Política

Zema aponta situação fiscal como maior desafio de Minas

Em conversa com o Diário do Comércio, o governador falou sobre temas capitais ao Estado, como concessão de rodovias e o RRF
Zema aponta situação fiscal como maior desafio de Minas
O governador Romeu Zema aposta nos aportes em infraestrutura para impulsionar a economia mineira | Crédito: Leonardo Morais

Enquanto nas eleições de 2018, Romeu Zema (Novo) saiu da posição de candidato com uma das menores intenções de votos para eleito por mais de 70% dos eleitores, no ano passado, garantiu a reeleição ainda no primeiro turno com 56,18% dos votos válidos, derrotando o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil, do PSD. Personagem não mais tão novo no cenário político, Zema é empresário do varejo em Araxá, Alto Paranaíba, e já desponta como opção para a corrida presidencial de 2026.

Antes, porém, promete dar sequência ao trabalho à frente do Executivo estadual da terceira maior economia do Brasil. A dívida bilionária do Estado e o relacionamento tanto com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) quanto com o governo federal (o qual o governador fez campanha contrária no segundo turno das eleições, ao apoiar o então candidato à reeleição Jair Bolsonaro) prometem ditar o ritmo dessa condução nos próximos quatro anos.

Em entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, o governador falou sobre esses e outros temas caros ao desenvolvimento de Minas Gerais, como os tão esperados projetos de concessão da BR-381, da ampliação do metrô de Belo Horizonte e de construção do Rodoanel Metropolitano, que promete desafogar o trânsito na Grande BH, e as expectativas quanto à repactuação do acordo de Mariana para reparação dos danos causados pelo rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco, ocorrido em 2015.

Quais os principais desafios para este segundo mandato?

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O principal desafio para esse mandato continua sendo a situação fiscal e orçamentária, porque Minas Gerais tem uma dívida de R$ 147 bilhões. Um valor muito expressivo pelo tamanho do Estado e que não há alternativa, a não ser o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que nós já conseguimos adesão, ainda não via Legislativo, mas por meio do Supremo Tribunal Federal (STF), mas o fato de o STF autorizar a adesão por si só, já demonstra a gravidade da situação. E essa restrição orçamentária traz outros problemas e, na medida em que se corrige o problema financeiro, por tabela, corrigimos os outros problemas. Como consequência, temos as estradas num estado de conservação que deixa muito a desejar. Lançamos no ano passado o Provias, que já recuperou mais de 2 mil quilômetros de estradas, mas que ainda é insuficiente. Como durante toda gestão do governo passado, e também nos primeiros três anos da minha gestão, só tivemos operação tapa-buracos, toda a malha asfáltica do Estado já está velha e sujeita a maior deterioração em época de chuvas. Por isso os estragos dessa última chuva foram muito maiores. Já estamos planejando e vamos ter que correr atrás de uma maneira de recuperarmos essa malha, porque o Estado não pode ficar nesta situação. Temos ciência da gravidade, ainda não temos o recurso para solucionar, mas vamos arrumar uma maneira, porque é necessário recuperar.

E nas áreas de saúde, educação e segurança?

Devido à obrigatoriedade dos repasses constitucionais, saúde e educação têm caminhado melhor, principalmente a educação, onde há a obrigação constitucional de destinar para a mesma 25% do orçamento. Na saúde, nosso principal desafio é concluir as obras dos hospitais regionais, que vão revolucionar a saúde no Estado, melhorando, inclusive, a saúde na região metropolitana. Com a conclusão desses hospitais, vamos evitar a transferência de pacientes para a RMBH, vamos ter duas unidades em regiões que carentes: Nordeste e Leste, com hospitais em Teófilo Otoni e Governador Valadares. Na educação, vamos continuar com as reformas das escolas, com o programa Trilhas de Futuro, no qual queremos atingir 300 mil alunos neste segundo governo.  Na segurança, vamos levar adiante os melhores equipamentos, as reformas de delegacias e compra de viaturas para poder manter Minas Gerais como o Estado mais seguro do Brasil. Mas precisamos lembrar que tudo isso está atrelado à questão financeira.

O único caminho é o RRF ou haverá outras ações para balancear as contas públicas?

