EDITORIAL | Uma pauta sem sentido

O presidente Jair Bolsonaro acaba de completar os primeiros seis meses de sua gestão e a data coincide com a divulgação de indicativos nada satisfatórios sobre o desempenho da economia. No primeiro semestre do ano, e ao contrário das expectativas, a economia não reagiu, patinou e deixou o País muito próximo de, novamente, ingressar num quadro recessivo. Para esta segunda metade do ano as previsões, inclusive do Banco Central, são de um quadro de estabilidade, construída sobre bases comparativas absolutamente insatisfatórias. Ainda assim a retórica política oficial tenta sustentar confiança, garantindo que o quadro muda com a aprovação da reforma da Previdência, que estaria bem próxima de acontecer, garantindo a recomposição das contas públicas, o retorno da previsibilidade e da confiança, tudo isso sustentando investimentos e a volta do crescimento.
Mais que uma visão otimista, esta é uma visão temerária. As coisas não são tão simples quanto alguns tentam fazer acreditar e é absolutamente ilusória a ideia de que todos os males do País, no campo econômico, estão concentrados no desequilíbrio das contas previdenciárias. Como fingir não enxergar, por exemplo, que apenas o serviço da dívida pública consome muito mais e representa, de longe, a maior despesa da União? Ou como deixar de perceber que em Brasília as discussões tomam outra direção? Por mais incrível que possa parecer já se fala em sucessão, a hipótese de reeleição, descartada durante a campanha, é assumida pelo atual presidente, enquanto outros personagens notórios se movimentam, mais ou menos disfarçadamente, com o mesmo objetivo. Ou alguém duvida que o atual presidente da Câmara dos Deputados ou o governador de São Paulo estejam em campanha, ainda que dizendo o contrário.
Parece faltar até senso da realidade, sem que se perceba os riscos que o País está correndo e o tamanho da tarefa de removê-los. Os projetos que se apresentam ou se insinuam continuam sendo, invariavelmente, de poder, sem nenhum sinal efetivo de que se pretenda construir, no sentido mais verdadeiro, um projeto de governo, a partir de metas e objetivos permanentes que não pertencem a esta ou aquela figura ou a quaisquer dos grupos políticos. Projetos para o País, com metas claras, prazos estabelecidos e objetivos consensuais muitíssimo bem definidos. Não seria exagerado afirmar que não existe outra fórmula que possa dar certo, assim como não é próprio ignorar que existem também emergências a serem enfrentadas, soluções possíveis num contexto de tantas restrições. Falta foco, talvez até vontade, tão grandes são as ilusões que o poder parece ser capaz de produzir.
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