Editorial

A tarefa esquecida

Disso já se deu conta o próprio presidente da República, que vai tentando, com altos e baixos, construir a governabilidade
A tarefa esquecida
Crédito: Reuters/Ueslei Marcelino

Definitivamente não cabem dúvidas quanto ao fato de que o pluripartidarismo sem ideologia, sem projetos e dose desmedida de ambição produziu estragos que tem custado muito caro ao Brasil. Disso já se deu conta o próprio presidente da República, que vai tentando, com altos e baixos, construir a governabilidade mas começa a se incomodar com as concessões que tem que fazer por conta de um apoio que nunca tem prazo de validade. Nada de novo, nenhuma deformação que não tenha passado pelo crivo de observadores mais atentos e críticos. Aqueles que nunca aceitaram como natural a escolha de ministérios conforme o tamanho de suas verbas e igualmente nunca colocaram no rol do aceitável a existência, sem disfarces, das siglas de aluguel, assim constituídas e apresentadas. Distantes, todas, de qualquer tipo de pudor. Pior, de postos pedidos e recebidos “de porteiras fechadas”.

Se o presidente da República, que tem a caneta e a chave do cofre, que passa pela cadeira pela terceira vez e bem conhece estas práticas nada ortodoxas, confessa a pessoas mais próximas e íntimas que negociações são próprias do sistema político, mas não podem se misturar com ameaças e barganhas, seu incômodo dá para imaginar o que se passa nos ambientes do poder em Brasília. Da mesma forma que, e sem que seja preciso lembrar a excrescência do orçamento secreto na gestão passada, o quanto o País, cada um de nós na realidade, paga por tantos e tão frequentes abusos. Questões que não podem continuar pertencendo ao rol das lamentações ou, ainda pior, do conformismo, do triste “política é assim mesmo”.

São questões e constatações que necessariamente nos remetem a uma indagação fundamental, buscando respostas para a protelação, hoje bem próxima do esquecimento, da reforma política que um dia foi apontada como ponto de partida para todas das mudanças que viriam na sequência para devolver ao Brasil condições de existir e de poder avançar na direção daquele futuro sempre adiado. Nesse sentido, não cabe ao presidente da República, o primeiro refém de um sistema escandalosamente viciado, apenas lamentar e ainda assim fazendo-o em círculos tão reservados quanto supostamente discretos.

Se ele não pode comprar a briga, o que seria o mesmo que colocar seu cargo e seu pescoço em risco, deveria trabalhar para ajudar a construir um ambiente novo, mais transparente, mais eficiente e mais confiável, abrindo espaços para que alianças sejam feitas em nome de ideias e projetos, amarrados pelo apreço ao serviço público, assim bem distante de tudo aquilo que continuar a correr, ladeira abaixo, em direção contrária. Ou o mesmo que finalmente enxergarmos a luz no fim do túnel.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas