ser herdeiro necessário, passando a herdar somente na ausência de descendentes ou ascendentes. O novo texto do artigo 1.845 prevê expressamente que “são herdeiros necessários os descendentes e os ascendentes”. Nesse cenário, o cônjuge sobrevivente manteria apenas a meação dos bens adquiridos durante o casamento, conforme o regime patrimonial, sem qualquer participação automática na herança.

Essa mudança desloca o eixo de proteção do cônjuge da esfera da lei para a autonomia de vontade do titular do patrimônio. Ou seja, será necessário instrumento expresso, como um testamento, para garantir ao cônjuge eventual participação na herança disponível (até 50%).

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O impacto é relevante, sobretudo para casais sob regimes como comunhão parcial ou separação de bens, e em situações em que um dos cônjuges não possui patrimônio próprio, tendo se dedicado à família ou à vida doméstica. A proposta se estende também às uniões estáveis, que seguem as mesmas regras sucessórias dos casamentos. Justifica-se pela promoção da liberdade patrimonial e pela tentativa de reduzir litígios familiares, especialmente entre cônjuges e filhos de diferentes núcleos familiares.

Inspirada em sistemas jurídicos estrangeiros, a proposta reforça a importância de instrumentos como testamentos, pactos antenupciais e planejamento patrimonial. Nesse novo contexto, o planejamento sucessório passa a ser medida indispensável para proteção do cônjuge sobrevivente e organização dos bens familiares. A participação do cônjuge na herança dependerá de manifestação expressa do titular, tornando essencial que cada pessoa avalie, de forma responsável, a melhor forma de proteger seus entes mais próximos e estruturar a sucessão.

Entre as medidas recomendadas, destaca-se a elaboração de testamento, que permite ao titular destinar até 50% de seu patrimônio ao cônjuge. Também são indicados instrumentos como doações em vida, holdings familiares e acordos patrimoniais prévios, que ajudam a evitar conflitos. Casais devem ainda reavaliar o regime de bens e, se necessário, formalizar pactos antenupciais ou contratos de união estável com cláusulas protetivas.

Importante destacar que a proposta ainda se encontra em estágio inicial de tramitação no Congresso Nacional. Apesar da relevância do tema, não há expectativa de votação em curto prazo, especialmente diante da complexidade da matéria e da necessidade de debates mais amplos com a sociedade civil e entidades técnicas.

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