CENÁRIOS | O Brasil e a OCDE no marco da atração de investimentos estrangeiros diretos

A partir de hoje, o DIÁRIO DO COMÉRCIO inaugura série de artigos semanais voltados para a entrada do Brasil na OCDE e o impacto na atração de investimentos estrangeiros diretos. Os autores convidados são Marcos Mandacaru, Assessor Especial da Vice-Governadoria de Minas Gerais e especialista em atração de investimentos, e Juliano Alves Pinto, Subsecretário de Desenvolvimento Econômico de MG e diplomata de carreira.
Parte I
Origens da OCDE
Não há dúvidas quanto ao fato de a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) ser hoje reconhecidamente relevante enquanto catalisadora de boas práticas que auxiliam na adoção paulatina, em escala global, do livre comércio e do livre fluxo de investimentos. Não é para menos que o renomado teórico das Relações Internacionais Joseph Nye aponta que a OCDE integra uma espécie de tríade das organizações internacionais que conformam uma grande estrutura de governança internacional voltada para a economia, em pé de igualdade com o FMI e a OMC.
A origem da OCDE remonta ao contexto pós-II Guerra Mundial, momento de crucial importância em que o mundo precisou se reorganizar sob a égide do multilateralismo, basicamente por meio da criação do sistema ONU e da conformação de arcabouço normativo internacional que tratasse dos temas econômicos mais relevantes em nível global.
Em 1944, na Conferência de Bretton Woods, foram criados o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird) – mais tarde batizado de Banco Mundial- e o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt), transformado em 1994 em Organização Mundial do Comércio (OMC), no entendimento de que para se alcançar a paz seriam necessários esforços de coordenação interestatal e de ajuda mútua para que a economia mundial fosse reorganizada no marco da reconstrução dos países mais afetados pela Guerra.
O contexto pós-II Guerra, como se sabe, foi marcado pela divisão do mundo em dois blocos antagônicos: um capitalista, liderado pelos EUA e; outro, socialista, sob comando da URSS. Dessa bipolaridade derivaram, anos mais tarde, os conceitos de Primeiro Mundo e Segundo Mundo, em que o primeiro se refere aos países capitalistas considerados desenvolvidos e o segundo, aos países socialistas típicos. Essa divisão em mundos foi marcadamente reforçada no início da década de sessenta, em que um terceiro grupo de países, chamado de Terceiro Mundo, consubstanciado pelos países mais pobres, em sua maioria ex-colônias recém-independentes, que poderiam gravitar ora em torno do bloco capitalista, ora em torno do bloco socialista, ao sabor das conveniências geopolíticas.
Nesse sentido, a OCDE colocou-se como sucessora de uma outra instituição, a Organização Europeia para a Cooperação Econômica, fundada em 1948, com vistas a gerir a política de financiamento da reconstrução da Europa após a Segunda Guerra Mundial. Na implementação do Plano Marshall, os EUA dispenderam maciços investimentos em obras públicas para que a Europa Ocidental, fragilizada com as perdas humanas e econômicas, pudesse se reerguer sem que sucumbisse à influência da URSS, situada geograficamente mais próxima e em plena ascensão econômica e política.
Em 1961, a OCDE se torna uma organização não necessariamente europeia, mas marcadamente ocidental, em vista, principalmente, da já visível recuperação econômica dos países europeus e o necessário desengajamento parcial norte-americano no plano Marshall, em vista de pressões de natureza monetária, cujos resultados apareceriam de forma mais evidente no início da década de setenta, com a quebra do padrão dólar-ouro em 1971 e o primeiro choque do petróleo em 1973.
A OCDE passou a exigir uma colaboração de mão dupla entre os estados-membros, todos suficientemente industrializados e, no caso dos países da Europa Ocidental, desde 1957, já organizados sob a égide de um tratado de livre comércio que conformaria um dos mais bem-sucedidos modelos de integração econômica, algumas décadas depois: a União Europeia.
Durante muitos anos, até 1994, a OCDE representava uma espécie de clube restrito às nações mais ricas, reunindo os Estados Unidos, o Japão, a Coreia do Sul, Israel, a maioria dos países da União Europeia e os não membros Islândia, Noruega e Suíça. A partir de 1994, foram admitidos os emergentes Turquia, Chile, Colômbia e México, cuja acessão se deu no marco da assinatura do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta). A entrada do México, por muitos criticada, viabilizou o ingresso posterior de outras nações latino-americanas: Chile (2010) e Colômbia (2020), ambos os países notoriamente alinhados com os ditames da política externa norte-americana.
Por este e por outros motivos que serão abordados adiante, uma eventual entrada do Brasil na organização foi por muitos anos adiada, dentro de uma leitura estratégica considerada correta no seu tempo, mas que perdeu o sentido diante dos novos desafios impostos pela agenda internacional do século XXI.
Ouça a rádio de Minas