Promotora põe em xeque vacinação na SES

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fura-Filas da Vacinação ouviu, ontem, representantes do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), da Ouvidoria-Geral do Estado da Controladoria-Geral do Estado, sobre a suposta vacinação irregular de servidores da Secretaria de Estado de Saúde (SES) com o imunizante contra Covid-19.
A primeira ouvida pela CPI da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) foi a promotora de Justiça de Defesa da Saúde, Josely Ramos Pontes, segundo a qual “estamos enfrentando um problema ético sem precedentes”, tendo em vista que a Secretaria de Estado de Saúde não tinha e não tem autonomia para vacinar diretamente as pessoas, conforme previsto no Plano Nacional de Imunização (PNI).
“Quem está em risco maior tem de ser contemplado primeiro”, afirmou Josely. “Questionamos porque instituições como o Ipsemg, Fhemig, João Paulo II, João XXIII e Maternidade Odete Valadares, que também estão atendendo pacientes com Covid, não foram contempladas na deliberação da Comissão Intergestores Bipartite do Estado de Minas Gerais (CIB-SUS/MG) de 9 de fevereiro, que determinou a vacinação desses mais de 800 servidores públicos. Quem está em hospital está em risco maior do que quem trabalha na Cidade Administrativa. Não tem como relativizar”, acrescentou.
Questionada pelos parlamentares, a promotora foi taxativa em afirmar que a recomendação do Ministério Público é de que os trabalhadores do nível central do Estado que já receberam a primeira dose de maneira que contraria o previsto pelo PNI não necessariamente recebam a segunda dose, sendo necessário avaliar o risco sanitário de cada caso.
O deputado Guilherme da Cunha (Novo) afirmou que poderia ser “dano ao erário” não vacinar os servidores da Secretaria de Estado de Saúde que já haviam recebido a primeira dose e reforçou que eles são, de qualquer forma, servidores públicos, parcela prioritária da vacinação, de acordo com deliberação da CIB-SUS/MG.
Com relação a isso, a promotora afirmou que as duas doses, no que diz respeito à Coronavac, são iguais e que essa segunda dose poderá ser usada como primeira dose para trabalhadores da linha de frente que ainda não foram contemplados. “Podemos verificar quantas pessoas na linha de frente desde 9 de fevereiro se contaminaram e poderiam não ter adoecido ao ter recebido essas doses que foram para quem estava em risco menor. Aí teríamos uma noção do impacto que essa decisão teve”, reforçou.
Divergência de informações – O relator da CPI, deputado Cássio Soares (PSD), questionou a promotora com relação ao número de servidores vacinados que constam da lista entregue ao MPMG pela Secretaria de Estado de Saúde. A lista, recebida pela promotora ontem, tem 832 nomes, enquanto a recebida pela ALMG tem 828.
“É claro pra mim que a secretaria ainda está oferecendo a nós informações desencontradas e precisaremos checar isso diretamente com eles”, disse o relator.
O presidente da comissão, deputado João Vitor Xavier (Cidadania), questionou a promotora se na lista que ela recebeu haveria data da vacinação das pessoas, incluindo a do ex-secretário de Saúde, Carlos Eduardo Amaral. Ela respondeu que, numa análise rápida, percebeu que a lista não tem datas, mas teria quais dos servidores já tomaram a segunda dose e quais não.
Para ela, o mais grave foi que todo o processo que culminou na vacinação dessas pessoas não foi, em momento algum, publicizado.
“Não estou dizendo que essas pessoas não estavam em risco. Mas visitas eventuais e políticas a hospitais não autorizam a vacinação. O que autoriza é uma atividade obrigatória que coloca a pessoa em risco sanitário. Se essa questão tivesse sido discutida numa reunião da CIB-SUS/MG, talvez pudéssemos entender o que aconteceu. Mas não foi”, avaliou.
A promotora afirmou ainda que a questão de danos ao erário será levada em consideração quando for determinada a responsabilização e que a previsão é de que em 15 dias o MPMG chegue a uma conclusão sobre quais os procedimentos civis e criminais que deverão ser tomados. “Eu vejo a responsabilização tanto de quem determinou a vacinação quanto dos servidores que receberam as doses. Há casos que podem ser excepcionais e analisaremos todos”, completou.
O deputado Carlos Pimenta (PDT) disse que está recebendo mensagens de servidores apavorados com a divulgação de seus nomes como sendo fura-filas. Segundo ele, ainda que não estejam na linha de frente, muitos estão atuando no Farmácia de Minas e envolvidos na distribuição de vacinas. Nesse sentido, defendeu que não haja generalização: “Não são todos que burlaram a ordem de vacinação”. (Com informações da ALMG)
Ouvidoria recebeu denúncia em janeiro
Também convidadas pela CPI a prestar depoimentos, Simone Deoud, ouvidora-geral do Estado, e Thamiris Aguiar Maciel, ouvidora de Saúde, informaram que a Ouvidoria de Saúde recebeu, antes do início do processo de vacinação dos servidores da SES, duas denúncias de possível descumprimento de ordem de prioridade. A primeira, em 24 de janeiro, foi divulgada pela imprensa e teria sido encerrada após pedido de complementação não atendido pelo autor, anônimo. Tratava-se, segundo elas, de denúncia genérica e imprecisa.
A segunda, feita em 25 de janeiro, tinha materialidade e elementos, e por isso foi encaminhada em 3 de fevereiro para a Controladoria Geral do Estado, segundo elas o órgão competente para realizar a investigação. “Não pedimos informações à Secretaria, porque essa apuração é por conta da Controladoria”, frisou.
O deputado Ulysses Gomes (PT) indagou se depois dessas denúncias relatadas a ouvidora-geral teria se encontrado com o secretário e com o governador Romeu Zema e se teria comentado com eles sobre as denúncias. Simone confirmou ter se encontrado com os dois em reunião de trabalho, mas que não havia comentado. “Como órgão de controle, não podemos antecipar julgamentos. Não senti necessidade de tecer nenhum comentário a respeito”.
A ouvidora de Saúde disse que o órgão recebeu quase 3 mil manifestações desde o início da imunização em Minas, entre denúncias, elogios, reclamações e informações envolvendo o processo. Segundo Thamires, do total, mais de 1,6 mil manifestações tratavam-se de denúncias e, destas, a grande maioria (1,4 mil) refere-se especificamente a fura-filas.
A ouvidora de saúde do Estado ainda acrescentou que é dada ciência ao Ministério Público de todas as denúncias relacionadas a possíveis fura-filas.
O relator também solicitou que a Ouvidoria envie à CPI o relatório das manifestações recebidas desde o início da pandemia, e não somente após o início da vacinação. (Com informações da ALMG)
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