Opinião

EDITORIAL| Uma história que não termina bem

As empresas Boeing e Embraer anunciaram, no início do mês passado, que, depois de longas negociações, haviam chegado a um acordo inicial que tem como principal objetivo a criação de uma terceira empresa, voltada para a produção de jatos comerciais de médio porte, mercado em que a brasileira é líder. Nesse novo negócio a participação norte-americana será de 80%, pelo que a Boeing pagará U$ 3,8 bilhões à Embraer. Consta que no País foram poucos os que se entusiasmaram com o negócio, conscientes de que o maior sucesso da indústria local está condenado a ser apagado, com informações, inclusive, de que altos escalões de Brasília já estariam cogitando e trabalhando para anular a cláusula que confere ao governo brasileiro poder de veto nos negócios da empresa. Também na área militar, que não teria abonado os termos negociados, o clima é de insatisfação, aumentada depois que, na semana passada, a própria Boeing se recusou a firmar qualquer compromisso de manter produção e empregos no Brasil. Na realidade, e numa situação que não deixa de ser curiosa, os norte-americanos teriam grande interesse também nos engenheiros brasileiros, altamente qualificados, e que poderiam representar uma forma mais rápida e barata de repor engenheiros norte-americanos, envelhecidos e não repostos na escala demandada. O negócio está encaminhado, as resistências da Aeronáutica, berço da Embraer, foram contornadas ou ignoradas, mas o fato é que o martelo ainda não foi batido. Houvesse compromisso, houvesse decoro, e negócio tão sensível e importante não seria decidido agora, no apagar das luzes de um governo que, ao contrário, parece ter pressa. No mínimo seria de se esperar que o assunto e todas as suas implicações fossem melhor discutidos. Para esclarecer, por exemplo, o que significa exatamente um recente anúncio da Embraer, feito na feira de Farnburough, Inglaterra, sobre a venda de três centenas de aeronaves para entrega nos próximos anos e no valor de US$ 15 bilhões. Como explicar, diante dessas únicas operações, que se cogite vender 80% de Embraer por U$ 3,8 bilhões? No mínimo soa bastante esquisito, da mesma forma que é de se estranhar – muito – que o recém-lançado jato de transporte militar KC-390 possa afinal, e contra tudo que foi dito antes, acabar sendo incluído no pacote. Nada disso cheira bem, principalmente para quem sabe como e com que métodos a Boeing se transformou em algo muito próximo de um monopólio nos Estados Unidos. Para quem conhece essa história, para quem se lembra das empresas, concorrentes, que aos poucos foram sendo tiradas do caminho, soa ridículo o argumento de que o negócio é bom e chega para fortalecer a Embraer.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas