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Afonso Arinos de Melo Franco: uma das mais completas personalidades da cultura brasileira do século XX

De inteligência arguta e sólida erudição, não se limitou ao universo intelectual

Nascido em Belo Horizonte, em 1905, Afonso Arinos de Melo Franco foi uma das mais completas personalidades da cultura brasileira do século XX. De inteligência arguta e sólida erudição, não se limitou ao universo intelectual, havendo também lutado, na arena política, pelas ideias em que acreditava. Estudioso do Direito Constitucional, escreveu e lecionou sobre o tema. Nos anos de 87 e 88, presidiu a Comissão de Sistematização da Assembleia Nacional Constituinte, que entregou ao povo a Carta Magna da redemocratização. Era, naquele momento, o decano do Congresso, onde atuou até o seu falecimento, em 1990.

Como parlamentar, elevou a qualidade da Câmara dos Deputados, e, depois, do Senado Federal, não só pela excelência de seus discursos, como também pelo vigor de seu trabalho como legislador. Foi dele a primeira lei antirracista do país, de 1951, que acabou levando o seu nome. No campo da diplomacia, foi ministro de Estado das Relações Exteriores por duas vezes: no governo Jânio Quadros (quando ajudou a conceber a chamada ‘política externa independente’) e no gabinete parlamentarista de Brochado da Rocha. Chefe da delegação brasileira em duas Assembleias Gerais das Nações Unidas, foi quem liderou a posição brasileira em favor da descolonização de Angola.

Notável memorialista, legou valiosos relatos sobre sua trajetória, retratos, também, da época que lhe coube viver. Destaco “A alma do tempo”, “A escalada”, “Planalto”, “Alto mar Maralto” e “Diário de bolso”. A leitura de tais volumes (reunidos, mais tarde, pela excelente “Topbooks’, em luxuosa edição de 2018) é deliciosa. A linguagem de Afonso Arinos, elegante e fluida, reflete a sua visão de mundo, como afirmou em carta ao filho, datada de 1959: “A verdade é que tudo que sinto de mais espontâneo e natural no meu espírito tende a considerar intelectualmente, e mesmo literariamente, a vida”.

Membro da Academia Mineira de Letras, foi quem sucedeu JK na cadeira de número 34, hoje ocupada com brilho pelo cientista Paulo Beirão. Mesmo havendo sido contundente adversário de Juscelino, em seu discurso de posse soube reconhecer, sem problemas, a grandeza do fundador de Brasília. Foi também Arinos que recebeu outro antigo pessedista na Casa de Alphonsus de Guimaraens, em 1983: Tancredo Neves. Naqueles tempos, os homens públicos podiam divergir – até de forma incisiva e veemente – mas a convivência continuava civilizada.

O insulto e a ofensa ainda não haviam ganhado o palco de que desfrutam hoje.

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