[EDITORIAL] A política se repete
A eleição para a presidência do Senado Federal, que deveria ter ocorrido na última sexta-feira, mas, por conta de uma sucessão de vexames, acabou adiada para o dia seguinte, foi palco para exibição do que de pior existe na política brasileira. Algo que não pode ser exibido, não deve chegar ao conhecimento dos eleitores de cada um dos senadores ali presentes, tanto que a primeira discussão, e como sempre ocorre em momentos delicados, deveria ser secreta ou aberta. Matéria do mais alto interesse do candidato que já se dava por eleito, Renan Calheiros, sabedor de que votação aberta, de conhecimento público, poderia custar-lhe as pretensões de um quinto mandato.
Não faltaram manobras ao pior estilo da velha política, aquela que teria sido sepultada nas eleições de outubro do ano passado, e a sessão de sexta-feira acabou anulada pelo Supremo Tribunal Federal. Assim o espetáculo prosseguiu no dia seguinte, ainda numa sucessão de transgressões que culminaram com votos recolhidos em cédulas de papel. Feita a contagem, havia um voto sobrando. Como e porque ainda está por ser explicado, embora a votação tenha sido anulada. Antes que se completasse uma segunda votação, Renan Calheiros, que parece ter custado a entender que não tinha chances, abandonou a disputa, abrindo espaço para a vitória de Davi Alcolumbre, integrante da leva de 46 senadores eleitos pela primeira vez, e preferido do Planalto, que prometera ficar distante da disputa mas parece ter jogado todas as cartas a favor do vitorioso.
À primeira vista a derrota de Renan Calheiros, figura sobre a qual se pode dizer, com generosidade, que é no mínimo controvertida, tanto que sabia muitíssimo bem que suas chances dependiam da votação secreta, deve ser saudada como indicativa de uma mudança positiva, da renovação que para a política brasileira tornou-se impositiva. Com praticamente metade das cadeiras do Senado ocupada por novatos, o candidato derrotado aparentemente não soube mesmo avaliar a força dessa renovação. Agora cabe esperar que ela produza resultados. Sobretudo, que surjam, finalmente, espaço para discussão e deliberação dos grandes temas de interesse nacional, com decisões que obedeçam exclusivamente à mesma ótica.
Afinal de contas, nos acontecimentos aqui relatados e que só podem causar perplexidade e indignação aos cidadãos de bem, também chamou atenção, causando repulsa, que no tabuleiro da votação repetia-se um jogo de interesses, de mera repartição do poder e suas benesses, em movimentos bem ensaiados pela conveniência e conforme os mais letais ingredientes da velha política. Resta esperar, com apreensão, o que virá depois.
O conteúdo continua após o "Você pode gostar".
Ouça a rádio de Minas