Opinião

Um mau exemplo

Aristoteles Atheniense*

A desmesurada empolgação do governo brasileiro com o presidente Trump, como já ocorreu em seguidas oportunidades, importa, implicitamente, na aprovação de sua gestão. Este assombro é alimentado pelas teorias do filósofo Olavo de Carvalho, que tem no atual chanceler, Ernesto Araújo, o seu mais arrebatado representante em nosso País, e pelas constantes manifestações de entusiasmo do deputado federal Eduardo Bolsonaro.

Na semana que passou, Trump invocou o seu poder de convocar um estado de emergência, que lhe assegurará recursos suficientes para construir o muro na fronteira com o México. Trata-se de uma promessa de campanha eleitoral, acrescida do detalhe de que o imenso paredão seria custeado pela nação asteca.

Segundo a Casa Branca, Trump, com esta providência, poderá dispor de US$ 8 bilhões, oriundos do bloqueio que irá promover, além de US$1,4 bilhão já alocados pelo Congresso.

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Em sua fala, Trump reconheceu que a proposta ficaria sujeita a uma acirrada luta judicial. Foi o que não tardou a acontecer, diante do inconformismo dos 16 estados da Federação. A sua confiança na solução derradeira, por parte da Suprema Corte, onde conta com maioria consagradora, fez com que afirmasse: “felizmente vamos ganhar”.

A justificativa adotada para essa malsinada iniciativa será impedir a imigração ilegal, aliada ao contrabando de drogas e ingresso de bandidos que viessem a colocar em risco a estabilidade dos Estados Unidos. A Comissão Judicial da Câmara dos Representantes, controlada pela oposição democrata, anunciou a imediata abertura de uma investigação parlamentar.

Vários senadores republicanos criticaram a declaração de emergência por criar um perigoso precedente, importando em extrapolação dos poderes do Executivo.

Ao contrário do que sustentou em seu comunicado, o fluxo imigratório tem diminuído ano a ano. Já a entrada de mexicanos, não ocorre somente por via terrestre, mas, por igual, através dos aeroportos do país.

A declaração de emergência nacional não poderá ficar à mercê do arroubo presidencial, por envolver questão constitucional em que o Executivo contrapõe-se ao Legislativo. A política externa sustentada por Trump é tida pelos especialistas como realizada por “debaixo do pano”, visando, exclusivamente, a redução dos gastos diretos dos Estados Unidos, com a consequente garantia de superávits comerciais positivos em todos os continentes.

Em razão do descontrole flagrante que compromete a política norte-americana, é incompreensível que o presidente Bolsonaro continue entusiasmado com os métodos adotados pelo mandatário estadunidense, como se esses pudessem ser tomados como parâmetro pelo seu colega brasileiro.

A demagogia que medra na administração trumpista sofre restrições, inclusive, de alguns de seus correligionários. O Brasil, que enfrenta dificuldades imensas, não poderá valer-se de exemplos fajutos, que têm na construção da muralha divisória a melhor prova de sua alucinação incontida no adágio “America first”.

De outra parte, o crescimento econômico brasileiro tornar-se-á tão mais problemático na medida em que os avanços em áreas preferenciais, como saúde, educação e segurança, não atingirem o índice pretendido. Se isto ocorrer, os investimentos externos, tão decantados, não surgirão, mesmo com a reforma da Previdência.

A reiterada versão de que Trump reduziu o desemprego em seu país, como se isto fosse suficiente para que possamos imitá-lo, não passa de uma falácia. Basta considerar a diversidade de situações entre a economia norte-americana e a nossa, mesmo se as medidas defendidas pelo ministro Paulo Guedes, em prol de seu restabelecimento, surtirem o resultado esperado.

  • Advogado, Conselheiro Nato da OAB e Diretor do IAB
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