O regime é fundamental, porque com ele, ao invés de pagar a dívida já vencida, que só não foi paga porque o Estado teve liminares no passado, ao invés de ter que pagar em cinco anos, será possível quitá-la em 30 anos. Qualquer assalariado que puder optar por uma prestação de R$ 5 mil por mês ou por uma de R$ 1 mil, vai optar pela segunda opção. O que estamos fazendo junto à Secretaria do Tesouro Nacional é exatamente isso. No ano passado já pagamos menos e esse ano, a diferença será na mesma ordem de grandeza: ao invés de pagar R$ 10 bilhões, vamos pagar R$ 2 bilhões. E mesmo com essa redução, ainda temos muitas dificuldades. Por isso, é necessário que o Estado tenha outras fontes de arrecadação e é aí que entram as privatizações. Há quem alegue que a Codemig, por exemplo, é uma empresa lucrativa. Que bom que ela é lucrativa, isso quer dizer que ela é valiosa. E se o Estado vende essa empresa lucrativa e faz investimentos em infraestrutura, que é o que propomos fazer, a economia cresce, a movimentação econômica aumenta e a arrecadação também. Tudo isso num valor maior do que aquilo que o Estado recebe, por exemplo, com os dividendos da Codemig. Estamos falando de vender um negócio que dá lucro e aumentar a arrecadação do Estado em um valor maior do que esse lucro. É vender um negócio que dá resultado de R$ 1 milhão por mês e comprar outro que vai dar um resultado de R$ 1,5 milhão mensais. O ganho existe duas vezes: na infraestrutura e na arrecadação.

Qual será a próxima desestatização em Minas Gerais e como pretende dar andamento à privatização da Cemig, Copasa, Codemig e Gasmig?

Vai depender do Legislativo. Tudo vai passar pela Assembleia, tanto a Codemig quanto a Cemig, quanto a Copasa. Queremos que essas empresas estejam em mãos privadas por uma questão de rentabilidade. Vamos ter um investimento melhor desse recurso em infraestrutura do que onde ele já está aplicado, além disso, as empresas vão prestar um melhor serviço. Minas Gerais até hoje tem regiões sem atendimento adequado de energia elétrica, porque no passado a Cemig foi usada como um instrumento de politicagem, ao invés de investir em distribuição, transmissão e geração. A Cemig se aventurou em planos políticos como Belo Monte, Santo Antônio, Light, Renova, investimentos deficitários e questionáveis. Vendemos recentemente nossa participação na Light, com prejuízo, e em Santo Antônio também com prejuízo. Isso demonstra que essas empresas ao invés de estarem focadas em fazer a infraestrutura necessária ao desenvolvimento, começam a fazer negócios prejudiciais e que não agregam resultado. A privatização vai corrigir esses problemas, porque se alguém no setor privado fizer um negócio ruim, ele é quem vai pagar a conta e não o povo mineiro.

Algumas dessas privatizações precisarão passar pelo crivo da Assembleia Legislativa. O senhor espera uma melhor relação com a Casa neste mandato?

O que eu quero é que os deputados tenham a chance de votar, o que não aconteceu no meu primeiro governo. Os deputados sequer tiveram a chance de avaliar os projetos. Não quero que os projetos sejam aprovados, quero que sejam analisados. E se falar que não dá para aprovar, vamos rediscutir. Mas nem essa discussão nós tivemos durante a minha primeira gestão, pois havia o procedimento de engavetar tudo que o governo mandava. Tem que deixar os deputados analisar, opinar e votar sobre os projetos. É isso que nós queremos. É isso que acontece numa democracia.

E com o governo federal, como será o relacionamento?

Respeitoso. Já estive tanto com o vice-presidente eleito quanto com o presidente, por duas vezes e tivemos um diálogo aberto e respeitoso. O que esperamos é que o governo federal faça a parte dele. As rodovias federais em Minas estão tão ruins quanto as estaduais. E o governo federal tem muito mais recursos do que o estadual. Esperamos que essas questões sejam resolvidas. Que a BR-040 seja relicitada o quanto antes, assim como a BR-262, que liga Belo Horizonte ao Triângulo Mineiro; que a duplicação e melhoria das BRs 381, 262 e 116 saiam do papel. O governo federal precisa melhorar essas estradas que cortam o Estado e precisa também nos dar condições para concluirmos o acordo da tragédia de Mariana que é outra pauta fundamental para Minas Gerais. Será a maior punição da história feita a uma mineradora e vai beneficiar a União, Minas Gerais e o Espírito Santo. É uma necessidade para compensarmos aquilo que causou tantas perdas aos mineiros no passado. Digo além da perda de vítimas, porque tivemos impactos econômicos, sociais e ambientais que precisam ser compensados. Espero que o governo federal esteja atento a essa pauta.

Qual a atual situação do acordo de Mariana?

