Política

Quem tem medo de Sérgio Moro?

Quem tem medo de Sérgio Moro?

Tilden Santiago*

Nos últimos dias, nas ruas, ninguém fala de Paulo Guedes, de Mourão e generais nomeados para o Ministério. Poucos se preocupam com a transferência da Embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém ou com o possível corte das relações diplomáticas com a Palestina e com Cuba.

Mas está na boca e na mente dos brasileiros e brasileiras, o nome do juiz Sérgio Moro, já apontado para levar adiante a luta contra a corrupção e o crime organizado.

Moro tornou-se a personificação simbólica da luta contra a corrupção. E esta é uma aspiração de todos os eleitores de 2018, excetuando corruptos e corruptores, que também votam. O “medo” deve ser desse “simbolismo” que ele carrega. Daí a ampla aprovação popular da escolha que fez o presidente eleito. Nem todo medo é negativo!

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O que terão pensado desta indicação Romero Jucá, Geddel Vieira, Sérgio Cabral, Eduardo Cunha, Renan Calheiros, Agripino Maia, Eunício Oliveira, presidente Temer, Ciro Nogueira, Padilha, Kassab, Moreira Franco e tantos outros lembrados pela Operação Lava Jato? “Moro” nos transporta imediatamente para “Jucá”, por ter sido o primeiro a abrir a boca contra a caça aos corruptos, quando afirmou que era preciso mudar o governo para estancar a “sangria” (no parlamento). O senador de Roraima, presidente nacional do MDB, foi o primeiro a dar o alerta na defesa de sua pele e de seus colegas da classe política, num surpreendente gesto de solidariedade de classe.

Nos doze anos vividos como deputado federal por Minas na bancada do PT em Brasília (1991-2003), sabia da corrupção nas eleições e do toma-lá-dá-cá cotidiano – muito frequente. De 1991 a 2003, nós deputados petistas nunca éramos chamados para nos locupletarmos. Uma vez apenas, um colega governista pouco antes da votação da reeleição para presidente, me perguntou se eu já fora pegar meus 300 mil reais. “Como você é petista, nem precisa votar a favor para receber a grana. É só você não comparecer ao plenário da Câmara”. Desconversei, compareci e votei contra, perdendo no resultado final.

Fui autor do projeto de lei que mudou de 3 para 8 anos a punição do político cassado.

Consegui a aprovação do projeto no plenário pelos líderes, no entardecer de uma sexta-feira. Na segunda-feira seguinte, o deputado Roberto Alves, paulista do Centrão, subiu na tribuna para me crucificar: “Colegas parlamentares, na sexta-feira, comemos mosca neste plenário. Aprovamos projeto contra nós mesmos, que nos pune. O autor foi o mineirinho petista, ameno no trato mas cruel conosco na política. É filhote de jesuíta, mais moralista que político, sacerdote – padre-operário’’. E prolongou os impropérios que eu ouvia de meu gabinete. Sandra Starling e Chico Vigilante, presentes no plenário, me defenderam e o projeto, como colegas de bancada. Mais tarde o então presidente FHC sancionaria o projeto aprovado na Câmara e no Senado.

O impeachment de Collor foi o momento singular no enfrentamento da corrupção endêmica no Estado brasileiro. Participava dos debates ao lado de Covas, Suplicy, Mercadante, Genoíno, Vladimir Palmeira, Sandra Starling, Paulo Paim, Eduardo Jorge, Zé Dirceu, Roberto Freire, Sérgio Miranda, João Paulo Pires de Vasconcelos e outros agentes políticos construtores da democracia.

A luta contra a corrupção foi retomada no Mensalão e no Petrolão, quando já parecia esquecida. Ultimamente se falava no fim da Lava Jato. Essa escolha de Moro para o Ministério da Justiça abre novas esperanças de que a luta contra a corrupção do sistema político brasileiro não ficará só no âmbito do Judiciário e da Polícia Federal. Mas será encampada pelos demais poderes. Com a palavra a Câmara e o Senado, cenário da corrupção de políticos e empresários.

* Jornalista, embaixador e militante

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