Conheça o Clube do Livro, de Kika Gontijo
Fundado há vinte e três anos pela dinâmica e entusiasmada Kika Gontijo, o seu Clube do Livro conta hoje com trinta e quatro integrantes. As reuniões são mensais e sempre em torno de uma boa mesa e de ótimas conversas – agradáveis e inteligentes. A leitura feita por cada um é partilhada em clima cordial e ameno. As opiniões sobre a obra escolhida são ouvidas com respeito e ajudam a construir uma reflexão coletiva, que não precisa conter conclusões rígidas nem ideias fixas. Os integrantes do grupo são unânimes em dizer o quanto a literatura ampliou seus horizontes e consciências, além de oferecer informação e entretenimento de alta qualidade.
No começo de maio, o Clube resolveu fazer o seu encontro num cenário para lá de especial: o Grande Hotel de Araxá, hoje exemplarmente gerido (a diretora de relações institucionais é a excelente Fernanda Zatar Bicalho). Por conta da generosa e gentil sugestão da senhora Heloísa Azeredo, fui convidado a participar do evento, dando uma palestra sobre Literatura brasileira, particularmente a produzida entre 1938 e 1944, durante os anos de construção do hotel, fruto do arrojo de Getúlio Vargas e de Benedito Valadares.
Priorizando a poesia, li “Jandira”, de Murilo Mendes, publicada em “Os visionários”, de 1941; “José”, de Carlos Drummond de Andrade, surgida em “José”, de 1942; “Encomenda”, de Cecília Meireles, incluída em “Vaga Música”, também de 42, e a inevitável “Balada para as três mulheres do sabonete Araxá”, de Manuel Bandeira, que, apesar de escrita em 1931, só apareceu em papel cinco anos depois, em “Estrela da Manhã”. Leal à cidade de Dona Beja e também do acadêmico Olavo Drummond, ainda fiz questão de homenagear dois potentes poetas da terra, ambos filhos do antigo prefeito Fausto Alvim: Maria Lúcia e Chico Alvim. Dela, li “Aquavia”, do “Romanceiro de Dona Beja”, de 1979, e “(Sem título)”, de “Batendo pasto”, de 2020, que reproduzo agora: “Manhã sem rusga/pequeno depósito de agrura na poça/exorbitei de alegria/a abóbada celeste não dá vazão/silos de silêncio/ ó ser astral/o capim é minha grande reserva interior/a esperança/desleixo”.
De seu irmão, um dos expoentes da chamada poesia marginal dos anos setenta, li, entre outros, “Um homem”, do livro “O sol dos cegos”, de 1968: “De regresso ao mundo e a meu corpo/as estradas já não anoitecem à sombra de meus gestos/nem meu rastro lhes imprime qualquer destino/Sou a água em cuja pele os astros se detêm/A pedra que conforma o bojo das montanhas/O vôo dos ares”.
Quando abordei a prosa de ficção, referi-me aos talentos que emergiram àquela época, como José Américo de Almeida, Rachel de Queiroz, Jorge Amado, José Lins do Rego e Graciliano Ramos, criadores do ficou conhecido como o ‘Romance de 30’. Era o momento de revelar aos brasileiros outros aspectos da realidade de seu país, sobretudo os mais esquecidos ou afastados do Rio de Janeiro ou de São Paulo, os centros dominantes.
Terminei a minha fala feliz e com os olhos brilhando, na certeza de que não há nada melhor que fazer o que se ama. Essa paixão acaba transparecendo em cada frase, em cada gesto, em cada minuto. E a gente vê o quanto é bom vencer a chamada “prova dos nove”, a prova da alegria.
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