Legislação

Justiça suspende cláusulas de contratos entre vítimas do desastre de Mariana e escritório inglês

Justiça reconhece abusos em contratos com vítimas do rompimento da barragem de Fundão e impõe limites à atuação do escritório de advocacia inglês Pogust Goodhead
Justiça suspende cláusulas de contratos entre vítimas do desastre de Mariana e escritório inglês
Foto: Divulgação / Corpo de Bombeiros

A Justiça Federal suspendeu, por meio de decisão liminar, cláusulas contratuais consideradas abusivas em acordos firmados pelo escritório inglês Pogust Goodhead LLP (PGMBM) com vítimas do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central de Minas Gerais, ocorrido em 2015. A decisão é resultado de uma Ação Civil Pública (ACP) movida por uma força-tarefa composta pelos Ministérios Públicos de Minas Gerais (MPMG), Federal (MPF), do Espírito Santo (MPES) e pelas Defensorias Públicas da União (DPU) e de Minas Gerais (DPMG).

Segundo a juíza federal Fernanda Martinez Silva Schorr, da 13ª Vara Cível da Justiça Federal em Minas Gerais, os contratos impõem condições que violam os direitos das vítimas, caracterizadas como hipervulneráveis. A magistrada destacou a necessidade de garantir proteção jurídica diante de publicidade enganosa e desequilíbrio contratual.

Entre as cláusulas suspensas estão:

  • Restrições à rescisão contratual por parte das vítimas;
  • Escolha de jurisdição estrangeira para julgamento das ações;
  • Obstáculos à adesão a programas indenizatórios nacionais
  • Previsão de sanções desproporcionais em caso de desistência da ação.

A decisão também ordena que os réus comuniquem os consumidores sobre a medida liminar com o mesmo alcance, formato e canais utilizados anteriormente para divulgação dos contratos.

Justiça exige fiscalização de contratos e transparência

A Justiça considerou ainda que o contexto do caso, com milhares de vítimas, contratos firmados em massa e a oferta de acordos em jurisdições internacionais, exige um acompanhamento estatal próximo para garantir que os direitos das vítimas não sejam novamente violados.

O processo segue em tramitação, com a citação do escritório estrangeiro e o prazo para apresentação de defesa. As partes também deverão se manifestar sobre a possibilidade de realização de audiência de conciliação.

O MPMG ressaltou que a decisão é um marco importante na proteção dos atingidos por desastres ambientais, evitando que práticas jurídicas exploratórias se sobreponham ao direito das vítimas à reparação integral.

“O MPMG segue atento e atuante para que qualquer novo acordo não seja apenas promissor, mas efetivo na reparação dos danos humanos, ambientais e coletivos causados pela tragédia de Mariana”, afirmou o órgão em nota.

Pogust Goodhead nega irregularidades e critica liminar

Em resposta à decisão judicial, o Pogust Goodhead LLP afirmou, por meio de nota, que os contratos firmados com os clientes são regidos pela legislação inglesa e estão em vigor desde 2018, sem qualquer contestação anterior, seja por alguma das 600 mil vítimas ou por instituições de Justiça.

Segundo o escritório, o atual questionamento surge “no contexto do lançamento do PID” e seria parte de uma tentativa de “enfraquecer o direito – já reconhecido por tribunais ingleses – de os atingidos buscarem indenização integral na Inglaterra, pressionando-os a aceitar os termos de um acordo incompatível com a gravidade dos danos sofridos”.

O PGMBM também contestou os argumentos da liminar, destacando que o suposto risco de dano iminente (periculum in mora) estaria superado, já que o prazo de adesão ao PID encerrou-se em 4 de julho. Além disso, classificou como “inócua” a ordem judicial para depósito em juízo de honorários, alegando nunca ter recebido qualquer valor de seus clientes.

“O Pogust Goodhead reafirma seu compromisso com a ética, a transparência e a busca por justiça e reparação aos atingidos por todos os meios legais legítimos, inclusive os disponíveis em jurisdições internacionais”, concluiu a nota.

Relembre o caso do desastre de Mariana

Casal em Mariana, após rompimento de barragem da Samarco
Foto: Antônio Cruz / Agência Brasil

O rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton, ocorrido em 5 de novembro de 2015, é considerado um dos maiores desastre socioambiental da história do Brasil. A tragédia deixou 19 mortos, destruiu comunidades inteiras e causou danos ambientais extensos ao longo da bacia do Rio Doce, atingindo diretamente milhares de pessoas em Minas Gerais e no Espírito Santo.

Desde então, diversas ações judiciais vêm sendo movidas para garantir a indenização das vítimas e a reparação dos danos ambientais, tanto no Brasil quanto em tribunais internacionais.

Leia a nota da Pogust Goodhead Law na íntegra

Os contratos firmados com os clientes são regidos pela legislação inglesa, estão em vigor desde 2018 e jamais foram questionados por qualquer uma das mais de 600 mil pessoas representadas pelo escritório, tampouco pelas instituições de Justiça. O questionamento atual surge no contexto do lançamento do PID e integra uma manobra que busca enfraquecer o direito – já reconhecido pelos tribunais ingleses – de os atingidos buscarem indenização integral na Inglaterra 

Sobre a decisão proferida nesta sexta-feira – para a qual cabe recurso – o escritório esclarece que o suposto risco de dano (periculum in mora) que fundamenta a concessão das liminares ignora o fato de que o prazo para adesão ao PID já se encerrou em 4 de julho. Além disso, a ordem para depósito em juízo de valores eventualmente recebidos a título de honorários é inócua, uma vez que o PG nunca recebeu qualquer valor de nenhum de seus clientes.

O Pogust Goodhead reafirma seu compromisso com a ética, a transparência e a busca por justiça e reparação aos atingidos por todos os meios legais legítimos, incluindo aqueles disponíveis em jurisdições internacionais.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas