Calheiros articula a instauração de uma CPI no Senado

Brasília – O senador Renan Calheiros (MDB-AL) decidiu articular a criação de uma CPI dos Atos Antidemocráticos que mira o ex-presidente Jair Bolsonaro a partir da próxima legislatura, no início de fevereiro, em um dos lances como reação para investigar e responsabilizar envolvidos direta e indiretamente na invasão e depredação dos edifícios-sede dos Três Poderes no domingo em Brasília.
Em entrevista à Reuters, Renan afirmou que a apuração deve envolver uma série de autoridades, incluindo o próprio ex-presidente e a cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR).
“Vamos investigar em todas as direções, quem dos militares colaborou com isso, quem do próprio governo com ingenuidade colaborou por ação e omissão. Vamos investigar o Aras (procurador-geral da República) e a vice-procuradora (Lindôra Araújo), porque o Aras chegou a pedir o arquivamento do inquérito do Supremo sobre atos antidemocráticos”, disse.
Renan, que é ex-presidente do Senado e um crítico de Bolsonaro, afirmou que protocolar o pedido a partir de fevereiro não teria dificuldades sobre o prazo de funcionamento da comissão.
Em outra frente, Renan decidiu apresentar ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), um pedido para apurar eventual envolvimento de Bolsonaro nesses novos fatos no inquérito que investiga atos antidemocráticos, da mesma forma como ocorreu com o governador afastado do DF, Ibaneis Rocha, e o ex-secretário de Segurança de Brasília Anderson Torres.
O senador ainda quer que o magistrado declare o ex-presidente –no momento nos Estados Unidos — como um fugitivo da Justiça e que ele compareça à Justiça brasileira para prestar esclarecimentos sobre os últimos fatos. Segundo Renan, se Bolsonaro não comparecer, que seja decretada a prisão preventiva dele para garantir a aplicação da lei.
“Esse é o caminho que devemos seguir”, destacou Renan.
Um outro pedido de criação de CPI já está mais adiantado, mas não deve avançar justamente devido ao término da atual legislatura no fim do mês.
O pedido articulado pela senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS), ex-candidata a presidente, já conta com 31 assinaturas, quatro a mais do que o mínimo necessário para ser apresentado à Mesa Diretora, e quer apurar eventuais omissões de autoridades públicas no controle da segurança e os financiadores dos atos criminosos.
Esse pedido de CPI prevê o funcionamento por 130 dias. No entanto, se o requerimento for protocolado logo, a comissão teria de ser encerrada até 31 de janeiro, quando acaba a atual legislatura. Há senadores que subscrevem o pedido que vão deixar o mandato na Casa no fim do mês.
Em entrevista coletiva, o presidente em exercício do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), disse que por esse motivo, uma CPI sobre o tema só deverá ser instalada a partir de 1º de fevereiro.
Presidentes dos Três Poderes repudiam ataques
Brasília – Os presidentes dos Três Poderes divulgaram nota conjunta ontem repudiando os atos golpistas e de vandalismo que ocorreram em Brasília no dia anterior.
“Os Poderes da República, defensores da democracia e da carta Constitucional de 1988, rejeitam os atos terroristas, de vandalismo, criminosos e golpistas que aconteceram na tarde de ontem em Brasília”, diz a nota.
O documento é assinado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pelo presidente do Senado em exercício, Veneziano Vital do Rêgo, pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, e pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber.
“Estamos unidos para que as providências institucionais sejam tomadas, nos termos das leis brasileiras. Conclamamos a sociedade a manter a serenidade, em defesa da paz e da democracia em nossa pátria”, segue o texto divulgado.
Pela manhã, Lula se reuniu com a ministra Rosa Weber e com o deputado Arthur Lira no Palácio do Planalto. Ele divulgou um registro da reunião em seu perfil no Twitter e escreveu “Firmes na defesa da democracia”.
Também participaram do encontro, segundo divulgado em agenda oficial do presidente, os ministros do STF Roberto Barroso e Dias Toffoli, além de José Múcio (Defesa), Flávio Dino (Justiça), Rui Costa (Casa Civil), Fernando Haddad (Fazenda), Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Paulo Pimenta (Secom).
A divulgação da nota ocorreu após encontro das autoridades no gabinete presidencial do Planalto, no qual os vândalos não conseguiram entrar, por ser uma sala blindada.
A ideia é mostrar que, apesar da depredação física do local, as instituições continuam funcionando, segundo Pimenta.
Ontem, o cenário era de destruição no Planalto, em especial o térreo e o segundo andar, onde ocorrem as cerimônias.
Jornalistas se aglomeram nas portas do Planalto para acompanhar agenda de Lula, enquanto funcionários da presidência limpam o local. Uma servidora chegou a passar mal no segundo andar devido ao cheiro de gás lacrimogêneo, que permanece no Salão Nobre.
Mais cedo, a jornalistas, o ministro da Secom disse que vândalos golpistas que invadiram o Palácio do Planalto, além de armas, levaram também HDs e documentos.
Segundo Pimenta, houve cumplicidade com os criminosos, que “conheciam” o Planalto. Outra parcela estava apenas destruindo o local e muitos estavam bêbados.
“Uma parte das pessoas [no Palácio] sabia o que estavam fazendo. Enquanto a horda destruía tudo, uma parte agia com inteligência. Levaram muito HD, levaram armas, documentos”, disse a jornalistas na porta do Planalto.
No domingo (8), manifestantes golpistas, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tomaram a sede dos Três Poderes, invadindo e depredando os prédios. O episódio levou ao afastamento do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, pelo ministro Alexandre de Moraes. O GDF é responsável pela segurança na região da Esplanada.
O então secretário de segurança pública e ex-ministro de Bolsonaro, Anderson Torres, foi exonerado ao longo do domingo e teve a prisão solicitada pela AGU (Advocacia-Geral da União).
O GDF se manifestou em nota nesta segunda, um dia depois do afastamento de Ibaneis, dizendo repudiar “com veemência os atos terroristas ocorridos na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, no último domingo”.
O governo do DF disse também que criou um gabinete de crise para colaborar “de todas as formas” com as investigações e ressaltou que a possível participação de servidores nos atos será analisada pela Controladoria-Geral.
“Nenhuma depredação do patrimônio público será tolerada. O GDF vai seguir trabalhando normalmente, mantendo as agendas previamente acertadas, com lançamentos de obras e entregas”, acrescentou. (Marianna Holanda, Victória Azevedo e Thaísa Oliveira)

Ação terrorista atrasa anúncio de medidas
Brasília – O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está rediscutindo com a Casa Civil o cronograma das primeiras medidas econômicas do governo após as atenções do mundo político serem capturadas pelos ataques aos Três Poderes em Brasília, havendo risco de adiamento das primeiras ações planejadas pela equipe econômica, relataram à Reuters três fontes com conhecimento do assunto.
Pressionado a apresentar ações concretas e avaliações sobre o quadro fiscal do País, Haddad previa que as primeiras divulgações ocorreriam já nesta semana. Com conversas ainda preliminares diante do novo cenário, o plano pode mudar.
“É possível que haja algum atraso na divulgação. Muito complicada a situação”, disse uma das fontes, sob condição de anonimato.
Outro interlocutor da pasta afirmou que a agenda da semana pode mudar, com possível adiamento das primeiras medidas.
Haddad ainda fecharia com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a lista de ações a serem implementadas. Os eixos de atuação incluem reavaliação das receitas federais para 2023 e medidas para ampliar a arrecadação e cortar gastos.
Entre as medidas estudadas estão um incentivo extraordinário à redução de litígio no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) e a reavaliação de desonerações tributárias implementadas pelo governo Jair Bolsonaro.
O ministro também pediu prioridade aos estudos de reformas estruturais, como a tributária e a fiscal, mas essas iniciativas já tinham prazo mais alargado para serem colocadas em prática. Até semana passada, Haddad previa debate sobre os temas nos três primeiros meses de governo e início efetivo da análise pelo Congresso a partir de abril.
Após apoiadores radicais do ex-presidente Jair Bolsonaro invadirem e depredarem o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal no domingo, Haddad está participando pessoalmente das reuniões emergenciais com o presidente Lula e representantes de outros poderes.
Duas outras fontes da área econômica afirmam que os trabalhos do corpo técnico do Ministério da Fazenda seguem ocorrendo normalmente. Enquanto uma delas afirma a apresentação das ações ainda dependerá de decisão de Haddad e Lula, a outra diz esperar que o cronograma não seja afetado pelos acontecimentos recentes.
Em outra área da equipe econômica que será impactada pelos atos de bolsonaristas, o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos é responsável pela secretaria que administra o patrimônio da União. Por isso, a pasta deve acompanhar o levantamento dos danos causados pelos manifestantes e a elaboração do plano para recuperar os edifícios.
Ontem, a ministra da Gestão, Esther Dweck, estava entre os nomes que participariam de um seminário sobre economia na Universidade de Brasília. A participação acabou cancelada.
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