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Olavo Machado e Paulo Paiva debatem temas importantes para Minas e o Brasil

23 de outubro de 2019 às 0h14

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Machado: “Não há ninguém se preocupando se a indústria está ficando em Minas ou se está ficando fora” - Crédito: Divulgação

Nas últimas semanas, a Sociedade Mineira de Engenheiros (SME) debateu temas importantes para Minas e para o País.

Os convidados foram o engenheiro Olavo Machado, ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e o economista Paulo Paiva, ex-secretário de Planejamento de Minas e ex-vice-presidente do Banco Mundial.

Conheça um pouco da visão de Olavo Machado e Paulo Paiva. São retratos de nosso tempo.

OLAVO MACHADO

Desenvolvimento da indústria

O que a indústria pode fazer para melhorar? A indústria é usuária, mas depende de mercado. E ela foi grandemente estimulada a buscar o Estado pela Cemig, que sempre procurou fazer com que aquilo que ela usasse, pudesse ser fabricado em Minas. Durante muitos anos, foi assim. Eu fabricava painéis [elétricos] e tinha decidido fabricar transformadores. Fui conversar na Cemig com o José Augusto Sarmento. Ele me disse: Não faz não, porque não tem espaço para ter outra fábrica [de transformadores] aqui. Hoje, não há ninguém mais se preocupando se a indústria está ficando em Minas ou se está ficando fora. Os próprios engenheiros não se preocupam se nós não criamos empregos em Minas Gerais para os nossos filhos e os nossos netos. O resultado é que eles terão que ir embora. Nós estamos formando pessoas para serem exportadas.

Papel do engenheiro

Procurei, na Fiemg, fazer um projeto que valorizava o engenheiro – o “Engenheiro do futuro” – justamente porque os alunos [de engenharia] não têm oportunidade de conviver com aquilo que a minha geração pôde fazer. O que nós precisamos é pegar as entidades empresariais e fazer com que elas entendam o papel do engenheiro. Isso, muitas vezes, não é entendido. A confiança que esses meninos têm que ter tem que partir de nós, os mais velhos. Nós é que temos que estimular e mostrar os caminhos. Se ele se formou engenheiro, ele não tem que ter medo.

Indústria 4.0

O que a indústria 4.0 tem de diferente? Nada. É a mesma indústria de sempre. O hardware que está lá é o mesmo de qualquer equipamento. A diferença é que ele é robotizado. O problema que nós somos engenheiros analógicos. Você, quando vê alguma coisa funcionando, faz analogias. O problema é que, com a digitalização, quando você vê algum equipamento elétrico funcionando, você não vê quase nada além [do equipamento] e as coisas acontecem conforme você programou, porque o que está por trás são softwares. Já nas outras áreas, como na engenharia civil, ou em um equipamento mecânico, dá para você enxergar.

Laboratório de Itajubá

O Laboratório de Inovação Itajubá estava viabilizado. Mas não foi para frente. Minas não deixou ele ficar aqui. Para onde ele vai? Não sei. A Unifei está lutando muito. Esse é um grande problema. Minas está perdendo investimentos. E acha que é isso mesmo. Nós temos o Cetec. É o mesmo laboratório que temos na Bahia. Só que o nível do de lá é quinhentas vezes melhor que o nosso. Não foi fácil fazer o que foi feito no Cetec, pois atingimos várias pessoas amigas que estavam lá, mas não tinham o perfil que a gente queria que tivessem para um centro de tecnologia. Vão dizer: aquilo é do Senai. Não, aquilo é de Minas. Os outros estados estão se preocupando mais que Minas com esse tipo de equipamento.

O negócio da engenharia

Meio ambiente tem que ser visto como um negócio. E negócio é coisa de empresário e não coisa de ecologista. Engenharia é negócio. Tem que ser encarada como negócio. Agora, em um lugar onde não há mercado, você vai para onde? Gosto muito do Salim Mattar [presidente licenciado da Localiza e atual secretário especial de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia]. Lembro de quando ele começou ali na Álvares Cabral, mas a visão dele é de uma pessoa que aluga automóvel. É um grande empresário. Mas, e o desenvolvimento? Essa missão é nossa, dos engenheiros. Para começar, acredito que precisamos aceitar que os erros são nossos, que a mentalidade do engenheiro tem que ser modificada, a cabeça do engenheiro tem que continuar cartesiana, mas com uma visão diferenciada, de pensar que quando eu faço uma coisa errada, eu atrapalho a empresa de outro engenheiro. Só vai para frente quando todos vão para frente. Olha a quantidade de pessoas que perderam o emprego. É muita gente. Isso aconteceu porque nós não cuidamos de fazer com que essas empresas tivessem mercado. Porque o que é vital na engenharia é mercado.

Inovação

A indústria que não inova não se desenvolve. Não tem como. Se ela não fizer, não sobrevive. Como engenheiro, temos que valorizar e fazer com que isso funcione. Para mim, a inovação com o melhor resultado é a startup, que surgiu da necessidade, principalmente de engenheiros, na universidade, de produzirem alguma coisa que tivesse menos teoria e mais prática. Isso, sim, foi inovação e, muitas vezes, vai fazer com que os velhos negócios ganhem uma sobrevida.

Privatização da Cemig

Hoje, quanto menos o governo entrar, melhor. Porém, quando você vê que a privatização está sendo feita com estatais estrangeiras, será que o brasileiro tem que passar a ideia de que nós somos maus administradores, que nós não sabemos administrar uma empresa porque a política não deixa? Qual foi a última vez que o Estado colocou recursos na Cemig? Desde quando eu me entendo por gente, o que eu vejo é o Estado recebendo da Cemig. Agora, pode o Estado ficar livre da Cemig? Pode. Mas, com certeza vai perder uma fonte de renda. Uma fonte que poderia ser usada melhor se fôssemos mais competentes. O problema da Cemig é um problema do governador. É uma empresa referência. Não há que se falar em qualquer senão da Cemig. Agora ela foi desvirtuada, principalmente com o excesso de pessoas que não conhecem engenharia, não conhecem desenvolvimento, não sabem a dificuldade que é colocar um poste em pé no meio do mato. Aí vem um e reclama que a Cemig não liga a energia. Não é que ela não queira ligar. O problema é que nem sempre tem jeito. Às vezes, não é negócio ligar. A obrigação não é dela. A obrigação é do Estado. Se o Estado decide desenvolver o Jequitinhonha com energia elétrica, é problema da Cemig ou do Estado? É do Estado. O que nós precisamos é saber o que a engenharia pode fazer para multiplicar os recursos. A equação tem que ser: como isso vai gerar desenvolvimento? Como isso vai gerar oportunidades para as pessoas que moram em Minas? A Cemig no passado teve um papel muito importante na industrialização em Minas. Mas é passado. Se isso trouxer vantagens, desenvolvimento, não tem problema [privatizar]. (Conteúdo produzido pela SME)

PAULO PAIVA

Crescimento da economia

Crescimento é um processo de longo prazo. Olhando para frente, a economia brasileira está fadada, se nada mudar, a crescer 0,7% [nos próximos anos]. Desde a década de 80, nós crescemos a uma taxa média de 2,2%. Para um país do nosso tamanho, com os recursos naturais que temos, é um crescimento vergonhoso. A economia brasileira é igual cavalo bravo: sobe e desce. Não tem continuidade o nosso crescimento. Questão é muito mais que esperar que uma reforma, ou uma decisão magistral do ministro da Fazenda. Não adianta achar soluções milagrosas.

Produtividade

A possibilidade de a economia voltar a crescer depende do aumento da produtividade, principalmente na indústria de construção e indústria de transformação, pois o setor agropecuário está indo muito bem. Temos, também, que ter o equilíbrio fiscal, pois não há possibilidade de o país viver no vermelho. Temos que ajustar o Estado a uma posição em que ele pressione menos o setor privado com impostos e seja mais eficiente.

Inovação

Para o crescimento, é necessário investir em tecnologia, e nesse ponto, o trabalho dos engenheiros é fundamental. Nós temos que absorver o que há de mais moderno em tecnologia, senão nós não rompemos essa amarra que está nos sufocando. Os computadores da época em que eu estudava tinham aquele tamanho enorme, mas uma capacidade [de processamento] inferior à de um celular. Imagina o que vem pela frente. É uma coisa que a gente não consegue imaginar. Mas isso vai mudar esse conceito de produtividade. Será outro conceito. Só não sabemos para onde vai.

Pequenas empresas

Todos os países que tiveram crescimento constante nas últimas décadas tinham projetos de apoio às médias empresas. Mas, no Brasil, elas não têm nem pai nem mãe. Sempre imaginei que bancos de desenvolvimento deveriam apoiar as médias empresas. Em vez de ficar financiando Petrobras e grandes empresas, valeria a pena ter um esforço nesse sentido, de focar nas médias empresas.

Desigualdade

Nós temos um desafio muito grande pela frente que é a existência de um contingente enorme de pessoas que não terão condições de acompanhar as mudanças tecnológicas. Isso [ocorre], principalmente, entre os trabalhadores não qualificados. Eles podem até ir se adaptando. Outro problema seriíssimo é a enorme desigualdade. Há também o [problema] dos jovens que não estão nem na escola nem trabalhando e o das pessoas de nível superior que não conseguem emprego. E essas pessoas dificilmente serão absorvidas por essa nova economia. Os empregos que serão gerados serão para poucos, pois as empresas irão aumentar sua produção com menos trabalhadores. Para administrar isso, vai ser preciso o Estado com políticas públicas para amparar esse pessoal.

Reforma tributária

Todo mundo é a favor da reforma tributária. Mas todo mundo tem a sua. O setor privado quer eficiência tributária, segurança jurídica e simplificação. Outros gastariam também de uma carga tributária mais baixa. Do lado do governo, são duas questões. Uma é que a União quer aumentar sua participação no bolo. Estados e municípios também têm essa mesma expectativa. Temo que qualquer reforma tributária no Congresso tenderá a aumentar a participação dos estados e municípios. Por isso, acho que a União tenderá a segurar. Por isso, é que até agora o governo federal não apresentou nenhuma proposta.

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