Bolsonaro veta obrigação de editais para retaliar jornais

Os 26 vetos do presidente da República à Lei de Licitações (Lei 14.133/2021) devem ser apreciados na próxima semana pelo Congresso Nacional. Dois desses vetos (inciso 1º do artigo 54 e inciso 2º do artigo 175) referem-se à publicação de editais em diários oficiais e em jornais impressos de grande circulação.
Caso não seja derrubada, a não obrigatoriedade das publicações pode ter consequências graves à democracia como segregação da informação, falta de transparência do processo licitatório e desemprego.
Ao vetar, o argumento do presidente Jair Bolsonaro é de que a obrigatoriedade da publicação é uma medida “antieconômica e desnecessária”, pois as informações ficarão disponíveis ao público e às empresas no Portal Nacional da Contratação Pública (PNCP). Fontes em Brasília afirmam, porém, que o veto é uma retaliação de Bolsonaro a grandes jornais de circulação nacionais que, segundo ele, o atacam.
Fato é que o PNCP ainda não foi criado. E a inclusão digital dos brasileiros está longe de atingir 100% da população. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (referência 2018) mostram que uma em cada quatro pessoas no Brasil não tem acesso à internet. Em números totais, isso representa cerca de 46 milhões de brasileiros que não acessam a rede.
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“Esses vetos são um profundo equívoco. Significarão menos transparência, principalmente em municípios menores. Menos pessoas terão acesso às informações sobre o que está sendo feito com o dinheiro público, pois nem todo mundo tem acesso à internet, algo bastante evidenciado com a pandemia. É importante ressaltar que, mesmo em países desenvolvidos, de economia madura e com ampla inclusão digital, há obrigatoriedade de publicação das licitações em jornais impressos, porque entende-se que quanto mais transparência em relação ao dinheiro público, melhor”, disse o diretor-executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Ricardo Pedreira.
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A não publicação de editais em jornais impressos também pode significar desemprego, principalmente em jornais do interior. “O jornal do interior é um porta-voz das pessoas nas cidades onde elas vivem. Veículo eficaz, seguro e de fácil acesso. Muitos desses veículos precisam da publicidade legal para se manter”, destacou o presidente da Associação Nacional dos Jornais do Interior do Brasil (Adjori-Brasil), José Roberto Deschamps. A entidade, que representa cerca de 700 jornais de interior do País, protocolou junto ao presidente da Câmara, deputado federal Arthur Lira, um pedido para a derrubada do veto.
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Mas a falta de transparência é, sem dúvida, uma das principais consequências à sociedade. “Temos cerca de 40 mil órgãos públicos no País. Imagine todas as informações de todos os serviços contratados e as compras feitas por todos esses órgãos em um único lugar. Se é difícil para o cidadão dito mediano acessar essas informações, imagine para a população pobre, ou seja, a esmagadora maioria”, observou o advogado da Associação das Agências de Publicidade Legal de Minas Gerais (Alegal), Bruno Camargo Silva.
O acesso das empresas aos editais é outra preocupação. “Com a falta de publicação ampla nos impressos, nem todas as empresas ficarão sabendo dos editais. Isso favorece a contratação sempre dos mesmos grupos”, acrescentou Silva.
Mobilização
A bancada mineira tem se mobilizado para a derrubada do veto no Congresso, que pelo prazo regimental pode ocorrer até o dia 5 de maio. O deputado federal Odair Cunha (PT-MG) é contra os vetos.
“Publicar licitações em jornais impressos em um País como o Brasil, que a internet infelizmente ainda não chega a todas as casas, é prezar pela transparência na administração do dinheiro público, do dinheiro que é em sua essência do nosso povo”.
Um dos parlamentares que têm atuado pela causa é o deputado paulista Ricardo Silva do PSB. “Estamos nos mobilizando. Isso é um retrocesso, um ataque à democracia, um ataque à liberdade de informação e ao direito que as pessoas têm de saber o que é que os governantes estão fazendo em suas contratações”, disse.
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