Editorial

Maus hábitos na administração pública: uma farra bem antiga que virou rotina

A farra que começou com D. João VI e resistiu à passagem do tempo
Maus hábitos na administração pública: uma farra bem antiga que virou rotina
Crédito: Reprodução Adobestock

Quando D. João VI chegou ao Rio de Janeiro em 1808, fugindo de Napoleão, sua primeira tarefa foi acomodar os cortesãos que o acompanhavam, sendo preciso, à falta de outra solução, desalojar sumariamente a elite da época. Nascia um novo país e ao mesmo tempo maus hábitos que perduram até o presente. Era preciso contentar uns e outros, o que foi feito à custa de favores de um sistema político que se tornou generoso por absoluta conveniência.

Nada muito diferente do que ocorre ainda hoje, como no caso das emendas parlamentares agora tão debatidas ou de desembargadores do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul. Estes, como acaba de revelar o jornal “O Estado de São Paulo”, chegaram a receber no ano passado, considerados valores líquidos, 8 vezes mais que os vencimentos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), sabidamente o teto para proventos do funcionalismo público no País.

Longe de ser um fato isolado, trata-se de rotina que se repete, desafiando pelo menos o bom senso, uma vez que pudor não parece mais existir na administração pública por ação ou omissão de seus agentes. E tudo isso ao mesmo tempo em que o desafio de assegurar o equilíbrio das contas públicas prossegue de lado, gerando um desequilíbrio que a médio prazo pode ser fatal para toda a economia do País. Como já foi dito aqui mesmo, não se trata de buscar o equilíbrio formal, que pode ser meramente contábil e sempre com espaço para manobras de conveniência que fabricam apenas ilusões.

O que contaria na verdade seriam mudanças de hábitos, ou o mesmo que apagar a memória deixada por D. João VI e seu séquito. Afinal, em que outra perspectiva, para além do relato publicado numa das últimas edições do jornal paulista, poderia ser colocado relatório sobre a movimentação de jatos da Força Aérea Brasileira (FAB), postos à disposição, e indiscriminadamente, das excelências que habitam Brasília? Como afinal entender, muito menos aceitar, que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, tenha feito 146 viagens em jatinhos da FAB no ano passado, enquanto Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, fez 135 voos? Menos ainda, como e por que o ministro Fernando Haddad, o homem que em tese comanda a guerra contra a gastança no País, tenha requisitado à FAB outros 123 deslocamentos? Só caberia acrescentar que a Força Aérea, talvez por constrangimento, anota os voos, mas não revela seu custo.

O conteúdo continua após o "Você pode gostar".


Tudo lembrando que a farra que começou com D. João VI resistiu à passagem do tempo e sugere que o fim da gastança bem pode ser não mais que uma triste utopia.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas