Política

Benesses partidárias

Já afirmei nesta mesma coluna que o Brasil é um país sui generis. Nesta classificação, preciso acrescentar os eleitores de Lula. Se se podemos confiar nas pesquisas eleitorais, o ex-presidente tem 39% de preferência do eleitorado. Não fosse ele prisioneiro da ficha limpa, seria candidato e, por certo, ganharia a eleição. E é aí que reside a minha dificuldade de compreender certos eleitores.

Vamos imaginar que daquele total, pelo menos 60% sejam de pessoas da esquerda que votariam e votarão em qualquer um indicado pelo PT. Acreditam e têm fé absoluta de que Lula foi um presidente honesto; seus colaboradores se roubaram no governo, entregaram todo o dinheiro para o partido, todos são tão pobres quanto quando entraram no governo, o tríplex não é do Lula e o sítio de Atibaia é um empréstimo de um ator da Globo. Acrescente ainda que para esse mesmo grupo de apaixonados pela esquerda e pelo Lula, o juiz Sérgio Moro é um agente da CIA que veio para destruir o que o ex-presidente e sua sucessora fizeram.

Então fica a pergunta que vale uma presidência da República: por que os 40% daquele total, equivalente a 15,6% dos eleitores ainda votam no ex-presidente? Imagino que não sejam pessoas fanáticas pela esquerda, maldosamente chamados de esquerdopatas. Essa percentagem significa que seus integrantes partem da premissa de que tudo feito pelo PT durante 13 anos foi perfeito e que estão ansiosos pela volta daquele governo, dirigido por aquele que, processado como cidadão comum, passou por dezenas de recursos no Judiciário, foi condenado em todas e em especial na segunda instância por unanimidade de um colegiado de três desembargadores e, por isso, inelegível e preso. O ex-presidente responde ainda por outros processos que agravarão sua pena atual de 12 anos e um mês, se for condenado em algum deles.

Significa ainda que acreditam na honestidade dos diretores da Petrobras, nomeados por governo petista e que já devolveram, sem a menor cerimônia, milhões de dólares roubados da companhia e depositados na Suíça, malas de dinheiro inexplicáveis, cotas de arrecadação de partidários nomeados, todos devem voltar ao poder, serem nomeados novamente para alguma empresa estatal e autorizados pelas urnas a recomeçar a roubalheira.

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Tudo isso pra não mencionar em detalhes os assaltos aos fundos de pensão, bancos oficiais, ministérios, licitações fraudadas, etc. Esse grupo de milhões de eleitores brasileiros sabe disso? Leem jornais, veem noticiários de televisão ou ouvem comentários de vizinhos melhores informados? Perplexo, pergunto: não há uma percentagem de petistas que pensam e acreditam que houve permanente ladroagem nos 13 anos? Estes são somente aqueles que deixaram o partido, desiludidos com a realidade partidária?

Pequena cidade do interior de Minas conhecida deste articulista elegeu há alguns anos um prefeito petista. A prefeitura local e a cidade ficaram cheias de novos funcionários públicos municipais vindos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, ávidos por um emprego. O companheiro eleito, em detrimento aos nativos, admitiu todos. Alguns daqueles eleitores da faixa dos 15,6% imaginam receber benesses idênticas, algumas migalhas de poder, salários, cargos de confiança? Imaginam que esses cargos são tantos que sobrarão vagas para todos os companheiros? Esclareço que, apesar de a esquerda não acreditar, não há dinheiro para pagamento dessas gentilezas partidárias e que, ao contrário do que pensam, dinheiro não nasce no asfalto. Dinheiro do governo vem das pessoas, empresários e empresas que produzem, geram riquezas e pagam os impostos. Voltar para a toada executada pelo PT é acreditar que todos os partidários já condenados pela Justiça, presos e que devolveram milhões de dólares, roubaram tudo sozinhos, e que roubos imensos não têm sócios ocultos nas tramoias. Nem nos roteiros do cinema americano é assim: há sempre uma quadrilha visível ou invisível que participou e que divide o dinheiro depois do assalto.

* Psicanalista, advogado e escritor

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