Advogados defendem tributação transformadora e com propósito

O advogado e mestre em direito tributário internacional e sócio-fundador do DCLC Advogados, Andrés Lopes da Costa, e a advogada associada, também mestre em direito internacional, Patrícia Villalba, estão propondo uma nova forma de pensar a tributação no Brasil. É o que eles têm chamado de tributação transformadora, com o propósito de combater problemas mundiais e ser um veículo para a criação de riqueza e transformação do planeta.
A proposta é que os tributos não sejam apenas um instrumento de arrecadação pura e simples, mas também um mecanismo contra crises climáticas, problemas ambientais e transição de energia, por exemplo. À luz do que acontece em algumas partes do mundo, Andrés da Costa defende ações mais uniformes, regulamentadas e menos fragmentadas pelo mundo.
Ele exemplifica que instituições como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a Organização das Nações Unidas (ONU) possuem ações nesse sentido, mas contam com a aderência voluntária dos países. Na visão do advogado, é preciso criar um modelo de construção de soluções condensadas e negociadas para que tivesse uma arrecadação vinculada aos problemas mundiais. “Os problemas são globais e as soluções que têm sido apresentadas, são regionais”, defende Costa.

Andrés da Costa conta que mesmo que haja uma fábrica na Suécia pagando imposto sobre a emissão de carbono, a consequência que ela traz é para a atmosfera, para o mundo e só a Suécia, no caso, beneficia-se com o tributo pago.
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Ações como incentivo em termos de tributação ou mecanismos de proteção ao meio ambiente e à transição energética são boas iniciativas, mas na visão do advogado, “contém falhas”.
“O carro elétrico, por exemplo, emite muito menos carbono do que o carro convencional, mas o processo de construção da bateria elétrica tem muitos problemas. Você precisa da extração do lítio e do grafite que são minerais e a mineração é uma atividade muito poluente. Você tem denúncias de mão de obra infantil nas minas de extração desses minerais. O estrago ambiental e social feito antes da bateria ser gerada é gigantesco. Além do descarte que é outro problema”, argumenta.
Outro exemplo que ele cita são as usinas eólicas. “Os parques eólicos também têm sérios problemas. Você tem energia limpa? Tem. Mas as hélices matam animais importantes para a polinização e trazem transtornos psicológicos graves para quem mora perto deles em função do barulho que geram”, diz Costa.
De acordo com o advogado, ao onerar o que degrada e valorizar o que preserva, a tributação desenha um caminho para além das catástrofes, oferecendo às futuras gerações um legado mais justo, porém ela precisa ser feita de forma coletiva e regulada e não contar apenas com pacto multilaterais sem força coercitiva. “Na maioria das ações que existem, ninguém é obrigado a pagar nada, não existe de fato um mecanismo de arrecadação, de recursos para a transição ecológica e energética que seja eficiente, que funcione e seja obrigatório”, destaca.
Dessa forma, o que o advogado propõe é que seja criado um organismo multilateral que reúna funções que hoje são exercidas de forma fragmentada. “Um modelo parecido com uma agência reguladora, algo mais flexível, que dependa de consenso e que tenha vozes de muitos países. Algo progressivo em que no final, com os anos, consiga ter funções judiciantes e seja autosustentável pelos tributos que estamos chamando de tributo da transformação”, explica.
Otimista com o modelo, ele defende que há utopias inalcançáveis e utopias de inspiração. O advogado entende que o modelo proposto é uma dessas utopias de inspiração, portanto, mais concretas e realizáveis. Ao longo de anos de estudo e reflexão a respeito do tema, que gerou junto com a colega de trabalho, Patrícia Villalba, o livro “Tributação Transformadora”, Costa conta que teve diversas inspirações concretas.
Uma delas foi a constituição da União Europeia. “Quantas ideias utópicas tem ali que foram implementadas?”, indaga. “Você vê países que abriram mão da sua moeda, para ter o euro. Algo que vai contra o conceito de soberania. Quantos países abriram mão de sua moeda, de seus bancos centrais e criaram o Banco Central Europeu, o Tribunal de Justiça da União Europeia que revê decisões judiciais dos tribunais europeus?”, argumenta.
Ele explica que trata-se de um exemplo concreto de soberania responsável. “Você exerce a sua soberania até certo ponto ou cede parte da sua soberania em função de alguma coisa mais importante, maior”.
Andrés da Costa afirma ainda que reconhece que o modelo proposto é inovador e ousado, porém não impossível. “Alguém tem que sonhar e pensar na frente. Olhar o problema e pensar o que podemos fazer porque continuar assim não dá. A maior das utopias é acreditar que se deixarmos tudo como está as coisas vão melhorar”, defende.
Para o advogado, “o tributo e modelo de regulamentação proposto não apenas respondem ao presente, mas também protegem o porvir e nos lembram que, mesmo em tempos de crise, a humanidade tem a capacidade de construir normas que não esmagam, mas elevam; que não servem ao poder, mas à vida e à dignidade humana”, complementa.
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