Das montanhas e vales de eletrônica

Stefan Salej*
Há 60 anos foi criada, por decreto do presidente JK e por iniciativa de Dona Sinhá Moreira, filha de um dos fundadores do Banco Nacional, a primeira escola técnica de eletrônica da América Latina. O projeto, justiça seja feita, teve apoio do então deputado federal do partido opositor a JK, Bilac Pinto, e a gestão foi entregue aos padres jesuítas. Daquela união de políticos e capital inicial da Dona Sinhá, que foi, vamos dizer assim, a mãe do projeto, nasceu um conglomerado de alta tecnologia nas áreas de telecomunicações e eletrônica, que hoje congrega mais de 200 empresas, com faturamento anual de 5 bilhões de reais, com uma escola de engenharia das melhores do Brasil (Inatel) iniciando cursos de doutorado, faculdade de administração, escola do Senai e principalmente uma sociedade de pleno emprego e feliz.
Lugar: Vale da Eletrônica. Santa Rita de Sapucaí.
A cidade cercada por cafezais, por sinal café de ótima qualidade, outros produtos do agronegócio e montanhas foi aumentando o seu potencial tecnológico, com prefeitos como Paulinho dentista e Jeferson, além do atual, professor Wander, que foi diretor da Inatel, numa aliança incomum de capital rural, ousadia tecnológica e política de cooperação, sem concorrência. As empresas cresceram pelo mundo afora, aos locais juntaram-se empreendedores de outros estados e do exterior. Um dos primeiros clusters de Minas Gerais dentro do programa Cresce Minas da Fiemg, foi também, na sua perfeita síntese de participação de todos os atores econômicos, políticos, sociais, acadêmicos, o mais bem-sucedido.
Os desafios, em um mundo onde a inovação cresce mais rápido, no compasso da história, são muito grandes. Os empresários estão se preparando tanto na adequação dos modelos de negócio, como na abertura de novos mercados. E na adaptação de tecnologias mais avançadas, desde 4.0 a todo o espectro de digitalização. Mas, aí é que está parte do problema: para poder concorrer falta um centro de pesquisa de nível mundial nas áreas que abrangem as indústrias do Vale da Eletrônica. Pesquisa hoje não só é cada vez mais colaborativa, ligada ao desenvolvimento tecnológico, e precisa de pesquisadores qualificados com equipamentos e meios.
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Minas errou feio jogando dinheiro fora em projetos em áreas onde jamais será competitivo, concentrando-se em Belo Horizonte, inclusive reformando mais prédios e distribuindo dinheiro para startups sem futuro, para angariar eleitores jovens para deputados que não se elegeram. E mais: ao invés de se focalizar no que já dá resultado e pode alcançar mais, uniram-se as forças da então direção da Fiemg e do governo para juntos financiarem um projeto de laboratório elétrico bilionário, que pode ter seus méritos em outros tempos, a 40 km do Vale de Eletrônica, em Itajubá. Se 10 % daquele valor fossem investidos em Santa Rita de Sapucaí, em um laboratório de pesquisa em eletrônica, os efeitos seriam extraordinários.
Em Minas de hoje tem coisas que há 60 anos não existiam: interesses privados se sobrepõem aos interesses públicos. Quem sabe o espírito de Sinhá Moreira se espalhe pelo Estado, atrás das montanhas, em todos os vales mineiros.
- Ex-presidente do Sebrae Minas e da Fiemg – Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
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