Posso dizer que está 98% concluído. Faltam alguns pontos que dependem do Ministério da Saúde, que está avaliando se a população do Vale do Rio Doce tem problemas de saúde originados no derramamento do resíduo, e do Meio Ambiente, já que uma parte expressiva desse acordo é sobre reparação ambiental. Mas precisamos lembrar que às vezes corrigir um dano ambiental é algo quase impossível. Eu sempre gosto de citar o caso de Chernobyl. A usina foi isolada porque não conseguiram demolir e retirar a radioatividade. Acredito que a retirada de rejeitos de minério do rio Doce será semelhante. É melhor recuperar o meio ambiente extraindo o máximo desses recursos que serão pagos, porque, às vezes, para limpar, vai poluir ainda mais. A tragédia já completou sete anos e pouca coisa foi feita, enquanto Brumadinho, que acabou de completar quatro (anos), já tem muita coisa avançada e em execução. Está claro que o modelo adotado no caso de Brumadinho é o ideal e é o que nós estamos querendo fazer. Tem menos prejuízo para o Estado e para a população. Prejuízo nós já tivemos, mas seria uma forma de minimizar, porque senão daqui a dez, 20 ou 30 anos ainda vamos falar de tragédia de mineração aqui em Minas Gerais. Queremos uma solução e espero que haja essa boa vontade por parte do governo federal, porque os governos de Minas e do Espírito Santo já estão alinhados, inclusive em destinar recursos para a concessão da BR-381, que é uma obra de fundamental importância para os dois estados.

Vivemos um momento de polarização. Como podemos mudar este quadro e avançar com um projeto de Estado e não de governo?

Infelizmente o Brasil, nos últimos anos, caminhou nessa direção, que é totalmente inadequada e improdutiva. A metade da população julga que a outra metade está errada. E todo mundo perde diante dessa situação. Precisamos ter tolerância, precisamos reconhecer que a outra parte sempre tem razão em algum ponto. Ninguém é dono absoluto da verdade. Meu governo tem falhas e todo governo tem. Temos que reconhecer e adotar uma postura de diálogo e de cessão, porque não temos razão em tudo. No passado tivemos um início de radicalização que tomou uma proporção e chegou a esse ponto. Espero que os governadores e o governo federal tenham uma posição de abertura, porque assim, o Brasil só tem a ganhar. Quando a outra parte erra, se você fica alardeando demais você acaba mais inflamado do que curando a ferida. Acho que é hora de buscar o diálogo e resolver as divergências, ao invés de qualquer motivo ir à imprensa apontar o que o outro está fazendo.

Quais serão os principais investimentos em infraestrutura do seu governo até 2026?

Vamos ter o metrô de Belo Horizonte, que foi leiloado em dezembro de 2022, e o Rodoanel. Essas obras vão mudar por completo a mobilidade urbana na região metropolitana. Duas obras que, com certeza, vão exceder minha gestão, porque são obras para mais de quatro anos, talvez para dez anos, mas que já começarão a trazer benefícios. Primeiro, porque serão milhares de empregos, e segundo, porque na hora que tiver um trecho do Rodoanel concluído, qualquer que seja ele, já vamos ter melhorias no trânsito. São duas obras impactantes que já deveriam ter sido feitas há mais de 20 anos ou mais. Temos cidades no mundo menores que Belo Horizonte que já têm um metrô muito maior e outras que já contam com rodoanel para desafogar o trânsito. Mais uma vez, o Brasil e Minas estão ficando para trás do mundo. O Brasil, infelizmente, tem tido uma posição de destaque no sentido de ser um país de crescimento econômico medíocre nos últimos 40 anos e para mudar isso, precisamos muito das reformas tributária, administrativa e política. O Brasil carrega um peso muito grande, é um estado ineficiente e com muita burocracia. Isso encarece a produção e dificulta a exportação de produtos elaborados. Temos vendido quase que só matéria-prima e produto bruto como minério e commodities agrícolas, que poderiam ser beneficiados e exportados com maior valor agregado. Sem as reformas não vamos ter desenvolvimento e nossa distância dos países desenvolvidos será cada vez maior.

Tamanha preocupação com o País seria um indicativo de que poderemos ter Romeu Zema candidato à Presidência em 2026?

Isso não me preocupa. O que preciso agora é correr atrás dos buracos nas estradas e dos hospitais regionais. Sobre esse assunto vamos conversar em 2026. Cada coisa no seu tempo. Se agora estamos fazendo a quinta laje do prédio, vamos deixar para discutir sobre a décima laje na hora que a estivermos fazendo, senão atrapalha fazer a de agora.

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